Como a General Mills tornou seu cereal de trigo um sonho olímpico dos medalhas de ouro

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aitlyn Jenner nunca esperou ficar rica com os Jogos Olímpicos de Verão de 1976, realizados em Montreal, a maior cidade da província de Quebec, no Canadá. O decatleta norte-americano de 26 anos, então conhecido como Bruce Jenner, vivia e treinava com US$ 10 mil por ano (US$ 55 mil quando ajustado pela inflação, ou R$ 310 mil), mas depois de ganhar uma medalha de ouro no decatlo nos Jogos de Montreal, Jenner foi abordado pelo General Mills com uma oferta para endossar um de seus principais produtos, Wheaties, uma marca de cereal matinal feita de grãos inteiros de trigo integral.

“Estávamos assinando o contrato e lembro que o cara me entregou minha cópia e disse: ‘Parabéns, você é milionário’”, disse Jenner à Forbes. “Nunca esquecerei isso, porque perguntei: ‘Eu?’”

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Esse acordo de US$ 1 milhão (cerca de US$ 4,5 milhões ou R$ 25 milhões de hoje) foi um compromisso de cinco anos para se tornar um embaixador da General Mills, não apenas aparecendo em um trio de capas de caixas de Wheaties e em vários comerciais de TV, mas também atuando como porta-voz do cereal em eventos de saúde e fitness em todo o país. O contrato concedia à empresa 45 dias do tempo de Jenner por ano, um requisito astronômico para os padrões atuais, consolidando a associação entre o “maior atleta do mundo” e o “Café da Manhã dos Campeões”.

“De longe, tudo o que fiz na minha carreira, a General Mills teve o maior impacto e todos se lembram dos comerciais”, diz Jenner, contando ter dado a cada membro de sua família uma cópia emoldurada e assinada da caixa original. “Foi um grande negócio.”

Fundada em 1866, na 20ª edição da lista Forbes Global 2000, onde estão também as maiores empresas de alimentos do mundo em 2023, a General Mills aparece no sétimo posto neste setor (386ª no ranking geral), com uma receita de US$ 19,95 bilhões, ativos da ordem de US$ 31,2 bi e valor de mercado de US$ 52,75 bilhões. Além dos cereais prontos para consumo, fabrica snacks, iogurte, refeições congeladas, massas e misturas, sorvetes, vegetais em conserva, sobremesas e bebidas. No Brasil, é dona de marcas como Kitano, Yoki e Häagen-Dazs.

A tradição de colocar um atleta de elite em uma caixa de Wheaties começou em 1934, quando a General Mills usou uma foto do rebatedor do New York Yankees, Lou Gehrig, no verso de sua caixa como uma personificação dessa personalidade campeã.

Getty

A lenda do New York Yankees, Lou Gehrig, foi o primeiro atleta a aparecer em uma caixa do Wheaties em 1934

Desde então, quase todos os atletas norte-americanos icônicos apareceram na capa, de Bob Cousy e Bart Starr, a Michael Jordan e Tiger Woods, passando por Stephen Curry e Serena Williams. Durante esse período, a Wheaties construiu uma conexão particular com os Jogos Olímpicos, apresentando mais de 100 atletas olímpicos ao longo das décadas.

A maioria desses atletas de capa relata que a caixa de Wheaties é, se não a realização de um sonho de toda uma vida, pelo menos satisfazendo um comichão nostálgico pelas caixas que viam nos supermercados quando crianças. Quando a General Mills se aproxima do consumidor, geralmente é uma venda fácil.

“A Wheaties tem algo que as marcas não podem comprar – e isso é história”, diz T. Bettina Cornwell, chefe do departamento de marketing da Universidade de Oregon. “O valor que eles têm é uma mensagem muito clara que não mudou ao longo dos anos. E é tão saudável, certo?”

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Por causa do imenso valor sentimental, o endosso do Wheaties é conhecido nos círculos de marketing esportivo por ser algo que vale cada centavo e que por isso sai barato. No final da década de 1990, saiu no Wall Street Journal que a patinadora artística olímpica Tara Lipinski havia concordado com uma oferta de US$ 15 mil (US$ 30 mil ou R$ 170 mil hoje) para aparecer em uma caixa de Wheaties após os Jogos de Inverno de 1998, mas a empresa escolheu o time de hóquei feminino dos EUA, vencedor da medalha de ouro, que apareceu na caixa supostamente sem remuneração.

Hoje, quando acordos de patrocínio multimilionários são comuns, o endosso do Wheaties para o escalão superior dos atletas olímpicos chega a cerca de US$ 300 mil (R$ 1,680), com atletas menos conhecidos ganhando na faixa de US$ 75 mil (R$ 420 mil) a US$ 100 mil (R$ 560 mil).

