Em meio a empresas convocando seus funcionários para trabalhar alguns – ou todos – dias no escritório, o mercado de locações comerciais vem se movimentando para suprir esse retorno. No Brasil, a tendência de alta no preço dos aluguéis pode indicar como a procura será neste pós-pandemia. “A gente já começa a ver algumas empresas, especialmente as de tecnologia, que ainda estavam em home office, intensificando a atividade presencial e gerando aumento da demanda”, diz Yara Matsuyama, diretora de locações da consultoria imobiliária JLL.
O informe FipeZap mais recente, de junho de 2023, mostra um aumento de 5,18% nos preços da locação de imóveis comerciais nos últimos 12 meses, em comparação com uma inflação (IPCA) de 3,16%.
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Esse aquecimento do mercado imobiliário comercial, mesmo que ainda não se reflita diretamente nos preços dos imóveis da capital paulista, já pode ser visto nas taxas de vacância dos escritórios de alto padrão da cidade. Segundo levantamento da JLL, no primeiro trimestre de 2020, quando o mercado de escritórios vinha aquecido há meses, a taxa de vacância dos imóveis comerciais atingiu a mínima de 13,6% e, com a pandemia, chegou a 24,6% no terceiro trimestre de 2021.
Mesmo com uma alta taxa de vacância no último trimestre, de 25,6%, a absorção líquida (a diferença entre as locações e as devoluções de um período) foi positiva em 14 mil metros quadrados. Ou seja, mais empresas estão ocupando imóveis comerciais do que devolvendo. No terceiro trimestre de 2021, essa taxa era negativa em 25 mil metros quadrados.
Nesse mesmo período, a quantidade de lançamentos explodiu. Enquanto no último trimestre de 2022 foram colocados no mercado 20 mil metros quadrados novos, no trimestre passado foram 143 mil, segundo a JLL. “Indicadores mostram que as empresas estão aumentando suas áreas, então a absorção líquida volta a crescer”, diz Abbud.
A região da Faria Lima, que historicamente tem baixas taxas de vacância, está em 6,43% neste segundo trimestre do ano, mas já teve quase o dobro (11,5%) de espaços vazios no terceiro trimestre de 2021. A área deve receber 49 mil metros quadrados de empreendimentos até o fim do ano, segundo a previsão da consultoria SiiLA.
O cenário brasileiro é diferente de alguns centros urbanos famosos, como Chicago, Nova York e Pequim, que têm tido dificuldade para ocupar seus prédios comerciais, principalmente pela migração dos escritórios para cidades e bairros periféricos. “Isso está atrelado à falta de infraestrutura [nos centros urbanos brasileiros]”, diz Rodrigo Abbud, sócio-fundador da gestora de investimentos VBI Real Estate. “Tem um movimento de descentralização mundo afora que é inviável no Brasil. Se você vai para Alphaville, por exemplo, não tem metrô e você perde duas horas no trânsito.”
A demanda por escritórios no Brasil neste ano
Diferentemente do ano passado, quando os primeiros empregadores testavam a volta ao presencial ou o regime híbrido, em 2023 as políticas de trabalho já estão mais consolidadas e, com isso, já se tem uma melhor ideia das suas necessidades de espaço.
As transformações nos ambientes de trabalho, com empresas privilegiando espaços colaborativos no lugar daqueles individualmente reclusos para estimular a troca de experiências entre equipes e funcionários, também mudaram a forma como elas alugam imóveis comerciais. “A pandemia trouxe uma relevância para a laje que tenha um perfil mais aberto, com espaços colaborativos e de convivência, e que também que já estejam mobilizados e estruturados com cabines acústicas para calls, por exemplo” diz Daniel Gaiva, CEO da plataforma de aquisição de imóveis Rooftop.
Isso tem gerado um crescimento da locação de grandes espaços de escritórios para se adequar às reais necessidades das dinâmicas do trabalho presencial no pós-pandemia. “Nos últimos três anos, a gente tinha quase 80% dos fechamentos concentrados em demandas abaixo de 1 mil metros quadrados”, diz Yara Matsuyama. “Já no segundo trimestre de 2023, a gente teve um volume maior de fechamentos acima de mil metros quadrados, com 70% dos fechamentos abaixo desta metragem, o que acontece muito por conta dessa necessidade que fica mais aparente agora com um uso mais intenso dos escritórios”, completa.
