A fazenda Estância é um conjunto de terras que somam 1,2 mil hectares em um raio de 10 km a partir de Pirassununga (SP), a 200 km da capital, município com forte presença de cana-de-açúcar e usinas. Mas, nas terras que pertencem à economista Aline Vick, e sua irmã Nathalia Vick, gestora de agronegócios, são cultivadas soja, milho e mandioca desde os anos 1960. Elas são as sucessoras do pai, José Vick, que em 2005 comprou a propriedade que pertencia à família da mãe.
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Em 2021, Aline e Nathalia começaram a adotar práticas de agricultura regenerativa com apoio da Bayer CropScience, a multinacional alemã de biotecnologias e proteção de cultivos. Feita a lição de casa, a Bayer convidou a Estância para ser uma fazenda do grupo ForwardFarming, a segunda do tipo no país, dentro do programa global de fazendas-modelo da empresa. O anúncio ocorreu na terça-feira (14). Agora, a propriedade passará a receber visitantes, como produtores, agrônomos, técnicos, estudantes e outros interessados no modelo de produção.
Há 29 ForwardFarmings no mundo, em 14 países, entre eles a própria Alemanha; a Bélgica, onde foi implantada a primeira fazenda em 2016, mais Argentina, França, Holanda e Itália, entre outros. No Brasil, a estreia do projeto aconteceu em 2017 com a fazenda Nossa Senhora Aparecida, de 5,3 mil hectares, em Água Fria de Goiás (GO).
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No caso da Estância, para se tornar uma fazenda modelo, foram adotadas práticas e insumos mais modernos, incluindo os biológicos que permitiram a redução no uso de fertilizantes. A principal medida foi reservar 20% da área de grãos, a cada safra, para as culturas de cobertura (forrageiras) garantirem a preservação do solo. “Se a produtividade baixa num talhão, tento identificar se é problema de compactação, nematóides, ou ainda se quero apenas reciclar nutrientes e produzir palhada, e escolho a planta mais adequada, como o milheto”, explica Vick.
A conservação do solo foi determinante na decisão da Bayer em convidar a produtora para o ForwardFarming, projeto que hoje contempla fortemente a agricultura regenerativa. “Mesmo que não tenha um problema, entendemos que é preciso fazer esse ciclo de 20% por ano e assim, a cada cinco anos, giramos a área total. Isso vai ser a vida daqui para a frente”, diz Vick. “Como começamos o ciclo em 2021 e encerraremos em 2024 com 100% da área rotacionada.”
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Aline conta que os desafios não têm sido pequenos nos últimos anos. Principalmente por causa das chuvas irregulares, mais do que nunca, a gestão da propriedade passa pela estrutura física do solo. “Os últimos anos foram atípicos na região. Mas mesmo com volumes de chuva muito diferentes e irregulares, conseguimos manter os níveis de produtividade, graças à saúde do solo”, diz ela. “Ainda estamos no início da jornada de agricultura regenerativa. Acreditamos que a busca pelo equilíbrio é o único caminho possível para o setor. Nossa referência é a floresta. É possível ter, na área produtiva, uma microbiota (microorganismos) similar às das áreas florestais.” Juntando todas as áreas, na propriedade há cerca de 400 hectares de reserva legal e áreas de preservação permanente.
A Estância destina 760 hectares da área total para os grãos, sendo que planta soja no verão, com produtividade de 70 sacas por hectare – bem acima da média nacional, de 55 sacas por hectare –, mais milho de segunda safra ou sorgo durante o inverno. A produção dos grãos é vendida para tradings como ADM, Bunge e Cutrale, que atuam na região. A mandioca é vendida para uma agroindústria local de farinha.
Para mostrar o modo de produção, a Estância já recebeu neste ano cerca de 400 visitantes. Nos próximos meses há mais duas visitas programadas, sendo uma delas da própria equipe de desenvolvimento de produtos de proteção de cultivos da Bayer. O outro grupo será de alunos de agronomia da faculdade Anhanguera. Mas não são apenas os brasileiros que estão interessados nas práticas que devem ganhar escala cada vez com mais intensidade no agro.
Na Alemanha há quatro fazendas do ForwardFarming. A proprietária de uma delas, Petra Bohnsack, 56 anos, e seu filho Lasse Bohnsack, 15 anos, há três anos no projeto, foram convidados pela Bayer para conhecer a fazenda Estância. Petra, que além de produtora é vice-prefeita de um vilarejo na região de Einbeck, é a sétima geração de uma propriedade nas mãos da família desde o século 19. São 250 hectares onde produzem leite e cultivam abacaxi, alho, maçã e canola.
“Tínhamos um projeto de cooperação com o governo, porque meu marido gosta de fazer pesquisas e melhoramentos técnicos na lavoura. Por isso também, conseguimos essa abertura para o projeto com a Bayer”, diz Petra. “Vejo as diferenças aqui, mas também as similaridades com nossa fazenda. É uma família que tem o coração inteiro na agricultura e nós também temos. Não temos interesse em tirar o máximo da terra e destruí-la. Queremos manter a terra para a próxima geração. ”
Petra conta que medidas de redução de impactos ambientais e da pegada de carbono foram adotadas nas suas terras, como manda a cartilha do ForwardFarming. Os resultados têm sido positivos, o que atrai visitas de outros produtores interessados no modelo de produção e mesmo do público leigo e sem raízes no campo. Aliás, um dos objetivos do ForwardFarming é justamente esse: a educação.
“Os alemães não têm mais uma relação com a agricultura. Muitas pessoas não sabem nem como os agricultores produzem os alimentos”, afirma ela. “Temos uma fazenda aberta, onde grupos podem conhecer nosso trabalho, parecido com o que está sendo feito aqui no Brasil. Porque, para nós, é importante mostrar como a agricultura realmente funciona, encontrar soluções, mas também falar sobre os desafios que enfrentamos.”
Nos encontros FowardFarming, a Bayer mostra as inovações em proteção de cultivos, sementes e biotecnologia, monitoramento e soluções digitais. Carolina Graça, diretora de sustentabilidade agrícola da companhia, diz que a companhia busca monitorar o interesse do público, ressaltando que nos dias atuais um tema tem chamado a atenção de quem procura entender a agricultura regenerativa: o carbono.
As fazendas do projeto FowardFarming fazem parte do programa PRO Carbono, que teve início em 2021 com cerca de 400 produtores e hoje conta com cerca de 1,9 mil produtores em 16 estados brasileiros. No total, para as medições de estoque de carbono já foram analisadas mais de 300 mil amostras de solo. “A partir de agora, entramos numa nova fase”, diz Carolina. “Temos como prioridade aprofundar ainda mais a adoção dessas práticas de agricultura regenerativa. A expectativa é ampliar as áreas participantes no programa dos atuais 200 mil hectares para cerca de um milhão de hectares.”
De acordo com Maurício Rodrigues, presidente da Bayer CropScience para a América Latina, é difícil mensurar os resultados já obtidos em termos de agricultura regenerativa no Brasil e no mundo. O executivo diz que, de modo geral, a empresa observa nos projetos um ganho médio de 10% na produtividade das lavouras que adotam as medidas recomendadas. “Diuturnamente, está havendo ganho de produtividade e isso faz parte da agricultura regenerativa. Não temos um número mágico para dizer o quanto representa a soma de todos os itens, mas várias medidas de diversas áreas mostram a composição desse caminho que traçamos para aumentar o rendimento da agricultura”, afirma. As fazendas do projeto FowardFarming, justamente por serem laboratórios para a companhia, podem ajudar bastante nesta tarefa, almeja a Bayer.
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