Em junho do ano passado, fotos de Margot Robbie e Ryan Gosling, estrelas do próximo filme da Barbie, viralizaram após os dois serem vistos filmando uma cena vestidos com roupas de ginástica neon dos anos 90 e patins amarelos brilhantes.
Um ano depois, com a estreia do filme marcada para esta quinta-feira (20 de julho), os fãs agora podem comprar as mesmas roupas com as quais ficaram obcecados. Os patins Barbie x Impala Rollerskates, de US$ 190, estão entre as mais de 100 colaborações e parcerias com marcas que a Mattel assinou para capitalizar a empolgação pelo filme dirigido por Greta Gerwig, um dos grandes lançamentos do ano.
A Barbie está “no início de mais um capítulo para a evolução da marca, que agora é reconhecida como uma ideia”, diz Richard Dickson, presidente e COO da Mattel, à Forbes, vestindo uma camiseta da Barbie. “A Barbie transcendeu de uma boneca para uma franquia. A capacidade de estender e promover a marca é muito maior do que qualquer produto em si.”
Veja como é a Casa dos Sonhos da Barbie, no Airbnb
Então, se parece que o mundo está ficando muito cor-de-rosa ultimamente, é de propósito. Há de tudo, desde Crocs com a marca da Barbie, até malas rosa da BEIS e escovas de dentes elétricas Barbie x Moon. Os fãs podem tomar banho com conjuntos de sabonetes Barbie x Truly, usar esmaltes Barbie x OPI, vestir sutiãs Barbie da MeUndies e se vestir com roupas Barbie x Gap. Eles podem ouvir a trilha sonora original do filme, que apresenta novos sucessos de Dua Lipa e Nicki Minaj. Eles podem até passar a noite na Casa de Sonhos da Barbie, em Malibu, no Airbnb – John Legend e Chrissy Teigen já levaram sua família, inclusive.
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O filme, que também tem Kate McKinnon, Issa Rae e Hari Nef como Barbies, Simu Liu, John Cena e Kingsley Ben-Adair como Kens, e Will Ferrell como CEO da Mattel, espera arrecadar entre US$ 80 milhões e US$ 100 milhões (R$ 386 milhões a R$ 482 milhões) em seu fim de semana de estreia. E os cinemas AMC anunciaram que cerca de 20 mil espectadores já compraram ingressos para uma sessão dupla de estreia de Barbie e Oppenheimer, o drama de Christopher Nolan sobre a invenção da bomba atômica.
Para uma boneca que se aproxima da idade de se aposentar – Barbie completará 65 anos no próximo ano -, ela não mostra sinais de desaceleração, apesar da longa carreira como modelo, enfermeira, bailarina, médica do exército, astronauta, paleontóloga, dentista, florista, professora de yoga e presidente dos Estados Unidos. A boneca multifacetada fez US$ 1,7 bilhão (R$ 8,2 bilhões) em vendas anuais em 2021, um recorde. No mesmo ano, Barbie foi nomeada o brinquedo número 1 do mundo. E isso foi antes do hype do filme.
Como a Mattel e a Barbie surgiram
A Mattel foi fundada em 1945 por Ruth Handler, seu marido Elliot e Matt Matson – o nome da marca foi uma junção dos primeiros nomes dos homens. Enquanto Elliot cuidava do design, Ruth cuidava dos negócios. “Ela era a audácia, a força motriz por trás da empresa”, diz Tanya Lee Stone, autora do livro “The Good, the Bad, and the Barbie”, à Forbes. “Ela foi a razão pela qual eles conseguiram sair da garagem para conseguir alugar um espaço.”
Como presidente da empresa, Ruth era “a personificação de sua boneca”, mostrando que “as mulheres podem ser o que quiserem”, acrescenta Robin Gerber, autora de “Barbie and Ruth: The Story of the World’s Most Famous Doll and the Woman Who Created Her”. “Essa mulher era uma empreendedora, líder corporativa, em uma indústria onde não existia mulheres nesse nível, em uma época em que elas não deveriam estar nessa posição.”
