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Plantar café com a floresta de pé. Mais do que uma rima, cultivar produtos agrícolas em uma área de floresta preservada ou em um local previamente desmatado é uma realidade na Amazônia graças ao sistema agroflorestal. A metodologia de plantio une, de forma harmônica, o cultivo de café com espécies nativas em Apuí, no sul do Amazonas, e já conseguiu regenerar 234 hectares de áreas desmatadas.
As raízes do Café Apuí Agroflorestal são de 2008. Hoje, o projeto é referência e pode servir de modelo para harmonizar a produção agrícola com a preservação e regeneração da floresta. Por isso, essa história precisa ser contada e recontada.
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Quando o Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas (IDESAM) criou o projeto Semear Sustentabilidade com propósito de regenerar áreas desmatadas de Apuí, o município era conhecido pela pecuária extensiva, cultivo de café e pelos altos índices de desmatamento.
Jonatas Machado, fundador e diretor da Amazônia Agroflorestal, empresa responsável pela cadeia de valor do Café Apuí Agroflorestal, e antigo colaborador do IDESAM, contou à Forbes Agro que a equipe do projeto encontrou áreas pouco produtivas e abandonadas em Apuí. No entanto, o que lhes chamou atenção foi a qualidade dos frutos de café que estavam em volta da floresta ainda preservada.
“Os frutos de café que estavam nessa área abandonada, mas ao redor de mata nativa, estavam melhores do que os das áreas de produção ativa. Isso aconteceu porque a mata sombreou a área, fazendo o café maturar no tempo correto. Então, entendemos que era a natureza nos ensinando o que fazer. A partir daí, investimos no sistema agroflorestal e criamos o primeiro café agroflorestal da Amazônia”.
O potencial ambiental e social das agroflorestas
Segundo Lucimar Souza, diretora adjunta de Desenvolvimento Territorial do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), os sistemas agroflorestais são sistemas produtivos permanentes, em que há a associação do plantio de culturas de interesse comercial com espécies florestais.
“O sistema agroflorestal não deixa de ser uma imitação da floresta. E a Floresta Amazônica é uma floresta densa, ou seja, com muitas plantas por hectare. Então, aqui, implantamos sistemas agroflorestais a depender do arranjo de espécies. Tratando-se de cacau, por exemplo, vamos ter uma média de 900 a 1.100 plantas por hectare, combinado com as essências florestais que são adaptadas àquele bioma”, explica Lucimar.
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Em um contexto em que os efeitos das mudanças climáticas estão mais intensos, a diretora do IPAM ressalta que os sistemas agroflorestais são vistos como uma grande contribuição do setor agrícola para o clima, especialmente pelo seu potencial de sequestro de carbono e regeneração de áreas desmatadas.
Um estudo feito pela Nature Climate Change, em 2023, apontou, inclusive, que as agroflorestas mundiais podem sequestrar até 310 milhões de toneladas de carbono por ano, quantidade suficiente para compensar a emissão anual de gás carbônico na atmosfera gerada por cerca de 250 milhões de veículos de motor a combustão.
“Os sistemas agroflorestais, quando contraposto com outros sistemas produtivos, como a pecuária ou a monocultura de grãos, é um sistema que gera mais ganhos ambientais. O estoque de carbono é maior, a diversidade de espécies é maior, a qualidade do solo é melhor, e gera conforto, porque ele tem sombra, então facilita nas atividades ligadas à manutenção da área. Por esses motivos, o sistema agroflorestal é um modelo para ser pensado num contexto de emergência climática”, ressalta Lucimar.
Segundo o pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, Osvaldo Kato, os SAF’s (sistemas agroflorestais) são primordiais na restauração da floresta. “O acúmulo de carbono no solo em SAF’s é bastante significativo e melhora a qualidade do solo e, consequentemente, a da macrofauna do solo. Inclusive, é esse ganho ambiental que tem feito a adesão aos SAF’s aumentar, especialmente, no Pará”.
O pesquisador ainda explica que outra vantagem do sistema agroflorestal é o potencial comercial dos produtos cultivados.
“Engana-se quem assume que a agrofloresta é só para subsistência. As espécies florestais produzem frutos que podem ser aproveitados para comercializar. Por isso dizemos que a floresta vale mais em pé do que derrubada. A agrofloresta é boa para o grande produtor, que visa uma produção agroindustrial e tecnificada, justamente pelas possibilidades de comercialização”, explica.
Além disso, o pesquisador afirma que outro benefício do sistema é que o agricultor pode escolher as espécies que dão safras em períodos diferentes, garantindo, assim, uma produção durante o ano inteiro.
O mesmo vale para casos de agricultura familiar. Kato ressalta que os SAF’s (sistemas agroflorestais) podem garantir a segurança alimentar, especialmente em épocas de seca severa, como a que o país está enfrentando. No caso da região Amazônica, populações ribeirinhas que dependem da pesca, mas que possuem sistemas agroflorestais em sua propriedade, são menos afetadas pelos efeitos da falta de alimentos.
Sistema seguro, rentável e sustentável
Há quase 15 anos respirando sistemas agroflorestais, Jonatas Machado, diretor da Amazônia Agroflorestal, celebra as vantagens do modelo e os retornos que traz para as 115 famílias de agricultores aderidos ao projeto Café Apuí Agroflorestal. Hoje, na data que se comemora o Dia da Amazônia, ele contabiliza os frutos que estão colhendo e o alcance do café agroflorestal.
“Começamos com cerca de 10 hectares em Apuí, lá em 2012. Fomos para 90 implantados em 2021 e, agora, em 2023, contabilizamos 230 hectares só em Apuí. Atualmente, enviamos o nosso café agroflorestal para a Região Norte, São Paulo, mas também para Holanda, ou seja, já podemos dizer que o café agroflorestal já atravessou o Atlântico”.
A meta para 2025 é ambiciosa. Segundo o fundador da Amazônia Agroflorestal, a ideia é ampliar a área de produção do Café Apuí Agroflorestal de 234 para 400 hectares em sistemas agroflorestais em Apuí e produzir uma soma de 200 toneladas de café agroflorestal.
Para além dos números, Machado reflete sobre a possibilidade de variação de culturas que o sistema agroflorestal possibilita e como ele se auto regula. Nas propriedades rurais em que o projeto atua em Apuí, Jonatas conta que os SAF’s consorciam o plantio do café com ingá, açaí, cacau e outras espécies mais frutíferas, como a andiroba, e madeireiras, como jatobá e seringueira.
O Café Apuí Agroflorestal, segundo o diretor da Amazônia Agroflorestal, impacta, principalmente, a geração de renda do agricultor familiar. “A gente paga pelo menos entre 20% e 25% a mais do que o mercado paga para os nossos produtores e ainda garantimos a compra de produção, implementação dos sistemas, e ofertamos assistência técnica. Assim, a gente garante que ele vai vender toda a produção dele e ter o retorno justo”.
Segundo dados levantados pela Amazônia Agroflorestal, em 2022, a produção do café agroflorestal gerou cerca de 218 mil de renda total, e a renda média das 35 famílias que colheram o grão foi de R$9.229,00 por ano. Jonatas ressalta que existem produtores que conseguem lucrar ainda mais.
Quanto ao potencial de regeneração do sistema agroflorestal, Jonatas conta em tom animado que desde a implementação do projeto, em 2012, o Café Apuí Agroflorestal já conseguiu regenerar 234 hectares de terras desmatadas. “Cada hectare de café plantado é um hectare de floresta regenerada”.
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O post Como o café agroflorestal salva o grão na Amazônia apareceu primeiro em Forbes Brasil.