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Um episódio de 2020 da série de televisão americana “Antiques Roadshow”, exibida pela PBS, mostrou um veterano da Força Aérea descobrindo que o relógio Rolex que ele havia comprado quase 50 anos antes por US$ 345,95 (R$ 1.951, na cotação atual) era um modelo raro, avaliado em até US$ 700 mil (R$ 3,9 milhões). Surpreso, o veterano fingiu desmaiar de brincadeira e o vídeo do momento viralizou, acumulando 16 milhões de visualizações até hoje.
O relógio em questão foi fabricado em 1971, um modelo Oyster descendente do primeiro relógio de pulso à prova d’água do mundo, inventado pela Rolex em 1926. O valor pago pelo veterano pode parecer baixo hoje em dia, mas, na época, era o equivalente a um mês de salário. O relógio estava em perfeito estado, quase sem uso.
O que o tornava especialmente valioso era o fato de Paul Newman, um astro de Hollywood, ter usado esse modelo da Rolex de forma bem visível no sucesso de bilheteria de 1969 “Winning”, um filme sobre o mundo das corridas de carro, onde cada segundo faz diferença.
Mais de 50 anos depois — para milhões de revendedores, colecionadores e entusiastas —, esse modelo é conhecido atualmente como o “Paul Newman Rolex Daytona”. O relógio original, o que Newman de fato usou no filme, foi vendido em 2017 por quase US$ 18 milhões — R$ 101,5 milhões.
Na história do varejo moderno, poucas marcas de luxo sobreviveram por mais de um século mantendo o mesmo prestígio — pense em Chanel, Gucci, Louis Vuitton, Cartier. Nenhuma tem a força que a Rolex mantém em sua categoria.
É um investimento
Relógios de luxo sempre foram uma forma de demonstrar status, mas há cerca de uma década — mais ou menos na época em que a China começou a crescer rapidamente e a formar uma nova geração de pessoas ricas — os preços de modelos vintage dispararam e o mercado de relógios novos explodiu.
Relógios caros de marcas conhecidas, de forma geral, passaram a ser vistos como uma espécie de pseudo-investimento, algo parecido com o ouro. Exemplos como o que apareceu no “Antiques Roadshow”, em Fargo, Dakota do Norte, alimentaram uma onda de negociações frenéticas com modelos antigos, revenda acelerada de modelos novos e um aumento desenfreado da falsificação.
O que torna a história da Rolex única é o fato de uma marca conhecida por relógios mecânicos projetados e fabricados com extrema precisão ser, na era digital, mais popular do que nunca. De acordo com o Morgan Stanley, que publica um relatório anual elaborado pela consultoria LuxeConsult, a Rolex vende cerca do dobro de relógios em comparação com sua concorrente mais próxima, a Cartier. Segundo o relatório de 2024, ela representou um terço de toda a indústria relojoeira suíça e quase 45% do mercado de relógios de segunda mão.
Qual é o segredo?
Para começar, desde 1960 a empresa pertence à Fundação Hans Wilsdorf, um fundo familiar privado criado em nome do cofundador da marca. Diferente de muitas marcas de luxo, ela está protegida das oscilações da bolsa de valores e das pressões de acionistas. Não faz parte da carteira de investimentos de uma grande holding. Na verdade, a Rolex é uma organização sem fins lucrativos, que afirma doar seus lucros para diversas instituições beneficentes ligadas às artes, além de causas sociais e ambientais.
O fator mais importante foi a decisão tomada pela empresa nos anos 1960 de posicionar seu produto como um “relógio excepcional para pessoas especiais”, segundo Pierre-Yves Donzé, autor de um livro sobre a história da marca. Em uma entrevista publicada pela Bloomberg no ano passado, Donzé explicou que a indústria relojoeira suíça, na época, ainda se promovia com base na qualidade e no artesanato suíços. “A ideia veio dos americanos e da agência de publicidade J. Walter Thompson”, disse ele. “Isso fez da Rolex um símbolo de conquista social, de sucesso pessoal e por aí vai.”
Foi assim que Paul Newman passou a usar com destaque um Rolex Oyster em um grande sucesso de bilheteria, e milhares de celebridades, desde então, foram vistas, fotografadas e filmadas usando os modelos mais recentes, que custam a partir de US$ 50.000 (R$ 282 mil).
Mais recentemente, a empresa adotou medidas para se proteger ainda mais das instabilidades do mercado. Em 2023, a Rolex comprou a Bucherer, uma das maiores redes varejistas de relógios do mundo. Para lidar com a proliferação de falsificações, a marca lançou no ano passado um programa de venda de relógios “certificados de segunda mão”. A iniciativa foi vista como radical, mas brilhante — uma forma de proteger a marca oferecendo ao cliente a segurança de saber que o relógio que está comprando é verdadeiro e que foi revisado e restaurado pela própria empresa.
Como exemplo de como construir e administrar uma marca, a história da Rolex continua a inspirar e servir de referência.
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