Se os fabricantes europeus não produzirem em breve veículos eléctricos para o mercado de massa, não conseguirão cumprir as quotas rigorosas para vender esse tipo de carro e deixarão o campo aberto para os chineses.
Especialistas dizem que há pouca probabilidade de que quaisquer equivalentes europeus dos chineses BYD Seagull e Wuling Bingo apareçam tão cedo. A única esperança para a indústria automotiva da União Europeia e do Reino Unido é um relaxamento das regras que levarão os motores de combustão interna à iminente morte.
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Governos europeus insistem que os EVs devem conquistar pelo menos 80% de todas as vendas até 2030. Em 2024, na Grã-Bretanha, da mesma forma, a quota é de 22%, aumentando continuamente até 2030 para 80% e para 100% em 2035. Na União Europeia, uma fórmula baseada em peso e emissões de dióxido de carbono forçará uma proporção semelhante de aumentos nas vendas e penalidades por fracassos. Isso flexibilizou as regras para 2035 ao permitir um número limitado de veículos de combustão interna abastecidos com combustível sintético.
Nos EUA as regras são mais flexíveis, com a exigência de 67% dos emplacamentos de elétricos até 2032. Por outro lado, a Califórnia quer proibir a venda de novos carros a combustão interna até 2035, abrindo exceção apenas aos híbridos do tipo plug-in.
O plano europeu pressupõe que EVs verdadeiramente acessíveis estejam disponíveis em grande número. O problema é que os fabricantes europeus têm estado adormecidos durante a transição energética, e assim modelos do tipo destinados à classe trabalhadora não estão disponíveis.
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Fabricantes europeus falam de carros novos “acessíveis” a partir de cerca de 25 mil euros, mas os assalariados médios podem muito bem zombar desta ideia. Até recentemente, pequenos carros a combustão – como Ford Ka, Citroen C1, Peugeot 108 e Renault Twingo – estavam disponíveis por cerca de 12 mil euros.
Para piorar, as regulamentações da União Europeia destinadas a prejudicar as vendas de motores de combustão interna aumentaram os preços iniciais para perto de 20 mil euros. E a maioria dos preços dos EVs começa em cerca de 30 mil euros, sendo que a média é de 50 mil euros.
Pequenos veículos eléctricos como o BYD Seagull são vendidos por menos de US$ 10 mil na China e poderiam, em teoria, ser vendidos na Europa por algo próximo a esse valor. Eles têm cerca de 160 quilômetros de autonomia e velocidade máxima próxima a 100 km/h. Podem, portanto, cumprir talvez 90% dos requisitos de mobilidade urbana.
Essas metas são cruciais para o futuro da indústria automobilística europeia porque existem enormes penalidades para o não cumprimento delas: no Reino Unido, para cada venda de um veículo a combustão acima do limite há uma multa de £ 15 mil. Segundo relatório da Autovista, Ford, Toyota e Nissan são as mais expostas no país. Contudo, há uma complexa fórmula que permite que empresas que não cumprirem as metas comprem cotas de fabricantes de elétricos, como a Tesla, ainda de acordo com a consultoria europeia.
Um relatório de dezembro do banco de investimento UBS previu vendas de 9,6 milhões em 2030. No entanto, espera-se que isto seja revisto para baixo na sequência do abalo no último trimestre de 2023, quando Ford, GM, VW e Mercedes tiveram de reavaliar os seus planos para carros eléctricos, o que, particularmente nos EUA, levou a grandes estoques de veículos não vendidos.
O analista automotivo britânico Charles Tennant se pergunta se as contas para União Europeia e Reino Unido são alcançáveis.
“Embora os early adopters endinheirados e os usuários de carros de frota tenham se beneficiado de vantagens fiscais e aproveitado os elétricos, o mesmo não se pode dizer dos clientes do mercado de massa, que estão a ser deixados para trás na corrida para um futuro eletrificado”, avalia Tennant.
“Legisladores devem encorajar uma tendência de incentivos para eléctricos, com abates fiscais para pesquisa e desenvolvimento para os fabricantes e descontos nos preços de compra para clientes, ao mesmo tempo em que aumentam progressivamente a tributação da gasolina e do diesel. Simplesmente estabelecer metas para vendas de veículos elétricos é claramente apenas metade da equação”, complementa.
