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Nesta semana, a Tesla divulgou os piores resultados trimestrais dos últimos quatro anos. As vendas caíram 9%. O lucro despencou 71%, impactado por uma queda de 20% na receita com automóveis. E, diante das tarifas e das incertezas do mercado, a empresa nem se deu ao trabalho de divulgar metas de vendas para o restante do ano.
Ainda assim, as ações subiram 9% desde terça-feira (22), embaladas pelo entusiasmo de investidores com uma única notícia: Elon Musk afirmou que em breve vai se afastar de suas funções ligadas ao DOGE, seu programa de reestruturação do governo federal, e voltará a se dedicar de forma mais integral à Tesla (com exceção de seus outros compromissos com a SpaceX, a xAI e a Neuralink).
Mas essa não é a solução milagrosa que os investidores parecem imaginar. Os problemas que a Tesla enfrenta atualmente foram agravados justamente pela entrada de Musk no governo Trump como “funcionário público especial” — entre eles, margens de lucro em queda, concorrência cada vez mais acirrada e uma imagem de marca desgastada. E nada indica que esses desafios vão desaparecer, mesmo com Musk mais presente na gestão da empresa. Pior: está cada vez mais evidente que Musk está sem ideias sobre como resolvê-los e passou a apostar em um futuro incerto baseado em robotáxis e robôs humanoides.
Por ora, os lucros da Tesla vêm da venda de carros e sistemas de armazenamento de energia — e ambos os negócios enfrentam dificuldades. A empresa não tem um sucessor à altura dos campeões de vendas Model Y e Model 3 (o Cybertruck, seu lançamento mais recente, foi um dos maiores fracassos da história da indústria automotiva). Ao mesmo tempo, está prestes a sofrer os efeitos das tarifas do presidente Trump, que devem esfriar as vendas de automóveis em todo o setor. Para a Tesla, porém, o golpe mais duro será a tarifa de 145% sobre células de bateria importadas da China, que deve atingir em cheio a divisão de baterias da empresa — uma das poucas áreas que ainda apresentaram resultados positivos no último trimestre.
Musk minimizou esses problemas durante a teleconferência de resultados em 22 de abril. “Não estamos à beira da morte, nem perto disso”, disse. “Existem alguns desafios, e espero que haja alguns solavancos inesperados neste ano.”
Alguns desses solavancos, porém, estão longe de ser inesperados. Desde que Trump reassumiu a presidência em 20 de janeiro — com o apoio de US$ 250 milhões (R$ 1,4 bilhão) do homem mais rico do mundo —, as atividades políticas de Musk têm consumido mais tempo. Seu alinhamento com pautas de direita e os comentários polêmicos nas redes sociais vêm prejudicando a imagem da Tesla há mais de um ano, especialmente em mercados importantes como a Califórnia e a Europa.
Diversas pesquisas, incluindo uma da Faculdade de Direito da Universidade Marquette realizada neste mês, apontam que 60% dos entrevistados têm uma visão negativa de Musk e 58% desaprovam seu trabalho com o DOGE. Uma pesquisa da YouGov/Yahoo News, feita no mês passado, revelou que 67% dos norte-americanos não consideram comprar ou alugar um Tesla, e a maioria apontou Musk como o principal motivo.
“Lembra do escândalo de emissões da Volkswagen? Uma crise regulatória custou dezenas de bilhões e arruinou sua reputação. É onde a Tesla está agora”, disse Sue Benson, CEO e fundadora da The Behaviours Agency, uma agência de marketing do Reino Unido. “Mas desta vez, não é sobre o produto. É sobre a pessoa. Já é tarde demais para separar o homem da marca. E, nesse meio-tempo, ela perdeu sua vantagem no mercado de veículos elétricos.”
E, embora Musk esteja prometendo mais dedicação à montadora sediada em Austin, ele ainda comanda a SpaceX, a X (antigo Twitter), a Boring Company e a Neuralink — além de ser pai de uma “legião” com mais de uma dúzia de filhos. Muito antes do DOGE, seu tempo já era limitado.
