COP28: 5 caminhos da agropecuária para ajudar a resolver a crise climática

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Guetty

Armazenamento de carbono no solo pode transformar terras agrícolas em sumidouros de carbono em grande escala

Com a COP28 (Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas) que acontece em Dubai, a agricultura é mais uma vez um tema chave entre as lideranças globais. Metade das terras habitáveis ​​do planeta são áreas agrícolas e, quando os campos são perturbados por maquinaria pesada, o solo – que armazena três vezes mais CO2 que a atmosfera – liberta grandes quantidades deste carbono retido.

A discussão não poderia ser mais oportuna: no mês passado, um novo artigo de uma equipa de cientistas, incluindo investigadores da NASA e do Instituto da Terra, da Universidade de Columbia, sugeriu que o mundo ultrapassará o limiar de aquecimento de 1,5 graus Celsius até ao final desta década.

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A boa notícia é que, em todo o mundo, os cientistas estão trabalhando para encontrar formas pelas quais a agropecuária pode tornar-se parte da solução climática, com um papel decisivo dos produtores rurais na tarefa de restaurar o ambiente em vez de aumentar o seu fardo. Confira cinco soluções particularmente promissoras.

Captura de carbono do solo

A regeneração do solo poderia melhorar a sua capacidade de atuar como sumidouro de carbono, retendo com sucesso os gases com efeito de estufa. Estudos previram que a melhoria da gestão do solo, como a redução de áreas de lavoura em função de sua maior produtividade e o aumento das leguminosas fixadoras de azoto, poderia compensar algo entre 5% e 10% das emissões globais de gases com efeito de estufa.

Uma abordagem promissora é o aumento do intemperismo das rochas, que se baseia na capacidade das rochas de silicato de extrair CO2 da atmosfera à medida que sofrem erosão ao longo de dezenas de milhares de anos. Os cientistas climáticos procuram acelerar este processo de remoção de carbono por meio da trituração de grandes rochas de silicato em partículas finas e da sua adição ao solo.

“O CO2 é fixado como moléculas de bicarbonato que são então lavadas através do solo, para os rios e, finalmente, para o mar, onde são fixadas no oceano durante provavelmente centenas de milhares de anos”, diz Steve McGrath, chefe do departamento de Ciências da Agricultura Sustentável, em Rothamsted, no Reino Unido.

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Outra abordagem interessante é adicionar micróbios benéficos às raízes das culturas, o que acelera a conversão de CO2 em minerais que permanecem permanentemente no solo. Nos EUA, a empresa Leaps, Andes, fez parceria com agricultores do Centro-Oeste para implantar seu tratamento microbiano de sementes em cerca de 20 mil hectares este ano, com mais expansão esperada para 2024. A sua solução microbiana oferece um fluxo de rendimento adicional para os agricultores, cujos campos se tornam sumidouros de carbono – uma vitória para as pessoas, os agricultores e o planeta.

(No Brasil, com pesquisas e soluções lideradas pela Embrapa, a fixação biológica de nitrogênio possibilitou aos produtores de soja economizar US$ 15,2 bilhões em fertilizantes químicos na safra 2019-2020, de acordo com um estudo do IDR-Paraná, o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná e a unidade Embrapa Soja, localizada em Londrina, PR. Especificamente, o Programa Soja Baixo Carbono também vem criando uma metodologia brasileira, baseada em protocolos científicos validados internacionalmente e deve ser finalizada nos próximos anos)

Cultivos de cobertura ou plantio direto

As culturas de cobertura são outra forma importante de alterar o teor de carbono do solo, incentivando os agricultores a minimizar a lavoura e a proteger o solo, cobrindo-o com gramíneas, leguminosas e outras plantas que podem ajudar a extrair CO2 do ar por meio da fotossíntese.

No ano passado, um artigo de cientistas dos EUA e de Marrocos sugeriu que as práticas de culturas de cobertura poderiam ajudar a converter muitas ecorregiões mediterrânicas quentes e secas, que ocupam quase 15% da área terrestre total global, em sumidouros significativos de carbono. (No Brasil, o plantio direto é utilizado em cerca de 33 milhões de hectares de área cultivada, de acordo com a FEBRAPDP, a Federação Brasileira de Plantio Direto na Palha).

Nos EUA, onde o plantio direto sempre patinou, uma tecnologia considerada inovadora como cultivo de cobertura e que está sendo explorado é o coverCress, oleaginosa de inverno que mostra potencial para ajudar a armazenar carbono no solo, originalmente um investimento da Leaps que agora é de propriedade majoritária da Bayer. É uma cultura comercial rotativa que combina a produção de cereais e os benefícios ambientais de uma cultura de cobertura sem perturbar outras colheitas. O óleo de semente extraído do grão CoverCress foi projetado para ter uma pontuação de intensidade de carbono mais baixa, com pesquisas sugerindo que ele poderia produzir um combustível de aviação sustentável.

Contribuição das proteínas alternativas

Produzir proteína animal de forma mais ecológica continua tão forte como sempre. A COP28 será a primeira conferência sobre alterações climáticas a ter um foco principal na alimentação, destacando que os sistemas alimentares de base animal respondem ​​por um terço de todas as emissões de gases com efeito de estufa provocadas pelo homem (e que hoje recebe atenção em busca de alternativas regenerativas, incluindo grandes produtores de carne, como o Brasil).

