Será que a hortelã pode se tornar aliada em escala contra as ervas daninhas nas lavouras?

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Os cientistas Manish Bansal e Randall Hess, nas estufas da Harpe Bioherbicide, empresa da Carolina do Norte

As ervas daninhas têm sido um grande desafio desde os primórdios da agricultura. Na lavoura, o meio mecânico de controle usado há séculos degrada os solos ao longo do tempo. No caso dos EUA, este impacto tornou-se particularmente problemático na era moderna e combinou-se com a seca para criar o fenômeno “Dust Bowl” nos EUA, na década de 1930, com tempestades de poeira que duraram cerca de 10 anos devastando o campo.

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A partir daí, um grande progresso foi feito por meio do desenvolvimento de sistemas de “cultivo de conservação” e particularmente a partir da expansão dos métodos agrícolas de “plantio direto” – técnica que o Brasil tem uma presença global com 63 milhões de hectares neste sistema, e o “plantio em faixa”, além dos métodos de “agricultura regenerativa” que começam tendo por base a saúde do solo como proteção. Os herbicidas – produtos químicos que visam especificamente as ervas daninhas – têm sido uma ferramenta crítica para permitir estas melhores práticas agrícolas.

Por isso, não é de surpreender que algumas ervas daninhas tenham sido capazes de se adaptar às técnicas modernas de controle de ervas daninhas. Assim como havia certas ervas daninhas que ainda eram capazes de persistir em um ambiente de controle estritamente mecânico, algumas ervas daninhas desenvolveram a capacidade de tolerar herbicidas químicos. Isto é apenas biologia e análogo à questão da resistência aos antibióticos na saúde humana.

Em alguns casos, essas novas linhagens de ervas daninhas tolerantes a herbicidas podem ser controladas com outro herbicida que atue através de um “modo de ação” diferente. Mas algumas ervas daninhas estão agora desenvolvendo resistência a múltiplos e diferentes “modos de ação”. Isto está se tornando mais difícil para os agricultores continuarem com os seus sistemas de cultivo mínimo e direto que protegem e melhoram o solo.

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Nesse cenário, as empresas estão constatando que a descoberta de novos modos de ação consome muito tempo e é dispendiosa. Por isso tem ocorrido no mundo uma escassez de opções de “modos de ação” verdadeiramente novos na “caixa de ferramentas” de um agricultor para controlar as espécies mais problemáticas e tolerantes a herbicidas. Mas elas não estão paradas no tempo.

Sediada na Carolina do Norte, um exemplo é a startup Harpe Bioherbicide Solutions, Inc., que encontrou uma nova maneira de resolver esse problema de tolerância a herbicidas. Seus pesquisadores têm trabalhado com combinações de uma série de produtos químicos naturais derivados de várias espécies de hortelã – família de plantas que produz uma coleção muito interessante de compostos que os humanos valorizam por suas propriedades de sabor e odor.

Em concentrações mais altas, alguns desses ingredientes de hortelã podem atuar como herbicidas e matar diretamente uma erva daninha ou semente de erva daninha. Mas em concentrações mais baixas eles podem alterar a permeabilidade ou o metabolismo das células vegetais de tal forma que uma erva daninha que já foi capaz de tolerar um determinado herbicida não é mais capaz de fazê-lo se o herbicida e o produto químico à base de hortelã forem aplicados em combinação.

Para um agricultor, isto pode significar restaurar a utilidade de um herbicida essencial, permitindo ao seu sistema agrícola ser mais amigo do solo. A abordagem Harpe Bioherbcide também tem uma vantagem significativa no que diz respeito às etapas necessárias para obter a aprovação regulatória necessária da EPA (Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos). Colocar no mercado um produto químico sintético completamente novo pode levar 12 anos e custar mais de US$ 300 milhões (R$ 1,5 bilhão). A percentagem destes custos das aprovações regulamentares cresceu rapidamente para quase 14%, de acordo com a CropLife, entidade internacional que reúne empresas e entidades do setor.

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Como muitos dos produtos químicos produzidos por uma planta de hortelã já fazem parte do abastecimento alimentar humano, eles se qualificam para o que é conhecido como status GRAS – Geralmente Considerado como Seguro. Para os produtos químicos naturais que se enquadram nessa categoria, existe um processo regulatório acelerado da EPA denominado “25B” ou “Risco Reduzido” e isto pode significar que esta tecnologia deverá ficar disponível aos agricultores relativamente em breve e a um custo razoável.