Ruth teve a ideia de criar a Barbie ao assistir sua filha Barbara e suas amigas brincando com bonecas de papel, cujas roupas rasgavam constantemente. A fascinação de Ruth era que as meninas não estavam fingindo ser crianças ou mães com suas criações, mas sim fingiam ser bibliotecárias e professoras. “Ela percebeu que as meninas só queriam ser mulheres adultas”, diz Gerber. Mas não existiam bonecas adultas para crianças brincarem.
A inspiração para o design veio a ela em uma viagem familiar a Lucerna, na Suíça, quando Ruth e Barbara avistaram uma boneca em uma loja de brinquedos. Seu nome era Bild Lilli, e ela foi modelada com base em uma personagem de desenho animado de um jornal local. Ruth comprou três e começou a criar um guarda-roupa para a boneca. “Ela entendeu imediatamente que podia fazer a boneca e, em seguida, roupas separadas”, diz Gerber.
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“O objetivo de Ruth era fazer uma miniatura de manequim e torná-la muito fácil para as meninas tirarem a cabeça e trocarem as roupas sem ficarem frustradas”, acrescenta Stone. Dessa forma, “elas podiam imaginar ser o que quiserem ser.”
A Barbie estreou em 1959 na Feira de Brinquedos Americana, em NY. Mas foi somente quando as crianças viram seu primeiro comercial de TV, ainda naquele ano, que o brinquedo realmente decolou. Cerca de 300 mil bonecas foram vendidas no primeiro ano, por US$ 3 cada (ou cerca de US$ 31 em valores de hoje). Hoje, uma Barbie original em condições perfeitas é vendida por mais de US$ 27.000 (R$ 130.000), e a variedade das edições contemporâneas varia de US$ 10,99 (R$ 53) para a Barbie Fashionista a uma boneca exclusiva criada pelo designer de joias australiano Stefano Canturi, que foi vendida por US$ 302.500 em 2012 – ou cerca de US$ 400.000 (R$ 1,9 milhão) hoje.
Pouco depois da chegada da Barbie, a empresa foi inundada com cartas perguntando se ela poderia ter um namorado. Em 1961, Ken – nomeado em homenagem ao filho dos Handlers, Kenneth – estreou. Kenneth Handler morreu aos 50 anos em 1994, e Barbara Handler tem 82 anos hoje.
“Se você possuísse ações da Mattel nos anos 60, estava obtendo retornos de dois dígitos todos os anos”, diz Gerber. Mas a próxima década trouxe problemas para os Handlers. Ruth, que havia sido diagnosticada com câncer de mama, renunciou em 1975 – três anos antes de ela e vários outros ex-executivos da Mattel serem acusados pela Comissão de Valores Mobiliários de fazer declarações financeiras falsas. Ela acabou se declarando culpada sem contestação.
A modernização da Barbie
Depois de alguns anos difíceis na década de 1980 – durante os quais a Barbie encontrou trabalho como instrutora de aeróbica, caixa de supermercado, agente de viagens e veterinária – ocorreu outro renascimento. “Levou 28 anos para que a Barbie alcançasse US$ 430 milhões em vendas e apenas três anos para chegar a US$ 700 milhões”, disse John Amerman, presidente da Mattel, à Forbes em 1991. A marca representava metade das vendas da Mattel na época.
Nos anos 2000, a Barbie entrou na era digital. Dickson supervisionou a criação da Barbie Entertainment. O primeiro filme da Barbie, o longa animado “Barbie e Quebra-Nozes”, foi lançado em 2001. O primeiro site da Barbie, o Barbie.com, também foi lançado.
Dickson deixou a Mattel em 2010 e voltou em 2014, quando a empresa enfrentou um de seus piores períodos. A Barbie havia atingido seu menor volume de vendas em 25 anos, com apenas US$ 900 milhões. “Uma das manchetes mais chocantes foi na CNN – que literalmente falava ‘A Barbie está morta?’”, lembra Dickson. O padrão de beleza que a boneca idealizava há mais de 50 anos – magra, branca, loira – não estava mais de acordo com a sociedade e seus consumidores. “Sua personificação da perfeição ficou ultrapassada”, diz ele.
