Senti uma voglia, vontade, como se diz na Itália, de rever clássicos do cinema italiano. Que delicioso é “Dolce Vita” (1960) de Fellini! Inesquecível, a cena da monumental vênus loura Anita Ekberg se banhando na Fontana di Trevi em Roma para deleite do bel Marcello Mastroianni! E “Il Gattopardo” (O Leopardo)? Lançado em 1963, revive o Rissorgimento, movimento no final do século 19 que levaria a Itália à unificação e, mais tarde à república. Na direção está o sofisticadíssimo Luchino Visconti (que era conde da nobreza de Milão) com Alain Delon e Claudia Cardinale, lindos, tão jovens, e o americano Burt Lancaster como príncipe de Salina, esbanjando experiência dramática. Burt, na época com 50 anos, já esquecido pelo cinema americano, comprovou o enorme talento pouco explorado por Hollywood até Visconti revelá-lo. Depois, os dois fizeram juntos pérolas, como o decadente “Deuses Malditos” (1969), em que trabalhou a deusa cearense Florinda Bolkan, e “Violência e Paixão” (1974), onde atuou a elegantíssima Silvana Mangano, ela também dirigida por Visconti várias vezes, inclusive no poético “Morte em Veneza” (1971). Imperdíveis.
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Todo esse “desvio” para aterrissar no polêmico Pier Paolo Pasolini. Cineasta com obras intrigantes ou depravadas como diriam alguns, como “Salò ou os 120 Dias de Sodoma” (1975), o romano irrequieto foi um dos primeiros diretores a explorar sua
própria homossexualidade na grande tela. O bravo Pasolini dizia: “A verdade não está num só sonho, mas em vários sonhos.”
Quando lembro da frase de Pasolini, reflito sobre esta dimensão nas artes plásticas. Os artistas visuais, cada qual à sua maneira, são seres inquietos, que buscam realizar seus sonhos mais íntimos através de pesquisas artísticas. Esta busca incessante é uma das questões abordadas na coletiva, ”Co/respondências”, montada em nossa sede na Avenida Europa pelo núcleo curatorial da galeria reunindo trabalhos de brasileiros estelares em diálogo com nomes da arte contemporânea internacional.
Na seleção incorporamos obras com elementos visuais que impactam a percepção do espectador e promovem experiências sensoriais, como luminosidade, formas geométricas, cromaticidade e espacialidade. No grupo encontram-se três pioneiros da arte cinética e ótica internacional, Julio Le Parc e Heinz Mack, e Abraham Palatnik, falecido em 2020, figura central da arte cinética no Brasil, com obra no acervo do MoMA de Nova York.
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Outro diálogo de destaque acontece entre o italiano Michelangelo Pistoletto e o paulistano Carlito Carvalhosa (1961–2021). Representante da Arte Povera, Pistoletto passou a utilizar, a partir da década de 1960, espelhos como suporte pictórico, pesquisa que se desdobra até hoje no trabalho do artista nonagenário. Carlito também utilizou superfícies espelhadas, mas tensionadas por materiais, como cera e tinta acrílica. Carlito, que nos deixou cedo demais, dizia: “A tela é um lugar onde você projeta as coisas. Mas o espelho reflete, então ele não deveria ser pintado. E é essa tensão que me interessa.”
Também estão em exibição obras de Amelia Toledo, Jacques Douchez, francês, residente em São Paulo, já falecidos, da gaúcha Lucia Koch, do francês Daniel Buren, da americana Sheila Hicks, e do islandês Olafur Eliasson. Todos em busca de seus sonhos.
SERVIÇO
Co/respondências
Núcleo curatorial Nara Roesler
Até 31 de maio, 2024
Galeria Nara Roesler, São Paulo
https://nararoesler.art/
Com colaboração de Cynthia Garcia, historiadora de arte, premiada pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) cynthiagarciabr@gmail.com
Nara Roesler fundou a Galeria Nara Roesler em 1989. Com a sociedade de seus filhos Alexandre e Daniel, a galeria em São Paulo, uma das mais expressivas do mercado, ampliou a atuação inaugurando no Rio de Janeiro, em 2014, e no ano seguinte em Nova York.
info@nararoesler.art
Instagram: @galerianararoesler
http://www.nararoesler.com.br/
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