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Antes de começarmos a discorrer sobre a relação entre moda e esporte, vamos a alguns fatos importantes:
Na juventude, nos anos 1930, Emilio Pucci era integrante da equipe italiana olímpica de esqui.
Como velocista, Ottavio Missoni sagrou-se campeão italiano dos 400 metros, em 1939.
O francês André Courrèges, o japonês Issey Miyake e a marca Balmain vestiram atletas em edições dos Jogos Olímpicos.
As marcas Comme des Garçons e Paco Rabanne costumam usar distintivos de times de futebol em algumas de suas criações.
Dolce & Gabbana já vestiu a seleção italiana de futebol fora dos campos. Além dos craques David Beckham e Lionel Messi, a dupla de estilistas italianos também propôs assinar os ternos da seleção brasileira, mas nunca recebeu resposta da CBF.
Atualmente, quem veste a “Azzurra” é Giorgio Armani.
Os tenistas André Agassi, Serena e Venus Williams são considerados os atletas mais fashion dos últimos tempos.
A ligação entre moda e esportes, no entanto, não é recente e nem se limita a isso. Basicamente, é um fenômeno do século 20 e tem a ver com o corpo colocado em evidência a partir do primeiro pós-guerra, quando as atividades ao ar livre, os exercícios físicos e os esportes se popularizaram como nunca. Saúde, vigor e juventude estavam em alta. A dobradinha moda-esporte voltou à baila agora com os Jogos Olímpicos de 2024. A sede foi, mais uma vez, Paris, como foi em 1900 e 1924, e a capital da moda tratou de celebrar já a partir do ano passado, com a mostra Moda
e Esporte: De um Pódio a Outro, no Musée des Arts Decoratifs, que permaneceu em cartaz até o início de abril e investigou o assunto desde a Antiguidade clássica, como pede um museu.
Em 26 de julho, na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos, a delegação da França se apresentou com uniformes desenhados pela grife Berluti – integrante do conglomerado de luxo LVMH, um dos patrocinadores master do evento –, também responsável pelos uniformes da delegação paraolímpica. Para as competições, os uniformes e equipamentos ficaram por conta da Le Coq Sportif. A delegação brasileira foi vestida pela Riachuelo.
O “jacaré” das quadras
É importante observar que, como o esporte, a moda adotou inovações em termos de materiais, design e tecnologia. Tudo incorporado no guarda-roupa do dia a dia, visando ao conforto e à praticidade. As formas facilitam os movimentos, os tecidos “respiram”, são mais leves, resistentes e de secagem rápida. Conforto e segurança entram na equação da elegância. Na cartela de cores, o contraste entre básicos neutros e tons vibrantes e contrastantes
sugere leveza, energia e vitória.
Jean Patou, Jeanne Lanvin, Coco Chanel e Elsa Schiaparelli foram os primeiros estilistas a abraçarem sem reservas os esportes nas criações para uma clientela do jet set. Ocasiões sociais não faltavam: corridas de cavalo, garden parties, balneários à beira mar, jogos de tênis…
Assim como as irmãs Williams, a tenista Suzanne Lenglen era uma estrela disputada pelos grandes nomes da moda da época. E, em se tratando de tênis, ninguém é mais célebre para a moda esportiva do que o francês René Lacoste (1904-1996). Rico e elegante, em 1933 ele fundou a Société Chemise Lacoste, patenteando e produzindo as próprias raquetes e a emblemática camisa polo com a efígie do jacaré bordado no peito – hoje um ícone básico tão onipresente quanto o jeans. Detalhe: nas quadras, René Lacoste era conhecido pelos fãs como “Alligator”.
Quatro pedaços de nada
Enquanto isso, do outro lado do Atlântico, a mulher moderna americana queria cada vez mais praticidade e rapidez nas tarefas domésticas. E os esportes exerciam uma influência fundamental no american way of life, inspirando o figurino descontraído de uma nação jovem.
Entra em cena Claire McCardell, considerada a mãe do sportswear. Treinada na alta-costura em Paris – era uma entusiasta do trabalho de Madame Vionnet –, Claire pensava em roupas para o dia a dia: braços livres para gestos amplos, calças compridas ou bermudas, confortáveis malhas de tricô, vestidos sem muitos adornos, fáceis de usar e lavar. Seus materiais favoritos eram jérsei, chita, lã e índigo.
