Agro regenerativo: porque é preciso dialogar com o futuro do alimento

  • Post author:
  • Reading time:7 mins read
Guetty

Cadeias produtivas, como as dos grãos (entre eles o milheto), precisam ser olhadas por inteiro no agro regenerativo

O diálogo sobre o futuro do setor de alimentação está mais intenso do que nunca, enquanto as maiores empresas do mundo lideram a mudança para uma era transformadora na forma como se produz e consome alimentos. Em 2021, a PepsiCo anunciou uma meta ambiciosa de expandir as práticas agrícolas regenerativas em 2,8 milhões de hectares até 2030, com o objetivo de eliminar pelo menos três milhões de toneladas de GEEs (gases de efeito estufa). Posteriormente, o Walmart e a Cargill também se comprometeram a adotar essas práticas em 20,2 milhões e 4,04 milhões de hectares, respectivamente.

Siga a Forbes no WhatsApp e receba as principais notícias sobre negócios, carreira, tecnologia e estilo de vida

O Conselho de Defesa dos Recursos Naturais (NRDC, na sigla em inglês), grupo sediado em Nova York, que reúne três milhões de ativistas, define agricultura regenerativa como um movimento que “aborda a crise climática com práticas que sequestram mais carbono no solo e ajudam a tornar terras agrícolas e comunidades locais mais resilientes”. Como disse Christopher Marquis, professor de gestão chinesa na Universidade de Cambridge e colaborador da Forbes EUA, a mudança para essas práticas exige o trabalho mútuo entre agricultores com visão de futuro, parceiros financeiros e varejistas, já que a maior parte das emissões relacionadas aos alimentos vêm da agricultura e do uso da terra.

As mudanças na base produtiva, aliadas à demanda dos consumidores por práticas mais sustentáveis na cadeia de suprimento de alimentos, acelerou a necessidade de as empresas líderes identificarem e implementarem soluções para enfrentar a crise climática. Essa é uma oportunidade de ouro para evitar atritos com o modelo de produção tradicional, implementar estratégias de longo prazo que incentivem a inovação, priorizem a sustentabilidade e promovam mudanças em todo o setor.

A Unilever é um exemplo de empresa que está expandindo seu foco para além da visão comum de saúde e nutrição, em favor de diretrizes específicas sobre práticas agrícolas regenerativas para solos, água, clima, biodiversidade e meios de subsistência, sinalizando uma mudança radical que abrange algo totalmente novo: o impacto ambiental dos alimentos. Mas as discussões sobre bem-estar, nutrição e impacto ambiental permanecem, em grande parte, em conversas paralelas e desconectadas.

Leia também:

Agricultura regenerativa: a receita da ADM para fazer 200 mil hectares no Brasil
Como agricultura regenerativa entra na agenda de marcas, produtores e consumidores
Rockefeller, Builders e Schmidt, os bilionários que investem em agricultura regenerativa

De modo geral, os consumidores querem fazer as escolhas certas na hora de comprar alimentos saudáveis e sustentáveis. No entanto, os fornecedores e varejistas de alimentos ainda precisam tornar essas escolhas mais acessíveis e baratas.

Transformação monumental do setor

Erin Kappelhof, CEO da Eat Well Global, consultoria especializada em sustentabilidade e saúde no setor de alimentos, destaca uma mudança significativa: “As prioridades nos negócios, narrativas e metas relacionadas à saúde se concentravam na redução de maus nutrientes e, talvez, na inclusão e melhoria de nutrientes demandados pelos consumidores. Hoje, vemos uma grande procura pela agricultura regenerativa e sustentabilidade, que se sobrepõe às velhas agendas corporativas de nutrição e bem-estar.”

Siga a ForbesAgro no Instagram

As maiores empresas do mundo devem tomar medidas para alcançar um duplo impacto significativo: planeta e pessoas mais saudáveis. Mas estarão estas empresas preparadas para se adaptarem funcionalmente às oportunidades da agricultura regenerativa para construir o portfólio alimentar do futuro? Existem vários obstáculos, incluindo a falta de infraestrutura, sistemas produtivos desatualizados, o aumento da demanda global por proteínas e a falta de estudos de caso ou histórias de sucesso para incentivar essas práticas. Embora esses obstáculos sejam multifacetados, eles não são intransponíveis.

