Um ano do caso Americanas: como o setor de varejo foi afetado no período?

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Ueslei Marcelino/Reuters

A expectativa criada pelo setor, de que os clientes da Americanas se direcionariam aos concorrentes, não se concretizou

Há exatamente um ano, em 11 de janeiro de 2023, a varejista Americanas (AMER3), informava ao mercado que havia encontrado “inconsistências contábeis” da ordem de R$ 20 bilhões ligadas à conta de fornecedores em seus registros financeiros. A companhia, que não trocava sua liderança há 20 anos, havia acabado de eleger Sergio Rial, ex-presidente do Conselho de Administração do banco Santander Brasil, para ocupar a cadeira de presidente-executivo. Rial pediu demissão poucos dias depois da divulgação do fato relevante.

Em um dia, as ações da Americanas perderam 77,3% de seu valor, que correspondia a R$ 8,4 bilhões na época. Hoje, a varejista, em recuperação judicial, está avaliada em R$ 785 milhões.

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O rombo no fim se mostrou muito superior ao informado no dia. Chegou a R$ 43 bilhões e não afetou apenas a varejista. Prejudicou como um todo um setor da economia que já estava fragilizado pelo aumento dos juros no país e pelo período pós-pandemia, que traria uma nova onda de calmaria para as grandes marcas.

A expectativa criada pelo setor, de que os clientes da Americanas se direcionariam aos competidores, não se concretizou. Com isso, o Grupo Casas Bahia (BHIA3) e o Magazine Luiza (MGLU3), dois dos maiores concorrentes diretos da Americanas, também tiveram um ano sofrido. As ações recuaram 81,9% e 24,3%, respectivamente, fazendo o valor de mercado das companhias cair de forma expressiva, chegando a R$ 1 bilhão e R$ 14,3 bilhões.

“Creio que não há uma relação direta entre o desempenho ruim das empresas de varejo com o caso das Americanas, já que o setor como um todo passa por desafios e mudanças estruturais”, afirma Carlos Honorato, professor da FIA Business School. “Porém, em situações como essa sempre há um ‘contágio sistêmico’, isto é, o risco de que outras empresas estejam fazendo as mesmas práticas “pouco ortodoxas” na contabilidade, o que gera aumento na desconfiança e no risco por consequência.”

Para Mariana Fernanda Quelhas, analista da Warren Investimentos, o colapso não afetou as concorrentes diretamente, mas mudou o mercado como um todo. “Com a descoberta da fraude contábil, houve aumento da percepção de risco nos balanços. Isso tornou os bancos mais restritivos na concessão de crédito ao longo de 2023, principalmente, na modalidade de risco sacado, cujo reporte inadequado resultou no rombo. Com a menor exposição dos bancos ao produto, o custo de financiamento aumentou para as varejistas em geral”, afirma.

Com o cenário, varejistas de outros segmentos, como supermercados e vestuário, também registraram resultados negativos no período analisado. Entre os destaques negativos estão Marisa (AMAR3), Grupo Pão de Açúcar (PCAR3) e Blau Farmacêutica (BLAU3), com perdas de 52,1%, 43,9% e 38%, respectivamente.

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Para Gabriel Meira, especialista e sócio da Valor Investimentos, o maior problema para essas companhias foi o aumento do custo do dinheiro após o colapso das Americanas. “Os credores ficaram muito mais detalhistas e minuciosos na hora de emprestar dinheiro para companhias do setor, o que tornou o dinheiro muito mais caro, afetando diretamente o desenvolvimento dessas empresas, que vivem de empréstimos”, explica.

Por outro lado, algumas companhias conseguiram surfar no momento conturbado, como foi o caso da C&A (CEAB3), que viu seus ativos subirem 236% no ano. No mesmo segmento da Americanas, as ações da Lojas Quero-Quero (LJQQ3) avançaram 47,3%.

O levantamento de dados relacionados às varejistas foi realizado por Einar Rivero, da Elos Ayta Consultoria.

Perspectivas

Na visão de Honorato, professor da FIA Business School, a queda dos juros pode ajudar o setor, mas é apenas o começo da solução. “Os juros são uma das pontas do problema. Certamente com maior acesso a crédito e parcelamento mais longos, o consumo aumenta e o faturamento das lojas cresce”, diz. “Porém, o setor não deve voltar a ser como antes e sim se tornar algo novo, que alinhe uma experiência agradável de compra com a facilidade dos meios online. Nenhum setor sobrevive dependendo de mudanças externas, a reinvenção tem que vir de dentro”.

Natalia Sperati, sócia de estratégia da EY-Parthenon para varejo e bens de consumo para a América Latina, também acredita que será um ano mais positivo para o setor. “Para 2024, a tendência é um cenário mais positivo, tanto pela queda na sensibilidade de preço do consumidor quanto pela queda de juros”, diz. “Essa queda na sensibilidade possibilita um aumento nas compras por impulsos, sendo menos racional ao preço e mais preocupado com questões como qualidade e sustentabilidade. Já com a baixa da taxa de juros, os varejistas voltarão a investir e a oferta de crédito será menos custosa”.

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