“Ele disse o que achava que as pessoas queriam ouvir”, afirmou Ross Gerber, CEO da Gerber Kawasaki Wealth and Investment Management, que possui ações da Tesla, mas defende que Musk deveria renunciar. “Mas ele vai continuar tocando a xAI, vai continuar fazendo o que faz na Tesla, na SpaceX e na X e ainda vai estar envolvido com o DOGE. O que mudou?”
Como frear a queda?
O desafio mais urgente para a Tesla é reverter a queda nas vendas de veículos elétricos, que recuaram 13% no primeiro trimestre. Mais preocupante ainda é o fato de que a receita automotiva caiu 20%, o que indica que a empresa vendeu menos carros e os vendeu por preços mais baixos.
Todo o lucro líquido de US$ 409 milhões (R$ 2,29 bilhões) no trimestre veio da venda de créditos regulatórios — dinheiro que a empresa recebe de montadoras concorrentes para que elas possam cumprir normas ambientais nos EUA, na Califórnia e na União Europeia. Sem os US$ 595 milhões (R$ 3,33 bilhões) obtidos com esses créditos, a Tesla teria registrado prejuízo líquido.
A solução mais óbvia para reaquecer as vendas seria lançar um novo modelo. Mas, em vez disso, Musk e seus engenheiros estão preparando versões renovadas e mais baratas dos modelos Y e 3, lançados em 2020 e 2017, respectivamente. Em vez de uma mudança completa de design — como fazem as montadoras tradicionais —, o Model Y de 2025 será basicamente uma atualização da versão de 2024, com uma barra de luz no capô dianteiro e na traseira, faróis mais finos e rodas mais aerodinâmicas.
Isso pode dar um fôlego nas vendas, mas está longe de ser uma estratégia vencedora no longo prazo. Há um motivo pelo qual as montadoras lançam novos modelos com frequência. Mudanças drásticas no visual costumam trazer melhores resultados, segundo Glenn Mercer, pesquisador da indústria e líder da consultoria GM Automotive, sediada em Cleveland. “Deixar esses modelos no mercado por tempo indeterminado, sem mudanças significativas no design, os transforma — exagerando um pouco — em zumbis”, disse Mercer à Forbes.
Nem Musk nem Lars Moravy, chefe de engenharia de veículos da Tesla, explicaram como a empresa pretende oferecer essas versões mais baratas durante a teleconferência de resultados. Analistas do setor acreditam que isso será feito com baterias menores e mais baratas, com menor autonomia, além da remoção de recursos tecnológicos.
“Se, em vez de renovar o design, a Tesla apenas reduzir os preços cortando itens — como já fez ao remover sensores de estacionamento ultrassônicos —, é ainda pior”, afirmou Mercer. “Normalmente, nessa fase do ciclo de vida de um modelo envelhecido, você adiciona recursos para disfarçar o visual antigo.”
Concorrência no mercado de veículos elétricos
Sabe quem tem modelos mais novos? As montadoras chinesas que mais crescem, especialmente a BYD, além de concorrentes locais como General Motors, Hyundai, Kia, Honda e Rivian. Não é à toa que a participação da Tesla nas vendas de veículos elétricos caiu para 43% no primeiro trimestre, frente aos 75% de três anos atrás.
Até poucos anos, Musk dizia que a Tesla venderia 20 milhões de veículos elétricos por ano até o fim da década de 2020. Agora, ele abandonou discretamente essa meta e passou a defender um novo modelo de negócios, baseado em corridas com robotáxis, serviços de inteligência artificial e robôs trabalhadores.
“O futuro da empresa está fundamentalmente baseado em carros autônomos em larga escala e robôs humanoides autônomos, em grande volume”, disse Musk nesta semana. “O valor de uma empresa que fabrica veículos e robôs humanoides autônomos realmente úteis, em escala e a baixo custo — e é isso que a Tesla vai fazer — é astronômico.”