Então, a Barbie precisou de uma grande mudança de imagem. A Mattel começou com seu tom de pele e etnias. “A metodologia real por trás disso não foi apenas introduzir bonecas com tons de pele diferentes, mas mudar toda a identidade gráfica da marca”, afirma Dickson. A embalagem e a publicidade comercial da Mattel foram atualizadas para refletir a nova diversidade. E o corpo super irreal da Barbie foi reimaginado para o século 21 – foram lançadas versões altas, baixas e cheinhas da boneca. Mas com a Barbie tendo um tamanho diferente, suas roupas, seus carros e suas casas também tiveram que mudar. “Tudo teve que ser reformulado.”
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O filme da Barbie reflete a relação complicada que o público teve com o ícone ao longo das décadas. “Greta Gerwig é defensora de contar histórias fortes lideradas por mulheres, onde elas são celebradas”, diz Dickson. “A marca Barbie não é exceção e mostra que a boneca é uma protagonista feminina muito forte no controle de sua própria história. Isso não teria sido possível se não tivéssemos feito um trabalho incrível anteriormente.”
Ou, como um dos trailers do filme, orgulhosamente anuncia: “Se você ama a Barbie, ou se você odeia a Barbie, este filme é para você.”
Durante a produção, Margot Robbie disse ao CEO Ynon Kreiz: “Se não reconhecermos certas coisas, se não dissermos, alguém mais vai dizer”. Dickson acrescenta: “Estávamos prontos para nos sentirmos desconfortavelmente confortáveis”.
Os negócios da Mattel daqui para frente
Decidir fazer um filme da Barbie não foi apenas uma extensão da marca. É uma estratégia de negócios de longo prazo, que será repetida várias vezes com o resto do portfólio da Mattel, que inclui cerca de 400 marcas de brinquedos.
E não é um jogo de estratégia totalmente original. A Hasbro lançou um filme do G.I. Joe em 2009. O primeiro filme, estrelado por Channing Tatum, arrecadou US$ 300 milhões em todo o mundo. A sequência, que adicionou Dwayne “The Rock” Johnson e Bruce Willis ao elenco, teve um desempenho ainda melhor, com US$ 375 milhões.
Então, se a Mattel pretende criar o próximo Universo Cinematográfico Marvel, a Barbie é seu Homem de Ferro. “Temos mais de 13 projetos de filmes em desenvolvimento. Temos mais de 30 programas de televisão em produção”, diz Dickson. A lista inclui um filme produzido por Daniel Kaluuya para adultos sobre o dinossauro Barney, um filme Hot Wheels produzido por J.J. Abrams e uma versão live-action liderada por Vin Diesel dos brinquedos Rock ‘Em Sock ‘Em Robots.
O lançamento da Barbie também ocorre em um momento em que o balanço patrimonial da Mattel precisa de um boost. A empresa encerrou o primeiro trimestre em abril com US$ 814,6 milhões (R$ 3,9 bilhões) em vendas líquidas, uma queda de 22% em relação ao ano anterior. A Barbie teve US$ 177 milhões (R$ 854 milhões) em vendas brutas em todo o mundo, 44% menor em relação ao ano anterior, mas representando quase 58% das vendas brutas da Mattel para bonecas em geral. “Não poderíamos estar mais confiantes e empolgados com o futuro da marca”, disse Dickson em uma recente teleconferência de resultados.
Sua positividade em relação à marca continua mais otimista do que o amado cor-de-rosa da Barbie. “Estamos trabalhando com os melhores dos melhores em jogos de console, jogos para celular e uma variedade de outras experiências digitais que colocam a Barbie na vanguarda”, diz Dickson. A boneca está agora na blockchain e foi a primeira marca de brinquedos a se tornar um NFT. “Estamos aceitando criptomoedas”, diz Dickson. “A Barbie é uma tela para artistas, influenciadores e colaborações.”
E, à medida que ela se aproxima dos 65 anos no próximo ano, o coração de Barbara Millicent Roberts continua batendo com o mesmo espírito que Ruth Handler instalou nela há seis décadas.
“A Barbie não é apenas um brinquedo”, diz Dickson. “Ela é uma fonte de inspiração.”
O post Império da Barbie: como uma boneca de US$ 3 virou um negócio multibilionário apareceu primeiro em Forbes Brasil.