Começa hoje (20) a reunião de dois dias do Federal Reserve (Fed), o banco central americano. Jerome Powell, presidente do Fed, e os demais membros do Federal Open Market Committee (Fomc), a versão americana do Copom, terão de tomar uma decisão difícil na gestão tanto da inflação quanto das expectativas do mercado.
Os juros americanos estão atualmente na faixa entre 2,25% e 2,50% ao ano. Até duas semanas atrás, a maior parte das expectativas era de uma alta de 0,75 ponto percentual. E uma minoria (mas não tão minoritária assim) previa um aumento mais modesto, de 0,50 por cento.
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Porém, no dia 13 de setembro a inflação de agosto medida pelo Consumer Price Index (CPI) surpreendeu negativamente o mercado. Além de o índice amplo ter subido 0,1%, acima dos prognósticos de 0,06%, o “núcleo” da inflação, o chamado “core index”, que exclui os preços mais voláteis dos alimentos e da energia, foi de 0,6 por cento, acima dos 0,3 por cento de julho.
“Apesar de sinais incipientes de desaceleração da atividade, o mercado de trabalho americano segue bastante apertado. Isso sugere a necessidade de o Fed optar por altas de juros mais fortes e manutenção da taxa em patamar restritivo por mais tempo”, diz Nicole Kretzmann, a economista-chefe da gestora de recursos Upon Global Capital.
Atitude firme contra a inflação
Esses números lançaram uma sombra de desconfiança sobre a normalização do processo inflacionário americano. Havia uma expectativa positiva entre os investidores que a baixa dos preços do petróleo e da gasolina seria suficiente para domar a inflação.
No entanto, outros itens, como habitação, por exemplo, seguem com preços em alta. “Acreditamos que o Fed terá que ser mais contundente no ciclo de alta de juros. Como pode ser observado no último dado de inflação, muitos componentes mais inerciais, como o núcleo de serviços, continuam sem arrefecer”, diz Kretzmann.
Com isso, as expectativas mudaram. A maioria dos investidores segue esperando uma alta de 0,75 ponto percentual. No entanto, a minoria que previa um aumento de 0,50 ponto se esvaiu. Agora, a minoria espera uma alta mais radical, de um ponto percentual.
Mesmo que essa perspectiva mais pessimista não se confirme, esse cenário pode fazer com que investimentos que viriam para o Brasil acabem permanecendo nos Estados Unidos. Isso não afeta apenas a bolsa, mas também investimentos em renda fixa, como títulos públicos brasileiros, diz André Crepaldi, diretor do escritório de assessores Wit, ligado à XP Investimentos. “Com isso, a atratividade dos títulos públicos diminui e faz com que venha menos dinheiro para investimentos no país”, diz.
Na hipótese de os juros subirem mesmo um ponto percentual, essa seria a primeira elevação desse tamanho em quatro décadas. Apenas no início dos anos 1980 o Fed realizou algo tão drástico. Foi durante a gestão de Paul Volcker, que conseguiu debelar uma inflação elevada mandando os juros para cerca de 20% ao ano.
Em que pese sucesso em debelar a inflação, as consequências sobre a atividade e sobre os ativos internacionais foram drásticas. Além de provocar uma pesada retração da atividade nos Estados Unidos, a política monetária austera causou a crise da dívida dos países emergentes dos anos 1980, com moratórias em série na América Latina e na África.
O impacto de uma forte elevação dos juros sobre a economia é mais difícil de prever. Uma nova crise da dívida ou uma crise sistêmica parecem fortemente fora do radar.
Além de o endividamento externo das nações em desenvolvimento não estar tão concentrado nos bancos, há um mercado de capitais muito mais desenvolvido, que oferece liquidez e portas de saída. O problema é o impacto sobre a própria economia americana devido à sua centralidade. Há restrições estruturais no mercado de mão de obra que dificultam a redução dos salários.
Além disso, eventos como a guerra na Ucrânia elevaram ainda mais as barreiras que haviam sido derrubadas com a globalização e reerguidas com as disrupções das cadeias logísticas e com as inseguranças na cadeia de fornecimento na pandemia, outro fator estrutural a elevar os custos gerais da economia global.
Daí a incerteza que ronda o mercado quanto à decisão do Fed. Se for seguir o manual, o BC americano terá de seguir elevando os juros. A questão é se o manual está suficientemente atualizado para os desafios atuais.
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O post Banco Central americano decide o destino do mercado apareceu primeiro em Forbes Brasil.