Imaginar um estrogonofe ou um cheesecake sem creme de leite na receita é praticamente impossível. O ingrediente indispensável faz parte da memória alimentar das pessoas. Não por acaso, está no hábito de compra de 92% da população brasileira, o que significa 195 milhões de consumidores, segundo um estudo do Centro de Inteligência do Leite que pertence à Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária). Entre os lácteos, só perde para queijos e manteiga. Mas a pesquisa se refere apenas ao leite de origem animal e não aborda novos produtos trazidos pelo movimento plant-based.
O mercado desse tipo de alimento enfrenta dois desafios nos dias atuais: satisfazer a memória alimentar dos consumidores e oferecer diversidade. Para aumentar sua fatia nas prateleiras dos supermercados, mercearias, conveniências e no food service, é nesse sentido que caminha a agroindústria do plant-based.
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“O brasileiro tem em sua cabeça o sabor em primeiro lugar”, diz Rodrigo Carvalho, que junto com o irmão Felipe fundaram A Tal da Castanha, em 2015, com sede na capital paulista. A marca possui cerca de 22 linhas de produtos de prateleira, entre bebidas, pastas e snacks, sendo o principal deles o “leite” vegetal, fruto do esmagamento de castanhas, principalmente as do caju. Castanha do Pará, coco e chocolate também entram na formulação dos produtos.
No mês passado, a marca colocou no mercado brasileiro o primeiro creme de leite à base de castanha de caju. Foram dois anos de pesquisa para chegar a um produto similar ao creme de leite original.
“Dentro de nossa P&D (pesquisa e desenvolvimento), a gente já chegou a atrasar em até um ano o lançamento de produtos, até conseguir, sem nada artificial, um sabor igual ou muito próximo ao original”, conta Rodrigo. “O sabor é um dos nossos drives, e se a gente não chegar lá abortamos o lançamento até termos um resultado bom.” Os irmãos Carvalho têm investido cerca de R$ 2 milhões por ano nessa busca por sabores que atendam a tal da memória alimentar.
No ano passado, a receita da empresa foi de R$ 90 milhões, com uma produção de oito milhões de litros de bebidas plant-based. Para 2022, a aposta é de um aumento de R$ 45 milhões no faturamento e de 4 milhões de litros de produtos. Hoje com o processamento industrial terceirizado, os irmãos não dispensam a ideia de ter uma fábrica própria no futuro.
A aposta não é um tiro aleatório. O mercado plant-based atrai uma parcela crescente da população, e a agroindústria e os produtores correm no mesmo sentido não apenas no Brasil. Até o final desta década, a venda global de alimentos à base de plantas deve movimentar US$ 162 bilhões, valor equivalente a 7,7% do mercado de proteínas, segundo relatório da Bloomberg Intelligence. “A gente percebe que o consumidor já tem consciência do que é o leite vegetal, diferente de quando começamos. Este mercado tem realmente um grande potencial e cresce cada vez mais”, pontua Rodrigo.
Desafios na conquista do mercado
Filhos de Antônio José Carvalho, o criador da Amêndoas do Brasil, empresa cearense que produz e exporta castanha-de-caju para cerca de 20 países (especialmente aos Estados Unidos), os irmãos tiveram a ideia de fundar o negócio de bebidas à base de plantas em 2013. O objetivo era mudar a estrutura da empresa que, naquele momento, não acessava o mercado consumidor. O negócio era business-to-business.
“Na época, o mercado plant-based no Brasil era muito embrionário e tivemos que viajar para fora para conhecer o que os players do exterior estavam produzindo”, conta Felipe. “Este mercado era dominado pelo uso de soja e amêndoas como base. Além disso, observamos que a principal marca dos EUA que oferecia uma bebida plant-based que tinha em torno de 18 ingredientes como aditivos e conservantes.”
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Foram dessas observações que nasceu o plant-based de caju, uma fruta típica brasileira, o que reduziu o custo de produção na agroindústria, ao mesmo tempo que seria possível uma bebida livre de conservantes e aditivos.
Outro desafio enfrentado no início do projeto e que até hoje, de acordo com os irmãos Carvalho, é a falta de incentivo fiscal e de regulamentação dos denominados alimentos “plant-based”. Por conta desse cenário, a agroindústria plant-based é menos competitiva na prateleira.
Enquanto um litro de leite de vaca custa em torno de R$ 4,50, uma caixa da bebida de castanha-de-caju da marca pode ser encontrada em grandes supermercados por até R$ 24,00, se encaixando como um produto para consumidores de alto poder aquisitivo. Por conta desse cenário, o setor tem argumentos variados para atrair um consumidor que vai além do sabor na sua decisão de compra.
“A gente acredita que pode haver uma valorização do setor no país, não só pela parte do impacto ambiental, mas também porque muitos desses produtos podem ser item de primeira necessidade”, afirma Felipe. “Pessoas com alergias ou intolerância não conseguem tomar outro tipo de leite que não o vegetal. Então, poderia ter incentivos, assim como o leite animal, com uma carga tributária menor para ampliarmos o acesso a todos.”
As castanhas utilizadas pela marca, todas colhidas no país, são de uma área de 7 mil hectares de pequenos produtores familiares com certificação bancada pela empresa. Eles estão na Bahia, Ceará, Maranhão e Piauí. Além disso, A Tal da Castanha também compensa a totalidade dos resíduos gerados por suas embalagens por meio de uma parceria com o Eu Reciclo, empresa paulistana de logística reversa de embalagens pós consumo.
O post Plant-based: por que esse agro precisa de variedade para atrair o consumidor apareceu primeiro em Forbes Brasil.