Embora o caminho regulamentar seja promissor, o desenvolvimento desta tecnologia envolve uma complexidade muito desafiadora. A interação sinérgica de herbicidas específicos com extratos de menta dá à Harpe Bio a base para a cobertura de patentes, mas também significa que eles têm que descobrir quais misturas específicas serão mais eficazes para quais ervas daninhas tolerantes a herbicidas e em que estágio de seu crescimento.

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Cientistas testam uma grande variedade de hortelã como herbicidas

Os produtos que forem à venda podem necessitar de adequações para “mistura em tanque” com outros produtos químicos e adjuvantes de pulverização para que um agricultor possa aplicar na mesma passagem de pulverização. Embora parte disso possa ser resolvido em testes de estufa – o produto final e os detalhes da utilização do produto têm de ser testados no mundo real – nos campos dos agricultores. Esta fase da investigação está agora em fase inicial.

Um cientista acadêmico de ervas daninhas que esteve envolvido em alguns destes testes, mais um contrato de investigação independente, confirmaram que houve alguns resultados muito encorajadores até agora, em termos de superação da tolerância em certas espécies de ervas daninhas. As propriedades herbicidas diretas em concentrações mais elevadas também foram confirmadas e podem ser adequadas para as tecnologias emergentes que utilizam imagens aéreas para orientar a “pulverização localizada” com controladores num pulverizador ou a partir de um drone.

Os cientistas pesquisadores da Harpe Bio, como Manish Bansal e Randall Hess, passam por parte do tempo nas estufas da empresa  avaliando a a eficácia dos herbicidas à base de extratos de plantas em ervas daninhas problemáticas.

Um dos maiores desafios para todas as tecnologias agrícolas é que existe apenas uma época de cultivo por ano para uma cultura em qualquer geografia, pelo que os testes de campo precisam de ser muito bem concebidos e replicados para aproveitar ao máximo esse intervalo de tempo.

É por isso que é muito encorajador que a Harpe Bio tenha reunido um conjunto altamente experiente de líderes e consultores que têm trabalhado com empresas de tecnologia agrícola como Bayer, Basf, UPL, juntamente com aqueles que lideraram empresas que apoiaram muitos lançamentos globais de produtos. Mas não é somente eles. Em abril de 2023, por exemplo, uma rodada de arrecadação de fundos liderada pela ADM colocou na startup US$ 10,5 milhões (R$ 54 milhões na cotação atual).

Tem havido um grau considerável de consolidação no setor do agronegócio desde 1999 e particularmente no período 2017-19. Isto fazia sentido do ponto de vista empresarial, mas também levou a que um grande número de funcionários seniores recebessem generosos benefícios por parte das empresas que procuravam racionalizar os seus negócios.

A desvantagem é que se trata de indivíduos com experiências e perspectivas extremamente valiosas e difíceis de replicar. Na academia, muitas vezes há a opção de pessoas com experiência única passarem para uma função “emérita”, na qual ainda podem fazer pesquisa e ensino seletivo, mas também ter mais tempo livre pessoal e talvez evitar algumas das funções menos desejáveis, por exemplo, com trabalho em comitês.

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Lavouras infestadas vêm sendo testadas com herbicidas alternativos

De certa forma, o que a Harpe Bio ofereceu aos especialistas da indústria agrícola foi um papel quase emérito. A empresa emprega atualmente 10 pessoas que trabalharam para os principais players do setor e isso inclui quase todos os seus líderes seniores.

Por exemplo, o CEO da Harpe, Bill Buckner, ex-presidente norte-americano e CEO da Bayer CropScience LP; o doutor Robert (Robb) Fraley, membro do Conselho de Bioherbicidas da Harpe, é ex-vice-presidente executivo e diretor de tecnologia da Monsanto Company; Aidan Connolly, também no conselho, passou mais de 25 anos na Alltech, chegando a ser seu diretor de inovação, e o anúncio mais recente da empresa, que é o também doutor Peter Eckes, ex-CTO da BasfAgricultural Solutions, para assumir a função de presidente para Harpe Bioherbicide Board a partir deste mês de maio.

O fato é que a sinergia químico/herbicida GRAS é uma abordagem promissora para lidar com um grande desafio agrícola dos dias atuais e as perspectivas para o seu desenvolvimento oportuno são certamente reforçadas pela experiência coletiva da equipa que lidera os esforços.

*Steven Savage, colaborador da Forbes EUA, é biólogo pela Universidade de Stanford e doutor pela Universidade da Califórnia, em Davis (tradução: ForbesAgro).

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