Como podemos criar um futuro mais sustentável?

Se o setor de alimentos continuar em seu caminho habitual, um futuro melhor não será possível. As empresas com influência sobre as cadeias de suprimentos e o comportamento do consumidor podem conduzir a economia para uma reavaliação dos modelos operacionais e promover a inovação em seus portfólios, criando novas abordagens e em escala para implementar as práticas agrícolas regenerativas.

Por onde começar?

Nicole Balderas, fundadora da Bell Mountain Consulting, uma consultoria de foodtechs sediada em Saint Louis, no Missouri (EUA), defende que é preciso ter uma compreensão maior sobre a cadeia de suprimentos e usar essas informações para melhorar o setor. “Adote medidas para produzir alimentos que são cultivados por meio de métodos sustentáveis — como uma cultura de baixo impacto na água, uma forrageira, bioinsumos ou uma pequena lavoura regenerativa — e simplesmente comece. Crie demanda por algo melhor.”

Para abordar a sustentabilidade de forma eficaz, é preciso repensar e reavaliar princípios através de uma lente de inovação:

– Identificar atributos de diferentes produtos que são positivos para o planeta e às pessoas;

– Agregar ingredientes water-friendly (de baixo impacto no uso da água) em novos produtos;

– Comprometer-se a investir em como e onde os produtos são cultivados, usando práticas regenerativas e/ou orgânicas;

– Cultivar lavouras de forma regenerativa, mesmo que o processo seja imperfeito;

– Compreender e trabalhar as limitações atuais no fornecimento de alimentos sustentáveis em escala;

– Considerar estratégias para produzir alimentos mais saudáveis e sustentáveis que sejam acessíveis em escala para todos e trabalhar para integrar essas estratégias à cadeia de suprimento de alimentos;

– Criar demandas de consumo. Por exemplo, a Califórnia e Massachusetts aprovaram uma legislação que proíbe o confinamento intensivo de animais em fazendas (no modelo dos EUA, no caso dos bovinos, os animais são totalmente confinados. No Brasil, o confinamento é de cerca de 180 dias, no final do processo de engorda). A maioria dos consumidores não entende ou não conseguem enxergar a forma como os animais são criados ou dos possíveis riscos do modelo de criação.

Para desenvolver um portfólio de alimentos do futuro, incentive as partes interessadas a adotar as seguintes etapas no processo produtivo:

– Determine um ponto de partida, analisando em que pé o empreendimento se encontra, depois decida para onde ir;

– Entenda que nada é preto e branco: é preciso entender as nuances do negócio;

– Avalie a política e regulamentação que deseja adotar;

– Reconheça que as mudanças levam muito tempo e envolvem muitos colaboradores. As falhas e imperfeições revelam grande parte do que precisa ser adotado em larga escala;

– Revise as métricas de longo prazo, honrando e aprendendo com as ações e fracassos;

– Reconheça que esse é um jogo de longo prazo que não necessariamente se encaixa nos lucros obtidos a curto prazo.

O caminho a seguir

Kappelhof, da Eat Well Global, resume o futuro de maneira simples: “Este livro ainda não foi escrito”. Embora o setor agrícola dos EUA ainda não tenha padrões unificados de agricultura regenerativa (n.r: e o Brasil também não), as empresas inovadoras dispostas a investir em novos sistemas e processos podem causar um impacto significativo, juntando-se ao movimento que busca uma agricultura mais sustentável.

A transformação de um setor não acontece da noite para o dia, mas iniciativas em escala e o compromisso de implementar um único e novo objetivo, a cada oportunidade que se apresenta, podem moldar um futuro delicioso, nutritivo e mais seguro.

*Michelle Hayward é colaboradora da Forbes EUA. É fundadora da Bluedog, consultoria de estratégia de negócios e marketing com sede em Chicago.

O post Agro regenerativo: porque é preciso dialogar com o futuro do alimento apareceu primeiro em Forbes Brasil.

Deixe um comentário