Em paralelo, nos próximos anos, prevê-se que mais combinações híbridas de proteínas vegetais e proteínas derivadas de fermentação cheguem ao mercado, como forma de contribuir com este mercado. Os custos de produção de carne cultivada continuam sendo um grande obstáculo, embora tenham caído 99% na última década. Analistas sugerem que se os custos seguirem uma trajetória semelhante à queda do custo da sequenciação do genoma humano, a carne cultivada poderá, teoricamente, atingir a paridade de custos com a produção de carne convencional até 2030, com algumas empresas mostrando progressos ainda mais rápidos (incluindo grandes frigoríficos e empresas de proteína animal).

Irrigação sustentável

No início deste ano, David Hannah, professor de Hidrologia na Universidade de Birmingham, na Inglaterra, escreveu que a gestão sustentável da água poderia funcionar como o “conector climático” na COP28, iniciando colaborações para construir a resiliência do planeta às alterações climáticas.
Para que isto aconteça, é necessário um maior investimento em novas tecnologias de irrigação sustentáveis, práticas que não esgotem a água dos rios, lagos e aquíferos, nem prejudiquem os fluxos ambientais.

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Lorenzo Rosa, principal pesquisador do departamento de Ecologia Global da Carnegie Institution for Science, em Stanford, nos EUA, destacou os sistemas de irrigação por gotejamento movidos a energia solar como um exemplo de tecnologia mais ecológica. Estes sistemas utilizam pequenas bombas movidas a energia solar para fornecer quantidades precisas de água diretamente às raízes das culturas, reduzindo o desperdício de água no processo.

“Esta é uma tecnologia de irrigação eficiente em termos de água e baixo carbono que deve ser implementada”, diz Rosa. “No entanto, a adoção tem sido muito lenta.”
Tal como acontece com as culturas de cobertura e a captura de carbono do solo, Rosa acredita que são necessários incentivos políticos para convencer os agricultores a comprometerem-se com tecnologias que permitam a produção de alimentos com menos água. Com as alterações climáticas destinadas a aumentar a variabilidade anual dos recursos hídricos, há também uma necessidade global crescente de instalações de armazenamento de água para a próxima geração, que possam ajudar a reduzir a escassez futura.

Uma nova forma promissora de armazenar água é chamada de recarga gerenciada de aquíferos, que se refere à liberação intencional de água de volta para camadas de rochas porosas ou sedimentos onde pode ser armazenada para uso posterior. A rocha porosa contém espaços microscópicos através dos quais o líquido ou o ar podem passar. Isto evitaria alguns dos impactos ambientais negativos do armazenamento de água em grandes barragens. A investigação já salientou anteriormente que a criação de tais barragens envolve a inundação da vegetação ou o desflorestamento, reduzindo a absorção natural e a fixação do dióxido de carbono atmosférico.

Mais produtos biológicos e menos sintéticos

Embora os sistemas alimentares globais dependam fortemente de fertilizantes azotados sintéticos para manter elevados os rendimentos das colheitas, a produção destes fertilizantes foi responsável por 2,1% de todas as emissões globais de gases com efeito de estufa em 2018, de acordo com um estudo publicado no Scientific Reports, no ano passado.

Investir em fertilizantes derivados de substâncias naturais, chamadas de produtos biológicos, representa outro caminho para reduzir o impacto do carbono na agricultura. Um exemplo é o biochar ou carvão biológico, que pode ser produzido a partir de resíduos humanos ou animais e estabiliza o carbono, que é liberado mais lentamente de volta à atmosfera.

Estudos estimaram que a adição de biochar ao solo agrícola poderia ajudar a sequestrar entre 0,3 e duas gigatoneladas de CO2 todos os anos entre agora e 2050. Como o biochar tem uma estrutura distinta, como um favo de mel, ele também pode armazenar nutrientes e água, melhorando a qualidade do solo e reduzindo a necessidade de fertilizantes industriais.

O crescimento dos produtos biológicos para as culturas é tal que se prevê agora que este setor ultrapasse o dos agroquímicos convencionais no final da década, com uma taxa composta de crescimento anual de 14% até 2029. (No Brasil, de acordo com a Embrapa, as maiores áreas sob controle biológico com bioprodutos registrados em 2022 foram soja (20 milhões de hectares), milho (9,8 milhões de hectares), cana-de-açúcar (6,6 milhões de hectares), café (400 mil hectares), outras culturas (4,1 milhões de hectares).

Assim, embora a agricultura tenha um impacto significativo no clima e na saúde do planeta, existem muitas estratégias à disposição para melhorar suas práticas nos próximos anos. Se os líderes políticos na COP28 e em todo o mundo apoiarem estas soluções, elas poderão percorrer um longo e sustentável caminho para manter a crise climática sob controle.

* Juergen Eckhardt é colaborador da Forbes EUA e lidera o Leaps da Bayer, braço de investimento de impacto da multinacional alemã (tradução e adaptação: ForbesAgro).

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