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“(…) o tempo linear é uma invenção do Ocidente, o tempo não é linear, é um maravilhoso emaranhado onde, a qualquer instante, podem ser escolhidos pontos e inventadas soluções, sem começo nem fim”
Lina Bo Bardi (Roma, 1914-São Paulo,1992)
A frase lapidar de Lina é o ponto de partida do tributo duplo que o cineasta, fotógrafo e artista inglês de instalações, honrado por várias comendas do Reino Unido, Sir Isaac Julien (n. 1960), faz à ítalo-brasileira na série de 2019, composta por instalação de filme, fotografias e colagens, em mostra no MASP, o mais icônico projeto da arquiteta, no filme, “Lina Bo Bardi — um maravilhoso emaranhado“, e em nossa galeria, “Lina Bo Bardi – um maravilhoso emaranhado– fotografias e colagens”.
Lina faz parte do grupo de mulheres imigrantes que desembarcou em nosso país em diferentes momentos da primeira metade do século 20 para fugir do pós-guerra com a esperança na bagagem. Através de realizações revolucionárias, elas se tornariam pilares do processo evolutivo das artes brasileiras: as artistas plásticas Tomie Ohtake (1913-2015) e Mira Schendel (1919-1988), a fotógrafa Claudia Andujar, atualmente com 93 anos, e a conceitual Anna Maria Maiolino.
Em março último, Maiolino, aos 82 anos fez uma aclamada performance no vão livre do MASP, projeto iconico do modernismo de Lina, sua compatriota. Inaugurado no fatídico ano de 1968, o arrojado vanguardismo estético e tecnológico do prédio pode também ser analisado pelo viés de símbolo de resistência à nossa vexaminosa ditadura militar – lembrando que Lina viveu na Itália do fascista Mussolini.

Isaac Julien, Emaranhados _ Entanglements (Lina Bo Bardi – A Marvellous Entanglement), 2019, impressão jato de tinta sobre papel Ilford gold fibre gloss, 90 x 110 cm
Agora com a dupla exposição muitos me perguntam por que o interesse desse inglês nesse projeto centrado nela? O “emaranhado” de correspondências que o destino traçou para Julien e Lina inicia em um dos temas recorrentes na obra dele, a questão do preconceito, da exploração e do imigrante. A imigrante Lina deixou um primeiro mundo arrasado e baixou no terceiro mundo com tudo a fazer.
Os pais de Julien fizeram o trajeto inverso, emigraram da pobre ilha de colonização inglesa Sta Lucia, no Caribe, para a capital do império britânico. Julien e sua família viveram em bairros londrinos com grandes concentrações de imigrantes e sofreram na pele negra inúmeros preconceitos.

Isaac Julien, O que é um Museu, Ato II _ What is a Museum, Act II (Lina Bo Bardi – A Marvellous Entanglement), 2019 ,impressão jato de tinta sobre papel Ilford gold fibre gloss, 110 x 135 cm
Outro ponto que os une é a condição de inferioridade aos olhos da sociedade, Lina, “inferior” como mulher, Julien, em sua condição de homossexual negro, questões que fizeram com que ambos enfrentassem grandes desafios até convencer aos outros de seus talentos criativos para realizar suas ambições profissionais. (Só sendo de uma dessas categorias e tendo nascido há mais tempo para entender como era. Eu também sou imigrante, vim de Pernambuco, no nordeste, para o sul…maravilha. Como mulher e divorciada com cinco filhos, confesso, não foi fácil).
Voltemos à Lina e ao Julien. Movido pela não-linearidade expressa na visão de Lina, Julien bolou um roteiro não-linear, tanto para o filme fragmentado, apresentado simultaneamente em vários telões no MASP, assim como em suas fotografias em mostra na nossa galeria. Nas duas versões, a série revela a vida da arquiteta e designer através de sua obra arquitetônica e através dos tempos com a presença simultânea da dupla de mãe e filha atrizes, nossas Fernandas, Montenegro e Torres, representando a Lina jovem e a Lina madura.

Isaac Julien, Um Maravilhoso Emaranhado _ A Marvellous Entanglement (Lina Bo Bardi – A Marvellous Entanglement), 2019, fotografia em papel Ilford galerie smooth pearl renaissance-pollerwachs e metacrilato, 180 x 240 cm
Com tomadas em prédios icônicos com sua assinatura, como o próprio MASP, o SESC Pompéia e o Solar do Unhão/Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM), em Salvador, a história pessoal, não-linear de Lina vai se desenrolando. Nas primorosas imagens e cuidadosa edição de Julien vibram a força de caráter de Lina e a potência humanista de sua arquitetura moderna magistral, de viés brutalista, transformada em um portal para o “maravilhoso emaranhado” da vida e da obra dessa imigrante e mestra visionária que tanto amou seu país de adoção.
SERVIÇO
“Isaac Julien: Lina Bo Bardi – um maravilhoso emaranhado– fotografias e colagens”
Até 24 de maio, 2025
Galeria Nara Roesler, São Paulo
I”saac Julien: Lina Bo Bardi — um maravilhoso emaranhado”
Edifício Pietro Maria Bardi do MASP
Até 3 de agosto, 2025
Com colaboração de Cynthia Garcia, historiadora de arte, premiada pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) cynthiagarciabr@gmail.com
Nara Roesler fundou a Galeria Nara Roesler em 1989. Com a sociedade de seus filhos Alexandre e Daniel, a galeria em São Paulo, uma das mais expressivas do mercado, ampliou a atuação inaugurando no Rio de Janeiro, em 2014, e no ano seguinte em Nova York.
info@nararoesler.art
Instagram: @galerianararoesler
http://www.nararoesler.com.br/
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