Entenda por que Comer Ovos é Mais que Hype ou Onda, é um Salva Vidas Global

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Ovos na alimentação infantil está mudando padrão de saúde e incentivando empreendedorismo social

As vozes agudas de bebês e crianças pequenas enchem o ar como música, se espalhando pelo amplo campo de Mukinga, no distrito de Musanze, em Ruanda, na África. Sob um vibrante toldo colorido, dezenas de pais — principalmente as mães — se reúnem para escapar do sol escaldante da tarde. Seus filhos, acomodados em tendas próximas, estão recebendo ovos como parte de uma iniciativa para enfrentar a crise de desnutrição que aflige a região. Esta refeição simples, mas vital, oferece esperança para um futuro mais saudável para os membros mais jovens da comunidade.

“Eu não sei por que, em comparação com outras crianças da mesma idade, meu filho não ganha peso”, lamenta uma mãe no idioma local Kinyarwanda. “Sempre que consigo dinheiro, tento comprar o máximo que posso para ele.”

Um grupo de famílias vulneráveis, que expressaram preocupações semelhantes com relação a seus filhos, recebe trinta ovos cada um, como parte da campanha de nutrição chamada “Um Ovo Por Criança Todos os Dias”, criada pela Heza Egg Hub.

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Os ovos são um dos alimentos mais completos da natureza — ricos em proteínas, vitaminas e nutrientes essenciais. De acordo com a National Library of Medicine (NLM), maior biblioteca médica do mundo que faz parte do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, oferecer apenas um ovo por dia a uma criança pode reduzir os índices de nanismo em 47%.

Na África, onde 30,8% das crianças menores de cinco anos apresentam nanismo, e uma em cada cinco pessoas é subnutrida, esse impacto tem o potencial de ser particularmente poderoso.

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Samuel Nduwayezu, cofundador da Heza Initiative e da Heza Egg Hub, entrega 30 ovos para uma mãe como parte da iniciativa

O projeto Heza Egg Hub foi desenvolvido por um grupo liderado por jovens, o Heza Initiative, com sede em Ruanda, uma incubadora de pequenos negócios para proporcionar oportunidades econômicas às mães adolescentes, que muitas vezes são marginalizadas pela sociedade local.

“Essas jovens geralmente enfrentam rejeição por parte de suas famílias”, diz Samuel Niyonzima, cofundador do hub. “Nós as treinamos na criação de aves, oferecemos capital inicial e as ajudamos a construir um futuro para elas e seus filhos.” O impacto não é apenas econômico; também é psicológico e nutricional.

“Vimos mães jovens, que haviam perdido a esperança, ganharem confiança e estabilidade. Seus filhos, antes desnutridos, agora estão mais saudáveis.” Niyonzima e o outro cofundador do hub, Samuel Nduwayezu, — ambos enfermeiros de profissão — presenciaram os efeitos devastadores da desnutrição de perto.

“Descobrimos que 33% das crianças em Ruanda têm nanismo — não porque as famílias carecem de recursos, mas por causa de hábitos alimentares inadequados”, diz Niyonzima.

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Uma pesquisa recente revela que 20% das famílias em Musanze sofrem de insegurança alimentar, dependendo fortemente de dietas ricas em amido e com pouca diversidade alimentar. Menos de 20% dos entrevistados relataram ter consumido qualquer alimento de origem animal no dia anterior.

Historicamente, essa tem sido a tendência alimentar em grande parte da África Subsaariana, mas isso está começando a mudar — um ovo por vez. De acordo com o E. Fallou Guèye, doutor em nutrição e membro da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o setor avícola da África é um dos que mais crescem na agricultura, com uma taxa de 40,9% em 10 anos — superando a média global de 36,2%.

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Vendedora de ovos em Abidjan, na Costa do Marfim

Embora o continente ainda esteja atrás no consumo per capita de ovos, a demanda está aumentando rapidamente. Por exemplo, em Ruanda, o consumo de ovos cresceu 67% entre 2010 e 2020, enquanto Gana atingiu um recorde de produção de ovos de 51.500 toneladas em 2020. O mercado de ovos africano deve continuar a se expandir, com uma taxa de crescimento anual esperada de 10,10% até 2029.