A alternativa dos coworkings
Exemplos de empresas que cresceram no período final da pandemia – passando de 1.497 unidades no Brasil em 2019 para 2.443 em 2023, segundo o Censo Coworking –, os espaços de coworking se tornaram opções em um momento no qual o modelo de trabalho do futuro ainda é indefinido. Enquanto os contratos comerciais costumam durar cinco anos, as empresas de coworking têm contratos flexíveis de prestação de serviço. De acordo com o censo, 42% dos contratos com clientes têm duração de 7 a 12 meses.
A IWG, dona da Regus & Spaces, registrou faturamento recorde dos seus 34 anos de operação no primeiro semestre de 2023. “Hoje, eu opero com 30% mais demanda do que pré-pandemia”, diz Tiago Alves, CEO da Regus & Spaces no Brasil e autor do livro “Nem home nem office”. “65% dos meus clientes são empresas internacionais ou nacionais de grande porte”, diz Alves. No Brasil, 59% dos espaços desse tipo foram criados depois de 2019 e 80% deles não pertencem a grandes empresas: são compostos por apenas uma unidade.
Por outro lado, a empresa WeWork, que já chegou a ser o maior inquilino em Manhattan, revelou, em um comunicado, um “crescimento de dúvidas substanciais” sobre a quantidade de suas operações, com suas ações caindo 36% no início de agosto. Com tantas questões, o futuro da empresa não é promissor.
A tendência de afastamento dos escritórios de regiões centrais das cidades também tem sido melhor acompanhada pelos coworkings, que se espalham por bairros tradicionalmente residenciais e com múltiplas unidades de uma empresa na mesma cidade. “Durante a pandemia, eu abri unidades da Regus em Osasco, Santo Amaro e Lapa. E a tendência dos escritórios nessas regiões é ter salas menores”, diz Alves. “Existem empresas que alugam coworkings regionais para pessoas que estão trabalhando remotamente e longe da sede se encontrarem. É uma ideia genial para gerar pertencimento”, diz a pesquisadora Sylvia Hartmann, especialista em trabalho assíncrono.
Lá fora, o quadro é diferente
No início de agosto, o Zoom ordenou que seus funcionários retornassem ao trabalho presencial (por, no mínimo, dois dias por semana). Foi a manifestação mais recente entre grandes empresas globais que fizeram o mesmo chamado – Apple, X (ex-Twitter), Meta, Amazon, Disney e JP Morgan estão entre elas. Apesar dos nomes de peso, o regime 100% presencial não deve a ser a norma, mas vem ganhando força.
Um estudo da consultoria McKinsey feito em julho mostra que o trabalho híbrido deve ser o mais adotado, com a presença dos funcionários nos escritórios ainda 30% menor do que no pré-pandemia. “Acho que a gente não volta cinco dias da semana para o escritório, mas um retorno gradual para cada vez mais dias aos escritórios está no horizonte”, diz Fernando de Holanda Barbosa Filho, professor da FGV e pesquisador do IBRE (Instituto Brasileiro de Economia).
Dados levantados pela McKinsey e pela organização norte-americana NAIOP (Commercial Real Estate Development Association) indicam que a demanda por espaços de escritórios em grandes centros urbanos da América do Norte, Ásia e Europa deve continuar mais baixa do que era antes da pandemia. Em uma projeção pessimista, de uma cidade que seria fortemente afetada pela mudança de regimes de trabalho, a procura por espaços de escritório deverá cair 38% até 2030, enquanto uma cidade que foi impactada de maneira mediana deve ver uma queda de 13%, segundo o relatório.
Seja localizadas em coworkings ou seja em imóveis comerciais alugados, as empresas têm como principal fator a flexibilidade na obtenção de espaço físico para suas operações. Essas condições foram encontradas em cidades e bairros periféricos pelo mundo, diferentemente do Brasil, cujos centros urbanos e regiões historicamente comerciais retomam a procura por escritórios e projetam, para o próximo ano, lançamentos de empreendimentos para atender tal demanda que surge da consolidação do regime híbrido.
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