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A explosão das apostas online no Brasil tem gerado enormes desafios, não apenas para a economia, mas também para a saúde mental das pessoas, além de grandes danos financeiros pessoais aos apostadores.
Em recente nota técnica, o Departamento de Estatísticas do Banco Central apontou que somente em 2024, o volume das apostas online no Brasil ficou entre R$ 18 bilhões e R$ 21 bilhões por mês. E o Banco Central avalia que este número tende a estar subestimado, pois trata exclusivamente das transferências via Pix de pessoas físicas para empresas de apostas.
O BC estima, ainda nesse mesmo estudo, que somente no mês de agosto, 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família enviaram por Pix às empresas de apostas, o equivalente a R$ 3 bilhões.
Vários estudos e estatísticas têm sido publicados quase diariamente apontando os danos financeiros, sociais e emocionais que as bets têm causado. Os indicadores, ao mesmo tempo que assustam, ilustram a complexa relação que nós, humanos, temos com o dinheiro.
Dados do levantamento feito pelo Instituto Locomotiva sobre o perfil dos apostadores revelam, entre outras coisas, que 79% pertencem às classes C, D e E; 86% têm dívidas e 64% estão com nome sujo.
Por que as pessoas apostam?
As ciências sociais, a psicologia econômica e a neurociência têm se debruçado sobre essa questão, para tentar explicar por que tanta gente se deixa envolver por essa armadilha mental. Mesmo com todas as estatísticas apontando que as chances de ganho são ínfimas, o que mais se verifica são os vieses comportamentais agindo em detrimento das avaliações racionais.
Em geral, os apostadores não se veem como viciados em jogos, e se autoconvencem de coisas como “é só de vez em quando”, “só jogo uns trocadinhos”, “alguém tem que ganhar, então tento a sorte” ou até mesmo absurdos como “conheço uma pessoa que vive de apostas e ganha muito bem” entre outras.
Muitas pessoas se permitem fantasiar, mesmo que por breves momentos, sobre como seria ganhar dinheiro de forma fácil, e a maioria das que fazem apostas online, no momento de desembolso do dinheiro no jogo, estão na verdade comprando uma pequena dose de esperança.
O cérebro não calcula grandes números
De nada adianta dizer a um apostador que as chances de ele ganhar são, por exemplo, de 1 em 175 milhões, porque a esmagadora maioria das pessoas não fará esse raciocínio, ou seja, o cérebro humano tem que processar muitas informações para conseguir trabalhar com um conceito probabilístico tão pequeno.
Sendo assim, o risco percebido em cada aposta tem pouco a ver com os resultados, e muito a ver com o quanto de medo ou esperança um apostador está sentindo no momento em que joga.
Apostas online trazem ao cérebro um enquadramento onde razão e lógica ficam em segundo plano, e prevalecem as esperanças e sonhos. As casas de apostas sabem disso e investem pesado numa comunicação persuasiva que venda, habilmente, esperança e sonho.
O psicólogo ganhador do Prêmio Nobel de Economia, Daniel Kahneman, afirmou há alguns anos em um artigo do The New York Times: “Para eventos emocionalmente significativos, o tamanho da probabilidade simplesmente não importa. O que importa é a possibilidade de ganhar. As pessoas ficam animadas com a imagem em suas mentes. A excitação cresce com o tamanho do prêmio, mas não diminui com o tamanho da probabilidade”.
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O cérebro sempre busca fatos que validem suas crenças
Estudos científicos indicam que fantasiar sobre ganhar na loteria ativa as mesmas partes do nosso cérebro que seriam ativadas se realmente ganhássemos. Sendo assim, o marketing das empresas de apostas se encarrega de produzir esse mundo de sonhos que “conversa” diretamente com nossos desejos e dores.
Toda publicidade se dá em torno de campanhas que tornem disponíveis para nossa memória um grande número de ganhadores, ao mesmo tempo em que se encarregam de manter ocultos os números alarmantes de perdedores.
Diferente dos cigarros, onde os riscos do vício são estampados nos maços como um alerta, certamente você nunca viu uma propaganda de apostas online mostrando alguém triste e dizendo “perdi de novo” ou “estou endividado por causa do jogo”. O que é exposto o tempo todo são ganhadores prósperos e felizes.
Então, uma vez convencidos pela publicidade de que estamos a um clique do sucesso, de que a sorte está do nosso lado e de que é fácil ganhar, a tendência do nosso cérebro será sempre buscar evidências que confirmem nossa crença em vez de evidências que possam refutá-la. O viés de confirmação nos leva a negligenciar as evidências de que quase ninguém ganha.
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Apostas online não compensam os riscos
Combinando estudos de matemática e economia (teoria moderna de portfólio), os premiados matemáticos Aaron Abrams e Skip Garibaldi, da Mathematical Association of America, afirmam: “não compre bilhetes de loteria. É muito arriscado. Mesmo os enormes retornos que encontramos não são grandes o suficiente para neutralizar a enorme probabilidade de não ganhar”
Na mesma linha, o professor David Sumpter, da Universidade de Uppsala, Suécia, afirma: “Se você não tem fortes habilidades matemáticas e nunca parou para construir modelos matemáticos para vencer as casas de apostas, você não vai conseguir”. Ele acrescenta que as habilidades matemáticas necessárias para vencer nas apostas online são tão grandes que quem as possuir vai ganhar muito mais dinheiro trabalhando para as empresas de apostas do que apostando.
Somente com um investimento significativo em educação financeira básica será possível capacitar apostadores a superarem os vieses comportamentais que os levam a ignorar que a maioria dos prêmios são aleatórios, e aqueles que não o são, favorecem invariavelmente a banca, pois é disso que esse negócio vive.
Eduardo Mira é investidor profissional, analista CNPI, pós graduado em pedagogia empresarial, coordenador do MBA em Planejamento Financeiro e Análise de Investimentos da Anhanguera Educacional, sócio do Clube FII e sócio fundador da holding financeira MR4 Participações.
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