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A vitória de Donald Trump teve várias surpresas. A principal delas foi a votação entre eleitores que tradicionalmente apoiam os candidatos democratas, como jovens negros e latinos. As primeiras análises do resultado mostram que, para além de erros estratégicos do partido democrata, a vitória de Trump foi uma vitória de uma versão dos Estados Unidos muito ligada às suas origens.
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Apesar de ter se formado a partir de levas de imigrantes, especialmente do Norte da Europa, os Estados Unidos eram, no início do século passado, um país profundamente isolacionista. Havia iniciativas empresariais para ir além das fronteiras e ocorreram várias ações militares para defender os interesses nacionais. Porém, um resumo da geopolítica americana era: proteger os mercados, privilegiar a produção nacional e conter a imigração (apesar da necessidade de mão de obra).
Isso mudou por motivos de força maior: as duas Guerras Mundiais, que levaram Washington a enviar tropas à Europa (na primeira) e à Europa e à Ásia (na segunda) e transformaram o país no fiel da balança geopolítica global. Desde os anos 1940, Washington tem sido o ator mais influente nesse cenário. Não por acaso, a sede da Organização das Nações Unidas fica em Nova York; a primeira proposta durante sua criação era que ficasse em Viena.
Trump não quer nada disso. Há sinais claros. Seu movimento Make America Great Again (MAGA) busca desmontar o internacionalismo que permeou as relações entre os Estados Unidos e o resto do mundo.
A economia de Trump
Ele é um defensor ferrenho de tarifas comerciais. Durante a campanha, ele insistiu que o déficit comercial americano com o resto do mundo (leia-se China) mostra que seu país está sendo prejudicado. Sai o livre comércio, entra uma doutrina quase mercantilista de que bons são superávits comerciais.
Os Estados Unidos provavelmente serão mais gastadores, enquanto ele e seu partido aprovam cortes de impostos, o que aumentará ainda mais o déficit orçamentário. Qual o impacto no mercado? Quando a vitória de Trump se tornou certa, as ações dispararam, o dólar se fortaleceu e os rendimentos dos títulos do Tesouro subiram. Isso indica claramente algumas expectativas.
Corte de impostos
Uma delas é corte de impostos e desregulamentação, o que deverá impulsionar os resultados das empresas. Sua prioridade será estender os cortes no imposto de renda das pessoas físicas definidos por ele em 2017 e que deveriam deixar de valer no fim de 2025. Trump também prometeu reduzir a alíquota de impostos sobre empresas de 21% para 15%. Durante a campanha, ele mencionou uma série de outros possíveis cortes, incluindo o fim dos impostos sobre gorjetas e horas extras.
Essas medidas podem causar um crescimento de curto prazo, mas tendem a acelerar o desequilíbrio das contas públicas, o que pode elevar a inflação e levar a uma alta de juros. O Congressional Budget office (CBO), uma agência não partidária ligada ao Parlamento, estima que o déficit orçamentário americano será de 6% do Produto Interno Bruto (PIB) na próxima década se nada mudar. Os diversos cortes de impostos de Trump poderiam aumentar esse déficit para até 12% do PIB até 2035.
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Isso provoca inflação e eleva juros. O aumento nos rendimentos do Tesouro em resposta à vitória de Trump já é um aviso sobre a fragilidade fiscal dos EUA. A inflação provavelmente fará o Federal Reserve (FED), o banco central americano, tornar os juros mais altos. Isso deve irritar Trump. Como candidato, ele disse que deveria “ter voz” nas taxas de juros. O FED é independente e deve permanecer assim. Mas como os brasileiros sabem, críticas presidenciais à atuação do banco central não são positivas para os mercados.
Alta de tarifas
A alta de tarifas também deve ser inflacionária. Em seu primeiro mandato, Trump elevou as tarifas sobre o aço e sobre diversos produtos chineses. Na campanha, ele falou de impor taxas de 10% a 20% sobre todas as importações americanas. Também afirmou que vai tributar todas as importações chinesas em 60% e de criar um imposto de até 500% sobre os carros produzidos no México.
Aqui pode haver uma oportunidade para o Brasil. As tarifas certamente provocarão retaliações. Autoridades europeias já elaboraram listas de tarifas que podem ser lançadas sobre produtos americanos. A China provavelmente mirará produtos agrícolas, como soja e milho, aumentando o espaço para as exportações brasileiras.
Escassez de mão de obra
Trump prometeu “consertar” as fronteiras dos EUA. Se ele cumprir sua promessa de deportar os imigrantes ilegais, isso terá um efeito muito negativo sobre a economia. A estimativa é de que existem atualmente 8 milhões de imigrantes ilegais. Se todos saíssem, o “think tank” Peterson Institute for International Economics avalia que isso deixaria o PIB 7% abaixo do esperado até 2028.
Mas esse é um cenário extremo e pouco provável, apesar da retórica. O mais realista é um endurecimento dos controles fronteiriços, o que reduziria o fluxo de imigrantes e reduziria a oferta de trabalhadores para setores intensivos em mão de obra de baixa qualificação, como restaurantes e construção civil.
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