Quando divórcios dão lucro: as separações corporativas

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As separações corporativas são conhecidas como cisões, spinoffs ou desinvestimentos

Divórcios são caros. Qualquer pessoa que já passou por um pode confirmar. Se estiver em dúvida, pergunte a Jeff Bezos. Em 2019, Jeff e MacKenzie finalizaram sua separação, que girou em torno de US$ 160 bilhões (R$ 819 bilhões), estabelecendo um recorde mundial que será difícil de bater. Só o tempo dirá se eles ficariam melhor juntos ou se, separados, estão livres para realizar seu verdadeiro potencial.

Há um consenso em que divórcios representam prejuízo. Além das discussões sobre patrimônio, custos que eram compartilhados, como moradia, passam a ter de ser pagos individualmente. No entanto, será que isso também vale para os divórcios societários, quando empresas separam seus negócios? E, no caso de as separações corporativas não provocarem prejuízo, onde está o valor e como o investidor pode ganhar?

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As separações corporativas são conhecidas como cisões, spinoffs ou desinvestimentos. O princípio é o mesmo, apesar dos nomes variados. Um spinoff ou cisão é uma decisão em que a empresa separa parte de suas atividades e as transforma em uma companhia independente, e vende uma participação ou o controle da nova empresa. Isso pode ser feito para um investidor estratégico ou por meio da abertura de capital.

Nesse segundo caso, a empresa pode distribuir ações da nova companhia para os acionistas da empresa original. É o contrário de uma abertura de capital (IPO, ou Initial Public Offering), em que você se inscreve para comprar ações. No caso do spinoff com abertura de capital, você ganha as ações da nova empresa, goste ou não.

Por que os spinoffs acontecem?

Um conglomerado é definido como várias partes que são agrupadas em uma mesma empresa, mas permanecem entidades distintas. Quanto maior e mais diversificada uma organização, mais difícil de gerenciar e menos eficiente ela se torna. Por isso, os conglomerados nunca beneficiaram consumidores nem investidores.

Quando uma empresa cresce demais e depressa por meio de aquisições, a cultura e o objetivo podem se perder, e o valor ser corroído, o que reduz os preços das ações. Por isso, ao longo dos anos, vários tiveram problemas e alguns até faliram. As principais causas derivam de fusões e aquisições mal sucedidas. Por isso, um spinoff pode destravar valor de uma unidade de negócios, permitindo que ela opere de forma independente. Aqui estão três exemplos:

Tyco International

Antes de se tornar um conglomerado diversificado com operações em saúde, segurança e outros setores, a Tyco International enfrentou problemas jurídicos e financeiros no início dos anos 2000.

A empresa foi acusada de fraude contábil e de informações privilegiadas, levando à renúncia de seu CEO e CFO e a uma queda significativa no preço de suas ações. Assim, a Tyco decidiu se dividir em três empresas separadas em 2007, sendo elas: Tyco Electronics, Tyco Healthcare e Tyco International.

A pressão dos investidores de que o portfólio variado estava comprometendo a geração de valor para os acionistas levou a essa separação. A divisão em três partes permitiu que os novos negócios simplificassem suas operações e se concentrassem em seus pontos fortes.

A separação também foi vista como uma forma de a Tyco se distanciar de seus escândalos corporativos anteriores, incluindo a prisão do ex-CEO Dennis Kozlowski por fraude. Tyco é uma das histórias de transformação mais conhecidas da utilização de spinoffs.

ITT Corp.

A ITT Corp. era um conglomerado com operações em eletrônicos, defesa e outras indústrias. Na década de 1990, ela teve problemas financeiros devido ao declínio de seus negócios de defesa e à aquisição fracassada de uma empresa de telecomunicações.

Em 2011, o conglomerado se dividiu em três empresas separadas: Xylem Inc., Exelis Inc. e ITT Corp. A fornecedora de tecnologia de água Xylem oferece instrumentos para análise, bem como soluções de transporte e tratamento de água e esgoto.

A Exelis é uma empresa de defesa e aeroespacial que agora faz parte da Harris Corp, prestava serviços em comunicações, eletrônica e inteligência. E a ITT Corp., que manteve o nome original, faz pesquisas e desenvolve e produz bens e serviços de alta complexidade para os mercados aeroespacial, de transporte e industrial. Assim, o spinoff das três atividades gerou muito valor, e atualmente as três empresas, separadas, têm múltiplos muito mais elevados do que a corporação original.