Por meio de iniciativas inovadoras e modelos de pequenos negócios, a avicultura está se mostrando uma ferramenta poderosa para o empoderamento das mulheres, melhoria dos meios de subsistência, resiliência climática — e na luta pelo Fome Zero.

“É o melhor ouro que você pode ter. Contém todos os nutrientes que se pode imaginar”, diz a doutora Gloria Ethel Ofei-Akoto, fundadora da OphirGold, uma empresa social de Gana movida pelo poder transformador dos ovos. Como médicos, Gloria Ethel e seu marido Elliott viram como a desnutrição — especialmente entre crianças — destrói comunidades.

“Durante meu estágio médico, trabalhava em uma ala de desnutrição, onde tratávamos muitas crianças mal nutridas vindas de áreas rurais — mães que perdiam seus filhos”, diz ela.

Heza Initiative

Projeto de incentivo à criação de aves da Heza Initiative tem levado mais saúde às crianças

Em 2020, quando o casal se mudou para a região oeste de Bono, em Dormaa Ahenkro, onde a produção de frango é uma atividade econômica dominante, ficaram desanimados ao observar os produtores de aves jogando ovos fora.
Logo descobriram que, embora houvesse demanda por ovos, o alto custo da ração para frangos tornava o negócio inviável. O problema se agravava porque os níveis de produção do país não eram suficientes para atender à demanda local — 80% dos produtos avícolas eram importados.

Para resolver os problemas de acesso ao mercado e desnutrição, o casal lançou a OphirGold. Por meio de modelos de agregação e agricultura contratual, treinamento em produção segura e garantia de preços justos, a empresa social e sua unidade de produção estão apoiando os pequenos produtores, ao mesmo tempo que aumentam a oferta de produtos derivados de ovos para atender às necessidades do setor industrial, que inclui padarias e cozinhas de companhias aéreas.

Além disso, oferecendo uma gama diversificada de produtos derivados de ovos e produzindo suplementos de micronutrientes de cálcio feitos de cascas de ovos, a empresa usa a inovação com ovos como uma ferramenta para combater a desnutrição.

Para Ofei-Akoto, essa é sua vocação. “Eu diria que talvez tenha nascido para fazer isso. Meu marido brinca comigo porque meu sobrenome de solteira é Gazy — Ethel Gloria Gazy — as iniciais são E-G-G (ovo, em inglês)”, ela ri, destacando seus incansáveis esforços para aumentar a demanda entre consumidores menos informados, desmistificando os mitos locais em torno do consumo de ovos.

“Grávidas não podem comer ovos, ou seus filhos se tornarão ladrões”, ela diz, balançando a cabeça. “Até mesmo os agricultores que produziam os ovos não os comiam por causa do colesterol alto. Tivemos que fazer muita educação.”
Com uma média de apenas 44 ovos consumidos por pessoa anualmente, a África responde por apenas 4,1% do consumo global desta proteína, apesar de representar 17,2% da população mundial. Essa lacuna representa uma oportunidade tremenda para o crescimento do setor, e os sinais dessa expansão já estão começando a surgir.

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Gloria Ethel Ofei-Akoto, fundadora da OphirGold de Gana, acredita firmemente no poder dos ovos para reduzir a desnutrição e apoiar os meios de subsistência

De acordo com Nan-Dirk Mulder, analista sênior de proteína animal do Rabobank, a classe média crescente da África, e a rápida urbanização, estão impulsionando uma transformação na indústria avícola do continente. À medida que as dietas mudam de predominantemente vegetais para opções mais ricas em proteínas, frango e ovos se tornaram as principais escolhas, graças à sua acessibilidade, disponibilidade e popularidade.

A produção avícola, com seu rápido retorno sobre o investimento, tornou-se um negócio atraente e escalável, atraindo investimentos significativos e posicionando o setor para um rápido crescimento.

Essas condições favoráveis tornaram a empresa social Hatch Africa um investimento atraente para o Rabobank e outros parceiros do IDH FarmFit Fund, o maior fundo de impacto público-privado do mundo para pequenos agricultores.