O analista destacou ainda que a desaceleração nas vendas de EVs foi relacionada apenas aos preços altos, ansiedade em relação à autonomia e duração da bateria. Mas têm surgido outros obstáculos à medida que os custos dos seguros disparam, serviços de reparação enfrentam dificuldades e os baixos valores residuais minam as finanças do leasing.
“É por isso que os legisladores precisam repensar a direção da indústria e entusiasmar os clientes do mercado de massa a considerarem um EV antes de qualquer proibição total de carros a combustão”, acrescentou.
Frank Schwope, professor de Indústria Automóvel na Universidade de Ciências Aplicadas FHM Hannover, concorda que deverá haver alguma diluição no calendário dos governos até 2035. “Decisões políticas na Europa a favor do motor a combustão são concebíveis para proteger a indústria automobilística europeia”, disse.
“Nos próximos anos, uma onda de mais de vinte fabricantes chineses chegará à Europa, dos quais entre cinco e dez permanecerão. Participações de mercado entre 10% e 15% para produtos chineses são realistas”, concluiu Schwope.
Julia Poliscanova, Diretora Sênior de Veículos e Cadeias de Abastecimento do grupo Transport & Environment , disse que baterias mais baratas, técnicas de produção em massa e produtos químicos inovadores para baterias na Europa ajudariam a desenvolver EVs mais acessíveis no continente.
“Citroën, Renault e Volkswagen anunciaram modelos BEV de preços ainda mais baixos para 2025. A questão não é que a produção de EVs baratos na Europa seja impossível, mas que os fabricantes de automóveis europeus abandonem propositalmente o segmento pequeno em favor de carros grandes com maior lucro”, ponderou Poliscanova.
“Espero que, para o bem da sua própria sobrevivência, mudem a estratégia, pois dar prioridade aos EVs compactos na Europa é a melhor forma de evitar uma enxurrada de pequenos EVs chineses. No geral, valores entre 20 mil e 25 mil euros em 2025 é uma opção acessível. A maioria dos novos carros fósseis custa o mesmo. E ninguém pode prever as inovações ou reduções de custos viáveis até 2030”, acrescentou a executiva.
Na semana passada, a Volkswagen adiou o lançamento do ID.2, seu elétrico de 25 mil euros, de 2025 para maio de 2026. Na Alemanha, o maior mercado da Europa, o fim abrupto dos subsídios aos EVs chocou os fabricantes.
“De acordo com as nossas projeções, menos 200 mil novos EVs serão vendidos na Alemanha em 2024”, disse o professor Ferdinand Dudenhoeffer, Diretor do Centro de Pesquisa Automotiva, sediado em Bochum, na Alemanha.
Dudenhoeffer disse que um segundo choque poderia ser a imposição de tarifas punitivas sobre as importações chinesas se a UE confirmar que houve subsídios ilegais do governo chinês à sua indústria. Isso significaria que os preços dos EVs na Europa permaneceriam elevados e a procura enfraqueceria.
“Parece que os políticos na Europa se tornarão o maior perigo para o futuro da nossa indústria automóvel”, disse Dudenhoeffer.
“Se os legisladores não conseguirem persuadir os fabricantes a fabricar carros urbanos pequenos e ajudar os consumidores a comprá-los, uma ameaça existencial poderá devastar a indústria europeia, à medida que propostas alternativas vindas da Ásia chegarem aqui em massa, com um desempenho de produto e um preço que os consumidores aceitarão”, completou Tennant.
*Como ex-correspondente automotivo europeu da Reuters, Neil Winton passou alguns anos escrevendo sobre o setor, abordando o “hype” corporativo e descobrindo como essas empresas gigantescas estão realmente se saindo. Adora dirigir desde as máquinas mais modestas até as mais espetaculares.
(Traduzido por Rodrigo Mora).
O post Por que a Europa precisa de carros elétricos baratos para evitar ameaças existenciais apareceu primeiro em Forbes Brasil.