Ela investiu sem reserva nos maiôs e trajes de banho em duas peças. Por falar neles, certo jornalista gaiato definiu como “quatro pedaços de nada” o traje de banho criado pelo engenheiro automobilístico francês Louis Réard, em 1946, batizado de biquíni – por causa do atol de Bikini, no Oceano Pacífico, onde foram feitos os testes da bomba atômica. Sem dúvida, uma criação demolidora.
Rebeldes e elegantes de academia
Na temporada de verão da alta-costura, em 2014, quando Raf Simons (Dior) e Karl Lagerfeld (Chanel) mandaram as modelos para a passarela calçando tênis, não foi um choque. Apenas uma consequência. O calçado com solado de borracha de pneu – criado por Charles Goodyear no século 19 – há muito não era mais domínio apenas esportivo.
Flexível, impermeável e confortável, ele vivera várias encarnações. A marca americana Converse e a
alemã Adidas cuidaram de aperfeiçoá-lo para todas as competições e quadras. Nos anos 1950, virou símbolo de contestação jovem – junto com o jeans e a jaqueta de couro. E, quando Farrah Fawcett apareceu no seriado As Panteras com um Nike Cortez nos pés, ele virou fashion.
Fenômeno parecido aconteceu com o moletom. Inicialmente conhecido como agasalho de ginástica, ele deixou de ser roupa de atleta para vestir o público em geral. Era o final da era Disco e o começo da malhação aeróbica (“tem que correr, tem que suar, respiração, musculação…”). Unissex (o antecessor do “agênero”), aconchegante e extremamente confortável, o moletom viveu o momento fashion com direito a tratamento deluxe, produzido em versões de seda e em outros materiais nobres, usado com bijoux e salto alto – nas pistas do Studio 54 ou do Gallery. A americana Norma Kamali e a francesa Sonia Rykiel desenharam suas próprias versões da peça. Lagerfeld não perdoou: “Quando você compra uma calça de moletom, é sinal que perdeu as rédeas da sua vida”.
Glamazons & bandage dress
Pense nos vídeos de aeróbica de Jane Fonda e no filme Flashdance. Todo mundo podia ter um corpão para chamar de seu e se exibir. Esses corpos esculpidos, pródigos em curvas, abdomens trincados, a deliciosa volúpia, resultaram na onda das Glamazons. Mulheres empoderadas de corpo e alma. Lembre dos bodysuits e powersuits de Donna Karan, da silhueta près-du-corps de Azzedine Alaïa, do bandage dress de Hervé Léger, da sensualidade exuberante de Dolce & Gabbana e Versace, em que cada polegada feminina contava. No casting: Grace Jones, Linda Evangelista, Cindy Crawford, Anna Nicole Smith e… Naomi Campbell.
A musa olímpica desse momento “physical” foi, sem dúvida, a velocista americana Florence Griffith-Joyner, coberta de medalhas nos Jogos de Los Angeles (1984) e Seul (1988), exibindo unhas longas pintadas com as cores da bandeira dos EUA. Uma tigresa, sem dúvida.
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Quadras, ruas, passarelas e além
Chama-se streetwear o cruzamento entre moda, música pop, jogos de quadra e skate. Nomes como Nike, Adidas, Converse e Puma subiram nas passarelas em carreira solo ou em parcerias antes improváveis. Yohji Yamamoto e Gucci com Adidas, Balmain com Puma, moletom com lamê, tênis com Cartier, camisa de futebol com Tiffany, polo com Louis Vuitton. É bling-bling, é hi-lo, é geleia geral.
E o cinema, que nunca pode ficar de fora, tem o momento fashion-esportivo mais emblemático do século até agora. Uma Thurman em Kill Bill Vol.1 (2003), de Quentin Tarantino. Para vestir a atriz na sequência clímax do filme, a figurinista Catherine Marie Thomas diz ter se inspirado na Prada e no uniforme usado por Bruce Lee no filme Jogo da Morte. Arrematou com um tênis Asics modelo Onitsuka Tiger Mexico 66. Desde então um best-seller.
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