Não faltam organizações que se comprometem a acabar com o desperdício de alimentos. Muitas têm iniciativas para reduzir esse desperdício em 30% a 50% antes de 2030, o ano-alvo estabelecido pelo Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 12.3 das Nações Unidas. Outras tantas ainda não provaram que podem realmente cumprir essas ambições.
“Estamos ficando muito confortáveis em estabelecer metas e objetivos que estão a décadas de distância. Metas que podemos realizar dentro de horizontes de cinco anos, talvez até mais cedo”, diz Pete Pearson, do World Wildlife Fund. “E tudo que precisamos é liderança e urgência.”
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Por isso é empolgante o mais recente anúncio da Ikea – empresa mais conhecida por móveis modernos e almôndegas suecas que reduziu pela metade o desperdício de alimentos, economizando mais de 20 milhões de refeições em quatro anos. Esta é a primeira empresa de sua escala a cumprir suas metas de redução de desperdício de alimentos – e eles fizeram isso ao longo de apenas alguns anos.
“Sua conquista é um farol de esperança”, diz Dana Gunders, diretora executiva da ReFED (ONG que se dedica à causa do desperdício de alimentos). Como especialista em desperdício de alimentos nos EUA, ela diz que admira e aprecia a liderança da Ikea.
Reduzir pela metade o desperdício de alimentos é uma meta ambiciosa para uma empresa que opera em mais de 40 países e serve cerca de 560 milhões de refeições por ano, sem mencionar a complexidade de implementar uma solução em uma ampla variedade de geografias, idiomas, opções de menu e normas culturais. [Empresa anunciou o início de suas operações de móveis na América do Sul para este ano. Brasil está fora da primeira rodada, embora haja estudos nesse sentido]
A IKEA não fez isso sozinha. Sua história mostra que, além de metas ambiciosas, também é preciso colaboração entre os setores. O Ingka Group, que possui a maioria das lojas Ikea nos EUA, fez parceria com a empresa de inteligência artificial Winnow para combinar a conscientização dos funcionários sobre o desperdício de alimentos com a tecnologia. A ferramenta Winnow Vision AI mede e registra o desperdício de alimentos nas cozinhas da Ikea para fornecer aos trabalhadores uma compreensão mais profunda do que está sendo descartado e por qual motivo, para que eles saibam onde podem ser feitas melhorias.
O fundador da Winnow, Marc Zornes, diz que o “molho secreto” para tornar essas metas ambiciosas uma realidade é, além do investimento de capital, “focar a organização e colocar os incentivos em prática”. As empresas devem ter sua própria equipe interna liderando os esforços de desperdício de alimentos.
Segundo Karen Pflug, diretora de sustentabilidade do Ingka Group, “o setor privado tem grande responsabilidade de educar os consumidores finais e evitar o desperdício de alimentos em suas próprias operações, o que tem impacto direto em todo o sistema alimentar”.
E já existe um caso de negócios atraente para as empresas investirem, visando o futuro do alimento. Como Pearson aponta, acabar com a perda e o desperdício de alimentos é “um dos principais quebra-cabeças que existem neste espaço climático, no momento”.
Ao economizar mais de 20 milhões de refeições e evitar quase 40.000 toneladas de equivalentes de dióxido de carbono, a iniciativa da Ikea economizou US$ 37 milhões (R$ 193 milhões na cotação atual) para a empresa. A ISS Guckenheimer, empresa de catering e gestão de restaurantes corporativos, também trabalhou com a Winnow para economizar mais de 1 milhão de refeições e US$ 2,6 milhões (R$ 13,5 milhões) anualmente até agora.
Muitas outras parcerias já estão em andamento. O Compromisso de Desperdício de Alimentos da Costa do Pacífico (acordo voluntário de empresas de alimentos com metas de redução de 50% de desperdício até 2030) está reunindo essas empresas e jurisdições locais para implementar ações mensuráveis na costa oeste dos EUA. Ahold Delhaize, Kroger e Walmart aderiram ao 10x20x30, uma iniciativa que reúne 10 dos maiores varejistas de alimentos do mundo para se envolver com 20 de seus fornecedores visando reduzir pela metade a perda e o desperdício de alimentos, também, até 2030.
A história da Ikea “envia um sinal importante para outras empresas de que não há desculpa para não acelerar seu próprio compromisso e ação para reduzir o desperdício de alimentos”, diz Brian Lipinski, do Programa Alimentar do World Resources Institute. Ele chama isso de “primeiro no mundo”, mas se espera que seja apenas o começo de uma longa lista de vitórias neste espaço.
Quando os recursos são dedicados aos lugares certos, é possível alcançar e superar ambições ousadas de melhores sistemas alimentares e agrícolas. São necessários mais líderes estabelecendo, cumprindo e superando as metas de redução do desperdício de alimentos – e não há tempo a perder.
* Danielle Nierenberg é colaboradora da Forbes EUA e cofundadora da Food Tank, organização criada em 2013 com o objetivo de construir uma comunidade para o consumo consciente.
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