Luke Dray

Pintinhos de um dia na Ethiochicken, uma das instalações da Hatch Africa localizada em Addis Abeba, Etiópia

O modelo inovador da Hatch Africa — operando na Etiópia, Quênia, Gana, Costa do Marfim, Ruanda e Uganda — alcança cerca de 4,6 milhões de pequenos agricultores anualmente, transformando-os em microempreendedores e fornecendo-lhes os recursos e o apoio necessários para prosperar.

A organização desenvolveu uma raça melhorada de galinhas de dupla finalidade, criadas para produção local, que superam as raças até então criadas, porque crescem mais rápido, botam até três vezes mais ovos e apresentam maior resistência a doenças.

O modelo de negócios impulsionado por mais de 16.000 agentes — 31% dos quais são mulheres — é projetado para alcançar pequenos produtores em larga escala. Os agentes compram pintinhos de um dia de idade, criam-nos por até um mês e meio e depois os vendem para pequenos agricultores.

“Nossos pequenos agricultores geralmente compram entre 5 e 20 galinhas, mantendo algumas para o consumo doméstico e vendendo os ovos excedentes e os frangos para suas comunidades”, diz Laura Allan, líder de impacto da Hatch Africa. “Toda a nossa missão e visão é sobre tornar os agricultores mais saudáveis e mais prósperos.”

Os resultados são profundos: apenas em 2023, a Hatch Africa vendeu mais de 45 milhões de pintinhos de um dia, produzindo cerca de 3,5 bilhões de ovos em comunidades rurais, e desde sua fundação (2010), gerou aproximadamente US$ 3,1 bilhões (R$ 17,4 bilhões na cotação atual) em renda adicional para pequenos agricultores nos países em que atua.

“Quando falamos sobre o ODS 2, a Hatch Africa, para nós, está na linha de frente”, diz Isaac Mungoma, gerente sênior de investimentos do IDH. Lembrando que a ODS2 ( Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecidos pelas Nações Unidas em 2015, se refere à “Fome Zero e Agricultura Sustentável”.

Hatch Africa

Uma criadora treinada pela Hatch Africa na Costa do Marfim vende uma galinha para um pequeno agricultor

“Na África, o ovo é a fonte de proteína mais barata que se pode encontrar. Uma galinha bota um ovo todos os dias. Você pode comê-lo, e estará garantido que, alimentando a galinha, outro ovo estará a caminho, então não precisa de armazenamento. É muito acessível, pode chegar às partes mais remotas de qualquer país, e as galinhas não precisam de terra adicional, o que também é um problema, especialmente para a população mais vulnerável, grande parte composta por mulheres”,  diz Mungoma.

Laura explica que integrar as mulheres em suas redes como agentes de criação e pequenas agricultoras é uma prioridade para a Hatch Africa, reconhecendo a significativa geração de renda e o melhor acesso aos alimentos que o papel pode trazer para as mulheres rurais.

A avicultura também oferece a oportunidade de resiliência climática. De acordo com um estudo independente encomendado pela Hatch Africa, 85% de seus agricultores dizem que criar galinhas de raças melhoradas aumentou sua capacidade de resistir a choques climáticos.

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Gloria Ethel Ofei-Akoto, fundadora da OphirGold de Gana

Na África Subsaariana, pequenos agricultores, dos quais 70% são mulheres, produzem 70% da avicultura africana. Essa produção em pequena escala apoia a geração de renda, a redução da pobreza e a segurança alimentar, especialmente para mulheres e jovens.

Empresas e iniciativas com propósito voltadas para o combate à fome desempenham um papel crucial no aumento da demanda por ovos na África. Ao capacitar pequenos agricultores e conscientizar sobre o valor nutricional dos ovos, esses esforços estão transformando comunidades e impulsionando a luta para acabar com a fome em todo o continente.

“Eu, pessoalmente, acredito que o empreendedorismo trata de resolver um problema transgeracional com uma solução que sobreviva a você”, diz Ofei-Akoto. “As pessoas devem se beneficiar dos ovos que estão sendo produzidos e das fazendas que foram revitalizadas. Precisamos garantir que o que estamos fazendo beneficie a sociedade, o clima, o solo, todos ao nosso redor, e que essa solução que propusemos sobreviva a nós. Quando você coloca o propósito à frente dos negócios, você sempre vence.”

*Daphne Ewing-Chow é colaboradora da Forbes EUA, jornalista com mestrado em política econômica internacional pela Universidade de Columbia.

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