No último dia 13 de setembro, o Parlamento europeu aprovou com 453 votos favoráveis, 57 contra e 123 abstenções, uma regulamentação com inspiração de caráter ambiental, destinada a suspender a compra de produtos oriundos de áreas desmatadas a partir de 2020. Embora as regras atinjam produtores de pelo menos 14 países (inclusive os europeus que desmatarem…), pode haver impacto negativo importante para as exportações brasileiras.
No mínimo os custos para os exportadores aumentarão substancialmente, até mesmo a ponto de inibir a competitividade de sua produção. Haverá auditoria feita pelos importadores para verificar se o produto exportável é originário de área desmatada, com georeferenciamento obrigatório, além de outras informações burocráticas.
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Inicialmente, as proibições focavam soja, café, carne bovina, cacau, madeira e óleo de palma, mas a lista foi ampliada, e nela entraram mais: milho, carnes de frango, de suíno, caprino e ovino, borracha, papel e carvão vegetal. Não entraram açúcar e suco de laranja. Aliás, a poderosa Copa/Cogeca, instituição defensora dos interesses dos agricultores europeus e suas cooperativas, até se manifestou criticando a ausência do açúcar na lista e a presença do milho. Este cereal já está muito caro em função da guerra na Ucrânia, e sua inclusão na lista deve encarecer ainda mais a proteína animal na Europa.
Parece claro, com estes pontos, que o novo regulamento tem caráter protecionista, embora calcado no bom-mocismo ambiental. E o Parlamento europeu cumpre bem o papel de defender seus produtores. Temos no Brasil uma bancada que defende os interesses legítimos dos produtores brasileiros, de modo que é compreensível esse papel. No entanto, a pergunta é: essa regra vai reduzir o desmatamento, ou melhor, terá impacto favorável ao meio ambiente global? Não parece provável. O impacto real é a proteção dos interesses dos produtores europeus, e isso é legítimo.
Este é o primeiro regramento baseado na temática ambiental, e poderá dar origem a uma onda na mesma direção. Para que entre em vigor, no entanto, precisa ser aprovado pelos 27 países da UE. E corre o risco de ser vetado pela OMC, se for entendido como uma barreira comercial disfarçada.
Se vencer essas etapas todas, a regra será incorporada ao texto do Acordo UE/Mercosul, já está muito desgastado, embora a guerra tenha trazido a preocupação com segurança alimentar e energética que podem ressuscitar o acordo adormecido.
Na prática, temos algumas tarefas a enfrentar: acabar com ilegalidades que suscitam estas medidas, como desmatamento ilegal, invasão de terras, grilagem, garimpo clandestino. Temos que implementar nosso Código Florestal, que nos dá uma ampla rede de proteção no tema. Resolver a questão fundiária na Amazônia e em outras regiões. Precisamos da vigorosa ação de nossa competente diplomacia para colocar a nossa real sustentabilidade na mesa das negociações.
Cada Parlamento defenda os seus representados. Mas que triunfe a competitividade, e não o disfarce.
Roberto Rodrigues é engenheiro agrônomo, agricultor, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV e embaixador especial da FAO para Cooperativas. Participa de diversos conselhos empresariais, institucionais e acadêmicos.
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Artigo publicado na edição 101, de setembro de 2022.
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