Pode até ser verdade, mas a Tesla ainda não demonstrou que é capaz disso. A Waymo é a líder de fato em robotáxis, com veículos equipados com sensores e sistemas muito mais avançados do que os planejados por Musk. Já a Boston Dynamics, há anos, apresenta robôs humanoides e com movimentos inspirados em animais que parecem muito mais capazes do que o trôpego Optimus da Tesla. Um problema imediato: Musk disse na teleconferência que a Tesla não consegue obter os ímãs de terras raras necessários para os motores do robô por causa das restrições retaliatórias impostas pela China — única fornecedora — em resposta às tarifas de Trump.
Investidores como Gerber querem ver Musk priorizando novos produtos. Ele acredita que o conceito do Cybercab, apresentado no outono passado como um robotáxi futurista sem volante, poderia ter sido vendido como um carro elétrico de baixo custo.
“Não faz sentido. O Cybercab deveria ter sido apenas um Tesla de duas portas e US$ 25 mil (R$ 140 mil)”, afirmou. “Era só colocar um volante e escalar a produção. É um carro com visual diferente de qualquer outro da linha e poderia atrair novos clientes, especialmente com esse preço. Lançar uma versão simplificada do Model Y é dar um tiro no próprio pé.”
Impacto das tarifas
A Tesla está relativamente mais protegida das tarifas de Trump, já que não importa veículos fabricados no exterior — nem mesmo do Canadá ou do México, como fazem a maioria das montadoras. Mas ainda depende de aço, alumínio e autopeças importados, o que a expõe ao aumento nos custos desses insumos. E as tarifas afetam especialmente sua divisão de energia — seu negócio mais lucrativo depois dos veículos elétricos —, com a venda de baterias para residências, concessionárias e empresas. No primeiro trimestre, essa divisão teve alta de 67% na receita, alcançando US$ 2,73 bilhões (R$ 15,3 bilhões).
Mas, para esses sistemas, a Tesla usa células de bateria de fosfato de ferro e lítio (LFP), fabricadas na China, que agora serão atingidas pela tarifa de 145% sobre produtos importados. A empresa pretendia iniciar a produção dessas células neste ano em sua gigafábrica de baterias em Nevada, com base em um novo acordo de licenciamento com a chinesa CATL, maior fabricante mundial de baterias para veículos elétricos. Elas seriam mais baratas do que as células de íons de lítio usadas nos carros da Tesla. Mas o plano está paralisado.
“O impacto das tarifas sobre a divisão de energia será desproporcional, já que usamos células LFP da China”, disse o CFO da Tesla, Vaibhav Taneja, na teleconferência. “Estamos em processo de comissionamento de equipamentos para fabricar essas células localmente, nos EUA. No entanto, os equipamentos que temos só atendem a uma fração da nossa capacidade instalada atual.”
Isso significa preços muito mais altos para os Megapacks da Tesla — e menos demanda, especialmente por parte de concessionárias que compram os sistemas para armazenar energia solar e eólica.
“Ninguém, nem mesmo a Tesla, fabrica células LFP nos EUA. A tarifa de 145% significa que os preços vão subir para todos”, afirmou uma fonte ligada à divisão de baterias da empresa, sob condição de anonimato por medo de represálias. “As concessionárias simplesmente não estão dispostas a pagar esse preço mais alto. Não é que a Tesla vai perder para a concorrência. Nesse caso, o mercado simplesmente desaparece conforme o preço sobe.”
Gerber, fã de longa data de Musk que se tornou um crítico vocal, não vê nenhum sinal de que Elon tenha ideias para resolver os problemas imediatos da Tesla — mesmo que esteja menos envolvido com o DOGE.
“Não vejo isso como uma grande mudança positiva para a Tesla”, disse. “Isso não vai resolver os problemas da empresa.”
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