O longo período de isolamento em casa na pandemia, a consolidação do home office como alternativa viável ao trabalho fixo no escritório e novas gerações mais interessadas em experimentar do que colecionar bens materiais são alguns dos fatores que levam os especialistas a apostar na manutenção do turismo de lazer em alta.
Destino majoritariamente de lazer, o Nordeste liderou as vendas no Brasil no primeiro trimestre de 2022, tanto na Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav) quanto na Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa).
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Com 86% das vendas do período sendo de viagens no Brasil, as associadas da Braztoa apontaram Salvador, Fortaleza, Maceió, Natal, Porto de Galinhas e Porto Seguro como os destinos mais comprados. Na lista da Abav, aparecem também São Paulo, Rio de Janeiro e Gramado. “Acho que a gente realmente não contava que esse ‘revenge travel’ contra a pandemia fosse superar todos os índices e trazer a recuperação para 2022, e não para 2023 e 2024”, afirma Magda Nassar, presidente da Abav. “O lazer está muito aquecido. Viajar é o desejo número 1 dos brasileiros.”
No primeiro semestre de 2022, os hotéis do Grupo Leceres tiveram uma ocupação média de 75% – em 2019, era de 58%. A receita da empresa, que é focada no turismo de lazer, está 60% melhor do que antes da pandemia. “Tudo caminha para fecharmos o ano com R$ 396 milhões”, diz Fabio Mader, CEO do grupo, criado a partir da venda da antiga rede GJP para um fundo de investimentos de private equity gerido pela RCapital. “A receita decorrente do consumo cresceu 45% em relação à de antes da pandemia, com os hóspedes gastando mais em spa, restaurantes e experiências como piquenique e cinema no quarto.”
O tempo médio de permanência subiu de dois para 3,8 dias. “Agora a pessoa vai na quinta e faz home office na sexta, mas já está com a família. É comum ver gente na piscina com laptop”, conta o CEO. “Mesmo com todas as dificuldades econômicas que estamos tendo, as pessoas estão reservando parte do orçamento para viajar.”
Para aproveitar esse boom, até dezembro de 2023 o grupo projeta sair de nove para 40 hotéis, incluindo um cinco estrelas novo de frente para o mar de Trancoso, na Bahia. Negociações em andamento incluem ainda um parque aquático e restaurantes.
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A Schultz, operadora que também trabalha exclusivamente com lazer, registrou um aumento de 10% nas vendas do primeiro semestre de 2022 em relação ao mesmo período de 2019. A compra de roteiros nacionais superou a época pré-Covid. “O turismo no Brasil em 2019 representava 20% das vendas. No primeiro semestre de 2022, foi 60% A pandemia nos ajudou no fortalecimento do nacional”, afirma Ana Santana, diretora geral da Schultz, que atua no B2B, vendendo seus pacotes apenas para agências – aproximadamente 7 mil em todo o Brasil.
As viagens para o exterior também cresceram na Schultz no primeiro semestre de 2022, em decorrência da reabertura de grande parte dos países. “Alcançamos 60% das vendas internacionais do mesmo período de 2019”, diz a executiva. Janeiro e fevereiro não foram tão bons para o turismo nacional e internacional, segundo ela, porque o aumento de casos de Covid no pós-Réveillon inibiram as vendas.
A Azul Viagens, operadora ligada à companhia aérea nacional, por sua vez, já ultrapassou os resultados da pré-pandemia. “No segundo trimestre de 2022, estamos 69% acima do mesmo período de 2019 em faturamento e com um número de passageiros 30% maior”, afirma Ricardo Bezerra, gerente comercial da Azul Viagens. Para Porto de Galinhas e Recife, por exemplo, a venda e o
número de passageiros triplicaram. No internacional, Lisboa e Orlando também se destacaram, com os respectivos crescimentos de 191% e 141% em faturamento e de 134% e 191% em passageiros.
As duas cidades, ao lado de Cancún, Paris, Dubai e Egito, foram a preferência dos viajantes para o exterior entre as associadas da Braztoa. No levantamento da Abav são acrescidos Itália, Espanha, Grécia, Argentina, Chile e Caribe. Redes como a AMR Collection, com cerca de 100 hotéis all-inclusive no mundo e forte presença no México e no Caribe, forammuito procuradas por brasileiros ao longo da pandemia.
“Em 2021 tivemos um ano recorde de vendas no Brasil, com crescimento de 80% no faturamento”, diz Ney Neves, gerente sênior de marketing & vendas no Brasil da AMR Collection, rede na qual 75% da receita vem do lazer. “O México não fechou as fronteiras, e também havia os turistas que queriam viajar para os Estados Unidos. Vimos aí um potencial para os nossos resorts, com a campanha de quarentena no México para depois continuar a viagem.” Os Estados Unidos só abriram diretamente para viajantes do Brasil, sem exigência de quarentena na chegada, em novembro do ano passado.
“Acho que vamos terminar 2022 passando 2019. Mais da metade dos operadores já está faturando mais do que no ano anterior à pandemia, batendo recordes mês a mês”, diz Roberto Nedelciu, presidente da Braztoa. Segundo ele, 70% são vendas novas e o restante vem de cartas de crédito de viagens não realizadas após a crise da Covid.
No Brasil, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) estima que o setor atinja o volume de receitas da pré-pandemia até o terceiro trimestre de 2022. A CNC prevê também que este ano deve encerrar com um saldo positivo de 258,1 mil novas vagas – nos seis primeiros meses da pandemia 526,5 mil postos de trabalho formais foram cortados no setor. “Está faltando mão de obra. A gente não consegue contratar pessoas qualificadas porque muitas trocaram de área”, afirma Nedelciu, contando que irá treinar funcionários de outros setores para sua empresa, a Raidho Viagens.
Mesmo com passagens aéreas mais caras, as pessoas continuam querendo embarcar. Em junho, São Paulo, o maior mercado emissor de viajantes para destinos brasileiros e estrangeiros, registrou uma movimentação de 2,6 milhões de passageiros no Aeroporto Internacional de Guarulhos, segundo a concessionária GRU Airport. Desses, 1,7 milhão estava em voos nacionais. O tráfego para o exterior respondeu por 34,3% do total – 30 companhias nacionais e internacionais partem dali para 38 destinos lá fora.
“Começamos a ter uma demanda maior do que a oferta, já que as companhias aéreas ainda não voltaram a 100%. As nacionais e internacionais não têm o mesmo número de voos e estão com os valores bastante elevados. Talvez até o fim do ano ocorra uma normalização”, diz Magda, da Abav.
Também de olho na retomada de 2022 está outro segmento, o último a voltar integralmente no turismo. “Os bilhetes aéreos estão muito altos, a hotelaria também, mas os cruzeiros têm um bom custo-benefício. Os preços muito competitivos são sempre um grande diferencial, considerando o valor na viagem, com transporte, hospedagem, entretenimento e a experiência bacana que é viajar de navio”, diz Marco Ferraz, presidente da Cruise Lines International Association no Brasil. “Agora 88% da frota mundial já está em operação. Apenas a China não está. São mais de 100 destinos com navios de cruzeiros.”
A temporada 2022/2023 no Brasil terá oito navios dedicados de 29 de outubro deste ano a 20 de abril de 2023: Costa Firenze, Costa Fortuna, Costa Favolosa, MSC Armonia, MSC Musica, MSC Fantasia, MSC Seashore e MSC Seaview. Os 674 mil leitos estarão disponíveis em 160 roteiros por 17 destinos.
Artigo publicado na edição 99 da revista Forbes, de julho de 2022.
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