Na zona rural da pacata Santo Antônio de Posse (SP), município de quase 24 mil habitantes a 140 km da capital, uma multinacional do agronegócio avaliada em US$ 52 bilhões (R$ 276,5 bilhões) movimenta o local e investe no desenvolvimento de novos defensivos agrícolas para as lavouras. Nesta região, a alemã Basf possui a sua maior EEA (Estação Experimental Agrícola) da América Latina, onde analisa cerca de 115 mil amostras de biologia molecular ao ano.
Foi dessas análises que a companhia abriu sua trincheira de guerra para destruir uma praga da lavoura, a cigarrinha do milho, inseto transmissor de vários patógenos que levam prejuízo às lavouras. A Basf já finalizou as pesquisas e espera pela regulamentação de uma tecnologia que deve controlar a cigarrinha do milho com uma eficácia maior do que o atualmente disponível.
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“A cigarrinha começou a ficar importante há cerca de três ou quatro anos. Antes ela não era tão relevante assim, mas é uma praga bastante séria”, afirma Marcelo Ismael, engenheiro agrônomo e diretor de P&D (pesquisa e desenvolvimento) da Basf para a América Latina. O boom da praga presente no Brasil desde os anos 1980 ocorreu no Paraná em meados de 2017 e chegou a prejudicar até 70% da produção de milho em algumas propriedades.
A dor de cabeça se tornou tão grande que no ano passado a Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento do estado criou um grupo de trabalho para tentar controlar a incidência da praga. Foi nesse momento que a multinacional encontrou a oportunidade de sair na frente. A empresa, que já trabalhava na pesquisa da molécula para outro uso, decidiu testar sua eficácia contra o inseto. “Não existe nenhum similar a esse ingrediente ativo no mercado. A informação é de que ele entrou como prioridade na lista de aprovação da Anvisa”, diz Ismael, se referindo à Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Mas a Basf não quer acabar apenas com essa praga. Ela é apenas uma das linhas de pesquisa em inovação que a multinacional mantém na EEA, um complexo criado em 1980 e que nos anos 2019 e 2020 recebeu investimentos da ordem de € 4,6 milhões (R$ 24,5 milhões) em novos equipamentos e infraestrutura. Dois novos laboratórios passaram a funcionar este ano, agilizando o desenvolvimento de tecnologias. Está na agenda da companhia o lançamento de oito novas moléculas até 2030, com estimativa de que componham as fórmulas de cerca de 160 novos produtos para o mercado latino-americano.
“Para entender porque temos essa estação, e os vários campos avançados espalhadas no Brasil, precisamos pensar sobre as nossas condições edafoclimáticas, que afetam o ambiente e o solo, pois elas são diferentes e nos fazem ter uma maior incidência de pragas, doenças e plantas daninhas”, explica Ismael. “Testamos aqui as moléculas porque a intensidade da praga traz uma série de desafios diferentes”. A Basf tem 30 estações de pesquisa e campos avançados na América Latina, dos quais 15 estão no Brasil.
O desenvolvimento de uma nova molécula para defensivos agrícolas é um processo que pode demorar cerca de uma década. Em geral, a criação começa na Alemanha e Estados Unidos, onde os químicos realizam testes em computadores. É no terceiro ano das pesquisas que centros como o EEA de Santo Antônio de Posse entram em cena. “A partir do que é estudado lá, recebemos uma seleção daquelas inovações que são mais viáveis e ela vai para os laboratórios”, diz Ismael. “A gente parte de um número muito grande de moléculas, falamos de 100.000 candidatas até chegar na fase final de um produto.”
Os testes são divididos, de acordo com seus avanços, entre áreas de laboratório, estufas e 57 hectares de campo. Os cerca de 150 técnicos analisam sementes, folhas e estudam insetos para saber se o ativo está surtindo efeito e quais são as possíveis melhorias.
Mas o caminho a partir daí também é longo. Depois de enviar o pedido de registro para os órgãos responsáveis, no caso a Anvisa mais Mapa (Ministério da Agricultura e Pecuária) e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente). “Não é uma crítica ao sistema, a aprovação de cada órgão é importante para a segurança no Brasil. Mas o aumento na agilidade da regulação poderia reduzir a entrega do produto a, provavelmente, seis anos”, afirma o químico João Nery, gerente dos sites de P&D (sites se referem aos espaços físicos de pesquisa).
Por conta do longo tempo, para se manter à frente nas pesquisas, segundo a empresa, ela leva em consideração as tendências do agronegócio para 2030, como a biotecnologia 4.0, gerenciamento holístico das fazendas, transformação digital e crescimento da América Latina como um dos principais exportadores de sustentabilidade. “As soluções tendem a ser cada vez mais específicas”, diz Ismael. “O que me deixa muito feliz, porque significa que vamos precisar de mais estações e mais investimentos.”
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