A fase de baixa no ciclo pecuário não precisa significar uma tragédia dentro da sua operação, mas sim uma grande vantagem competitiva, já que ela faz parte da composição do desembolso (um dos indicadores econômicos mais importantes na hora de buscar o lucro operacional). O ciclo pecuário é uma onda de estímulos e desestímulos à produção por parte dos preços. Então, quando eles estão em alta, o pecuarista investe na atividade, segura fêmeas para ter bezerros e produzir um estoque maior de arrobas.
Esse estímulo é generalizado, então todo mundo faz mais ou menos a mesma coisa, aumentando a produção e fazendo os preços caírem. Aí começa a desestimular. O pecuarista que estava animado começa a pensar “vou produzir um pouco menos, mandar essa fêmeas que estava utilizando na reprodução para o abate e isso está me dando prejuízos” e então liquida as fêmeas que serviriam de matriz para a produção de bezerros. Isso leva a uma redução da produção de bezerros, resultando em menor oferta e aumento nos preços. Basicamente este é o ciclo pecuário, é uma onda retroativa de estímulos e desestímulos de preços à produção pecuária.
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Nós vivemos um biênio de preços bem fortes em 2020 e 2021, levando os valores para cima e remunerando a atividade acima dos preços de produção, mas agora a conta chegou. Isso fez com que os pecuaristas retivessem fêmeas em seu rebanho, aumentando a produção e hoje, o que a gente sente, é exatamente isso: o boi gordo tem dificuldade de registrar preços mais altos, principalmente em termos reais, quando fazemos comparação do preço nominal com o custo de produção. E a reposição também está mais baratos, o preço do boi magro caiu. Nós tivemos leilões de gado tendo até lotes sobrando, uma realidade muito diferente do que vimos em 2019, 2020 e 2021, principalmente. Então, é a virada do ciclo para a fase baixa.
Falando um pouco de gestão, de todos os indicadores econômicos que a gente pode levantar na propriedade rural, principalmente pecuária, um dos mais importantes é o desembolso. Ele é medido em reais por cabeça, o quanto a gente gasta por animal. Muitas pessoas perguntam como reduzir esse desembolso. Mas não conseguimos economizar. Vamos pensar que economizamos em sanidade e tem um surto de doença ou algum problema sanitário na propriedade rural, o prejuízo lá na frente será muito maior. Então, eu não consigo economizar em sanidade, nutrição e na reforma de pastagem, até mesmo para a propriedade conseguir sequestrar carbono da atmosfera. Esses pontos não são maléaveis, mas a gente consegue aproveitar a fase de baixa do ciclo da pecuário para se utilizar de um indicador muito importante que vai funcionar no desembolso.
O desembolso, basicamente, é o custo da unidade produzida. Portanto, quanto menor o custo da unidade produzida, maior é o lucro. Então, o grande desafio está em reduzir o desembolso. O que age e atua diretamente sobre ele? Diluição de custos fixos com o aumento de produtividade em um mesmo local e a fase de baixa do ciclo. Ao mesmo tempo que os preços caem, desestimulando o produtor, o preço da reposição também cai, tornando ela mais barata para quem precisa fazer reposição. Quem é produtor precisa repor matriz e quem é invernista precisa repor boi magro, bezerro e a recria. Então, a relação de troca fica mais competitiva nesses momentos, favorecendo o desembolso. É claro que o valor de venda vem junto, mas um pouquinho de estratégia de timing e de venda podem ajudar muito.
Por exemplo, hoje eu poderia estar buscando bezerras para daqui 18 meses estarem aptas a virarem matrizes para produzir bezerros e, então, vender esse estoque maior de arrobas na fase de alta do ciclo pecuário. Esse momento pode ser enxergado como uma grande oportunidade para a aquisição de reposição. O ciclo pecuário deve ser usado estrategicamente: quando todo mundo desanima, a gente pensa em comprar. Para formar esse estoque de arrobas, o pecuarista precisa começar a trabalhar agora para adquirir a reposição mais barata.
Lygia Pimentel é médica veterinária, economista e consultora para o mercado de commodities. Atualmente é CEO da AgriFatto. Desde 2007 atua no setor do agronegócio ocupando cargos como analista de mercado na Scot Consultoria, gerente de operação de commodities na XP Investimentos e chefe de análise de mercado de gado de corte na INTL FCStone.
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