General Electric

A GE é uma empresa lendária. Entre os incentivadores iniciais estavam Thomas Edison e o bilionário John Pierpont Morgan, fundador do JP Morgan. Ela já foi a maior corporação do mundo. E gerações de executivos admiravam Jack Welch, CEO que multiplicou o valor de mercado da empresa. Em 2001, quando ele deixou o comando, o valor de mercado era de cerca de US$ 130 bilhões (US$ 219 bilhões ou R$ 1,12 trilhão em dinheiro de hoje). Atualmente, ela está valendo US$ 101 bilhões (R$ 517 bilhões), queda de 53,8%.

Um dos maiores problemas para a GE foi seu desempenho financeiro, que caiu drasticamente durante a crise do subprime, que começou em 2008. A divisão de serviços financeiros da empresa, GE Capital, tinha muita exposição a ativos de risco, o que causou grandes perdas e fez com que ela precisasse de socorro do governo.

Juntamente com seus problemas financeiros, a GE também enfrentou desafios de empresas de baixo desempenho e uma estrutura organizacional complicada. Jeffrey Immelt, o CEO que sucedeu Welch, vendeu ativos, mas as ações continuaram a cair. Desde 2018, quando Immelt foi sucedido por Larry Culp, a GE segue pagando suas dívidas e vendendo partes de seu negócio. Em novembro de 2021, ela informou que separaria suas últimas três divisões restantes – aviação, saúde e energia – em empresas distintas, todas de capital aberto.

Ruim para o consumidor

Grandes conglomerados também não parecem tão bons para o consumidor. O domínio do mercado por grandes empresas frequentemente diminui a concorrência e as opções do consumidor. Como resultado, pode haver menos incentivo para inovar, levando a custos mais altos e produtos de qualidade inferior.

Além disso, concentração de poder é um problema. As corporações acabam tendo muita influência sobre os reguladores, o que pode provocar falhas na supervisão e levar a monopólios ou a práticas comerciais antiéticas.

Assim, o caso é claro nos argumentos contra as grandes empresas. A ideia tradicional de “quanto maior, melhor” parece ótima, mas não é isenta de falhas. E elas tendem a provocar efeitos semelhantes à queda de um castelo de cartas.

Todas as empresas citadas nesta reportagem confirmam que ficar pequeno e focado é o melhor caminho para superar as crises, e que evitar a multiplicidade de atividades é um dos pilares da criação de valor.

História antiga

Spinoffs são uma história antiga. Já em 1911, a Suprema Corte dos Estados Unidos determinou a divisão da Standard Oil, a enorme petrolífera da família Rockefeller, em 34 empresas. E após uma discussão jurídica que demorou anos, foram estabelecidos regulamentos para fomentar a concorrência e impedir monopólios no setor petrolífero.

Em 1984, o governo dos Estados Unidos obrigou a AT&T, maior empresa do mundo na época, a quebrar seu monopólio nas telecomunicações. Isso gerou sete operadoras regionais e uma operadora de longa distância, que mais tarde mudou seu nome para AT&T Corp. Ainda hoje, essas “Baby Bells” são operadoras de telefonia importantes nos EUA.

Em 2015, a Hewlett-Packard (HP) se dividiu em duas empresas independentes. A HP Inc. vende computadores pessoais e impressoras, e a Hewlett Packard Enterprise, que se concentra em software e soluções para empresas.

O que os dados mostram?

No fim de 2022, uma pesquisa da Forbes americana compilou e analisou 1,1 mil empresas dos Estados Unidos e da Europa que realizaram spinoffs entre janeiro de 2000 a março de 2022. Foram analisados casos em que a controladora valia mais de US$ 500 milhões (R$ 2,5 bilhões) antes da separação. Cerca de 70% das spinoffs ocorreram nos EUA.

Em média, as spinoffs renderam 17% um ano após a data da cisão. No mesmo período, as empresas-mãe renderam 5%. Em dois anos, as cindidas renderam 25% e as ex-controladoras renderam 9%. As spinoffs listadas nos EUA e na Europa apresentam um desempenho mais forte do que suas antigas controladoras e superam os índices de mercado, como o MSCI World Index, o S&P 500 e o Euro Stoxx 600.

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