Existem chefs com estrelas Michelin e, em outro patamar, existe Alain Ducasse.
Além de ser o primeiro chef a possuir três restaurantes com três estrelas Michelin cada (a classificação mais alta da instituição), Ducasse é um dos dois únicos chefs do mundo a acumular um total de mais de 20 delas. Basicamente, ele é um ícone da gastronomia – e seu império em ascensão é uma prova disso.
“Não é um império”, ele me corrige, “e não vejo como um negócio. Eu penso nisso como uma sucessão de pequenos ateliês. De artesanato. Cada restaurante, ou loja, conta a sua própria história.”
Nos 50 anos desde seu primeiro estágio no restaurante Pavillon Landais, na comuna francesa de Soustons, Ducasse abriu mais restaurantes requintados do que boa parte das pessoas conhece em toda a sua vida.
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Hoje, sua empresa possui um total de 34 “ateliers”, cada um lançado pelo próprio Ducasse e depois deixado nas mãos do chef (ou chefs) que ele nomeia para dirigi-lo.
“Atualmente, meu foco é passar meu conhecimento para chefs na faixa dos 30 anos”, diz ele. “Presto muita atenção na evolução deles, treinando-os e os ajudando a se projetar.”
Neste assunto, o nome de Clare Smyth surge rapidamente na conversa. Depois de treinar com Ducasse no início de sua carreira, ela não apenas abriu seu próprio restaurante – o London’s Core by Clare Smyth -, mas também recebeu três estrelas Michelin. Com isso, ela se tornou a primeira chef britânica a ganhar (e manter) a honra máxima.
“Clare estava realmente disposta a aprender”, lembra. “Em 2005, ela já tinha uma personalidade forte e isso transparecia na sua cozinha. É disso que eu gosto: identificar talentos e dar a eles todas as oportunidades e conhecimentos para crescerem e encontrarem a sua própria identidade gastronômica”.
Seu apoio a cada um de seus chefs também é contínuo. Ao longo dos anos, Ducasse fez tudo o que pôde para desviar os holofotes de si mesmo e apontá-los para eles.
O recente jantar ‘Four Hands’ no Alain Ducasse At The Dorchester, em Londres, é um bom exemplo. Por mais que Ducasse tenha sido o anfitrião da noite ao lado de dois de seus discípulos com três estrelas – o chef executivo residente Jean-Philippe Blondet e Emmanuel Pilon, do Le Louis XV Alain Ducasse -, a refeição de 580 libras esterlinas (R$ 3.600) com harmonização de vinhos não era uma celebração de seu trabalho, mas do deles.
Cada etapa do jantar destacou um dos pratos assinatura dos dois chefs, entre eles um lombo de veado com pimenta Kampot, beterraba defumada e limequat (um tipo de cítrico híbrido entre o limão quincã e a lima) de Emmanuel, e o peixo pregado de Jean-Philippe, com alcachofra de Jerusalém, agrião, trufa negra e avelã.
Mas não para por aí. Quando nos encontramos em Londres, Ducasse contou que estava animado para jantar no Alex Dilling no Hotel Café Royal naquela noite, especificamente para “checar” mais um ex-aprendiz – o chef Dilling começou sua carreira no Ducasse’s Adour, em Nova York.
“São todos restaurantes com histórias muito autorais. Então, se todos são uma extensão de você, qual é a sua história?”, pergunto. Ele responde sem sequer pensar: “Liberdade. Eu não me impedi de tentar. Me permiti experimentar coisas novas, mesmo quando havia falhas. Agora temos bons restaurantes, bistrôs, brasseries, escolas de culinária, editora, um restaurante vegano…”. Ducasse sorri. De fato, a liberdade funcionou extraordinariamente bem para ele.
Ainda assim, as coisas não aconteceram de forma tão fácil quanto se poderia esperar para alguém do calibre dele.
“Sempre foi difícil encontrar financiamento, e ainda é. É uma batalha atrás da outra, uma por dia”, admite. “Nada é dado de graça, e o mercado hoje é mais competitivo do que quando comecei”.
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É por isso que, quando o chef pensou em produzir o próprio chocolate para seus restaurantes, dez anos atrás, ele decidiu abrir uma empresa à parte, o Le Chocolat Alain Ducasse.
Fabricando cada item, desde o grão de cacau até o produto final, o negócio foi se construindo em um ritmo lento, mas constante. Desde então, abriu três lojas em Londres e 26 lojas em toda a França – incluindo unidades da La Glace e Le Biscuit, para sorvetes e biscoitos de luxo, respectivamente.
Inusitadamente, todas as lojas foram inspiradas na marca Aesop, de cuidados com a pele. “Sou obcecado por design e, para mim, a Aesop tem um modelo a se inspirar”, diz Ducasse. “Cada loja é diferente e única em todo o mundo. São os mesmos produtos, mas em um ambiente diferente. Eu amo”.
Trabalhando em cada um desses empreendimentos como faria um chef com estrela Michelin, ele é obcecado por sabor, técnica e inovação em cada produto. Mesmo quando se trata de criar um sorvete com gosto de charuto, inspirado em um chá com sabor de tabaco que ele experimentou no Japão. “Você deve se perguntar: quantos clientes comprariam isso? Não muitos. Talvez 5%. Mas esses 5% vão voltar, porque só vão encontrar isso aqui.”
E, no entanto, mesmo com 21 estrelas e três negócios prósperos, Ducasse sente que ainda há muitas coisas a serem realizadas.
Nos bastidores, o chef de 66 anos está até dirigindo um laboratório de ideias, onde explora novas maneiras de desenvolver peixes curados e vegetais marinhos.
“Todos os dias tentamos ser melhores do que éramos ontem”, afirma. “Esse é o espírito de cada um dos nossos ateliês, e o meu espírito: uma vida e um legado de bom gosto e prazer.”
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*Lela London é colaboradora da Forbes USA. Ela é uma jornalista e roteirista premiada, especializada em alimentos e bebidas
(Traduzido por Giovanna Simonetti)
O post Alain Ducasse: como é a vida do chef com 21 estrelas Michelin apareceu primeiro em Forbes Brasil.