“Mesmo que não houvesse dinheiro, se eu usasse o produto e acreditasse neles, quero estar com eles”, diz Misty May Treanor, que ganhou três medalhas de ouro olímpicas no vôlei de praia e apareceu no box Wheaties em 2012. “Para mim, essa foi uma caixa icônica que nunca sonhei que estaria, na época que procurava aquela caixa de Mary Lou Retton quando era mais jovem.”
Treanor diz que seu agente “cantou a bola” sobre o possível acordo em Londres, antes de ela competir nos Jogos Olímpicos de Verão de 2012, porque a arte e o design da caixa precisavam ser aprovados. Mas havia uma condição.

Wheaties era o café da manhã dos campeões, então Treanor e sua companheira de vôlei de praia, Kerri Walsh Jennings, precisavam ganhar o ouro para que a campanha prosseguisse. “Como atletas, nunca diremos isso, mas definitivamente estava na minha mente”, diz ela. “Quando meu agente disse aquilo eu pensei, ah, eu tenho que vencer. Quero que isso aconteça, tenho que vencer!”

Para os atletas olímpicos que estão sendo apresentados no cenário mundial pela primeira vez, os Wheaties também podem representar uma prova de conceito para outras marcas. Jenner diz que a associação com o cereal levou diretamente a outros comerciais, de marcas como câmeras Minolta e suco de laranja Tropicana, que hoje pertence à PepsiCo. (A associação de Jenner com a marca também levou a um esboço clássico do Saturday Night Live, em 1977, para Little Chocolate Donuts, estrelado por John Belushi.) Mesmo 40 anos depois, a piloto de esqui Mikaela Shiffrin teve a mesma experiência depois de ganhar sua primeira medalha de ouro em 2014 e aparecer na caixa logo depois.

“Com a caixa Wheaties é um sinal de credibilidade”, diz Shiffrin, que fechou contrato com a marca de relógios Longines no mesmo ano. “Eu diria que essa foi uma das forças motrizes por trás do valor de mercado da minha marca na época.”

No entanto, Shiffrin diz que, embora o Wheaties possa ter sido um dos primeiros a tornar o marketing esportivo interessante, “agora existem milhares de lugares que são legais”. A próxima geração pode sonhar em ser uma skin de personagem jogável em Fortnite, como Patrick Mahomes, Naomi Osaka e outros atletas têm feito, ou talvez o objetivo seja ser entrevistado na série “Hot Ones”, do YouTube, como Lewis Hamilton e Carmelo Anthony.

General Mills Marketing

A marca café dos campeões virou um ícone do marketing

Atualmente, mais pessoas podem ver um vídeo viral no TikTok do que uma caixa de cereal no supermercado, como foi o caso do mergulhador inglês Tom Daley, vencedor da medalha de ouro, flagrado tricotando durante as Olimpíadas de Tóquio em 2021 e aproveitou isso para 1,4 milhão de seguidores e marca própria de malhas.

Nos dias atuais, pode parecer que a Wheaties precise mais dos atletas do que os atletas precisam da marca. Analistas como T. Betina Cornwell acreditam que a própria caixa de Wheaties é, agora, mais valiosa do que o cereal dentro dela, apontando para o robusto mercado formado para as caixas anteriores em sites de leilão, como o eBay. “Eu nunca tentaria vender Wheaties sem um atleta na capa”, diz ela.

Além disso, o trigo não é tão popular como o cereal já foi – em grande parte porque as vendas totais de cereais desse tipo têm diminuído nos últimos anos. A participação de mercado da marca atingiu o pico em 1941, respondendo por 12% de todas as vendas de cereais nos EUA. No final da década de 1990, tinha caído para 1%, superado até mesmo por outras marcas preocupadas com a saúde, mesmo dentro do portfólio da General Mills, como a Cheerios. De acordo com a empresa de pesquisa de mercado Euromonitor International, a Wheaties ocupa atualmente a 21ª posição nos EUA, entre as marcas de cereais matinais familiares.

A General Mills não quis comentar sobre vendas, participação de mercado ou remuneração para atletas que aparecem em suas caixas. Mas Bethany Quam, presidente de alimentos matinais da empresa, reitera que os cereais continuam a ser o café da manhã número 1 no país e que US$ 9,5 bilhões (R$ 53,2 bilhões) em vendas ainda estão em disputa todos os anos na indústria.

Ela diz que não viu diminuição do entusiasmo dos atletas que queriam estar na caixa dos Wheaties. “Associar-se a uma marca como esta também ajuda a construir a sua marca própria, por isso tornou-se muito valioso para eles e para nós”, diz Quam. “Você não pode se tornar um ícone da noite para o dia.” (*Reportagem traduzida e adaptada por Forbes Agro)

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