O Brasil pode atingir em 2023 um novo recorde de embarques de trigo para meses de janeiro, com o cereal mantendo e em alguns mercados até expandindo a fatia da clientela que ganhou no ano passado, enquanto a Rússia e a Ucrânia deixavam lacunas no fornecimento do produto em função da guerra, disseram membros do setor à Reuters.
O amplo volume colhido na última safra brasileira e a quebra na produção da vizinha Argentina também contribuem para que os exportadores do Brasil — com o cereal cultivado em sua maioria no Rio Grande do Sul — avancem no mercado internacional.
Com base nas exportações já realizadas e na programação de navios para embarque, a Anec (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais) projetou hoje (24) vendas externas de 803,8 mil toneladas de trigo em janeiro.
Se confirmado, o volume representará uma nova máxima histórica para o mês, ante o recorde anterior de 695,9 mil registrado em janeiro de 2022, conforme dados da entidade.
“O Brasil é um grande produtor e exportador de grãos. Na medida em que você tem essa confiabilidade imposta e criada pela soja, você começa a expandir isso para os outros produtos”, disse à Reuters o diretor geral da Anec, Sergio Mendes.
Segundo ele, os importadores de grãos enxergam no Brasil um fornecedor de credibilidade, e esta imagem favorece os exportadores para ganho de espaços nos mercados.
No caso do trigo, ele destacou que a Indonésia, Arábia Saudita e o Sudão detêm cerca de 50% das exportações brasileiras. O Vietnã também é um comprador de destaque.
“A manutenção dos embarques a estes países com quem a gente mantém boas relações comerciais leva a crer que a coisa está andando“, disse Mendes sobre a competitividade do Brasil contra concorrentes como Rússia e Ucrânia.
Recorde anual
A consultoria StoneX projeta embarques brasileiros de 3 milhões de toneladas de trigo para a temporada 2022/23 –considerada de agosto de 2022 a julho deste ano– estável em relação ao recorde atingido no ciclo anterior.
“Chegamos a estimar 3,2 milhões de toneladas e só baixamos devido à competição logística nos portos, já que neste ano não temos quebra na safra de soja”, afirmou o analista da StoneX Jonathan Staudt.
“Agora, este número de 3 milhões ainda é bastante otimista, tendo em vista que na temporada anterior tivemos uma forte quebra de soja no Sul do país que abriu espaços logísticos nos portos para exportar trigo, além da conjuntura geopolíca global, com a guerra entre Rússia e Ucrânia iniciando, e elevando os preços internacionais, tornando o trigo brasileiro bastante competitivo”, acrescentou o especialista.
De maneira geral, os preços brasileiros do trigo em dólares no porto são um dos mais competitivos do mundo, disse Staudt, até mesmo mais atrativos que os da Rússia.
No entanto, por questões de frete, em boa parte dos destinos o trigo russo acaba sendo o mais competitivo globalmente.
“Ainda assim, os países do norte da África, Oriente Médio e sudeste da Ásia seguem como principais destinos do cereal do Brasil… tivemos a manutenção do interesse dos importadores no trigo brasileiro, principalmente o gaúcho”, afirmou, citando espaço para crescimento do cereal nacional no mercado externo.
Isso porque o Rio Grande do Sul se firmou como maior produtor do cereal brasileiro, com qualidade na safra, o que ajudou a manter o interesse dos compradores.
“O Rio Grande do Sul tem área de inverno disponível para crescimento, caso os preços sigam interessantes ao produtor. É possível que nós tenhamos a manutenção das exportações de trigo ao longo dos próximos anos. O Estado deve se firmar como uma alternativa de fornecimento de trigo ao mundo.”
Na ponta dos concorrentes, a Ucrânia passa por um recuo nos embarques devido à guerra e, com a ajuda de um corredor de exportação pelo Mar Negro mediado pelas Nações Unidas e a Turquia, deve exportar 13 milhões de toneladas de trigo na safra 2022/23, conforme projeção do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos divulgada neste mês.
No ciclo anterior, o país embarcou 19 milhões de toneladas do cereal, segundo dados do órgão norte-americano.
No caso da Rússia, maior exportadora global de trigo, houve percalços em função do conflito, mas os embarques continuaram elevados e na expectativa da consultoria Sovecon devem atingir 44,1 milhões de toneladas em 2022/23, contra 34,1 milhões no ciclo anterior.
Na Argentina, concorrente na exportação e também importante fornecedora do cereal ao Brasil, uma quebra de safra causada pela seca levou a produção do país a 12,4 milhões de toneladas nesta safra, contra 22,4 milhões em 2021/22, segundo a Bolsa de Cereais de Buenos Aires.
Apesar do avanço nas exportações brasileiras, que se beneficiam dos preços do mercado externo, o país segue com necessidade de importação, visto que a produção nacional alcançou o recorde de 9,76 milhões de toneladas na última safra de inverno, mas o consumo interno é estimado em torno de 12 milhões de toneladas, conforme dados do governo federal.
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