Uma onda de recuperação judicial de produtores rurais, que tem preocupado tradings e agroindústrias no Brasil, deverá tornar o crédito mais caro para o setor, com impactos na cadeia produtiva, avaliou nesta terça-feira um representante da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais).
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Segundo o diretor de Tributação e Negócios Jurídicos da Abiove, Dalton Cordeiro de Miranda, uma renegociação com os credores seria o “remédio” mais indicado para o agricultor em dificuldades financeiras, e as empresas ligadas à associação de tradings e processadoras de grãos estão abertas a oferecer esta alternativa.
“A gente entende que a recuperação judicial pode ser letal para o negócio e afetar o crédito, afetando os bons produtores, ou seja, os bons pagarão pelos maus. E, mais do que isso… vai gerar uma dúvida para o mercado, o que não é bom. Temos buscado evitar”, disse Miranda durante o Congresso Brasileiro de Direito do Agronegócio, em São Paulo.
A fala foi feita após os pedidos de recuperação judicial por produtores rurais que atuam como pessoas físicas no Brasil dispararem mais de seis vezes em 2023 na comparação com 2022, em meio aos impactos da quebra de safra de soja pela seca, segundo dados da Serasa Experian divulgados no início do mês.
“Dentro da associação, temos associados que, em razão dessa onda que temos visto, seja pela alegação de crise climática ou baixa da moeda americana… com o simples ruído nos bastidores do mercado de que um produtor estava pensando em ingressar com recuperação judicial, as associadas estão procurando o produtor para renegociar, porque a gente entende que este de fato é um remédio muito melhor”, afirmou.
O presidente do IBDA (Instituto Brasileiro de Direito do Agronegócio), Renato Buranello, concordou que as tradings, assim como as instituições financeiras, estão “abertas” a renegociações. “Remédio da RJ é amargo, caro, longo, complexo e de resultado incerto”, disse.
Ele pontuou que os credores querem o produtor “vivo”, mas que ele seja eficiente, transparente e que tenha governança, para que todos os agentes possam continuar alimentando o ciclo de crédito e investimento.
Entre os fatores que estão por trás das dificuldades financeiras do setor está a quebra da safra brasileira de soja 2023/24, em especial em Estados do Centro-Oeste, como o Mato Grosso, por conta do tempo quente e seco que afetou as lavouras.
O Imea (Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária) estimou uma queda de 15,7% na colheita de soja do maior produtor brasileiro em relação ao ciclo anterior, para 38,4 milhões de toneladas.
Aventuras e abusos
Os produtores rurais que mais solicitaram recuperação judicial no ano passado foram aqueles que tinham maiores áreas com plantio de soja, enquanto o Mato Grosso, que sofreu os piores efeitos da quebra de safra, foi o Estado com o maior número de pedidos, segundo dados da Serasa.
Em fevereiro, a Anec (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais) afirmou ver com preocupação o aumento dos pedidos de recuperação judicial de agricultores no país, acrescentando que a situação pode comprometer a execução de contratos de grãos.
Segundo o diretor da Abiove, a indústria não desconhece o direito do produtor rural ao instituto da recuperação judicial. Mas ele destacou que é preciso “blindar” o instrumento de “aventuras e abusos recuperacionais, o que nós temos visto em demasia neste momento”.
Segundo Miranda, efeitos climáticos fazem parte do risco do negócio, e não deveriam ser utilizados como razão para processos de recuperação judicial.
“Há preocupação grande setorial no sentido de boa parte das recuperações estarem lastreadas em casos fortuitos ou de força maior”, declarou ele.
Ele defendeu que o setor já conta com tecnologias que poderiam entregar previsões climáticas que poderiam minimizar os riscos de safra.
“Defendemos que a recuperação judicial só deve ser deferida nos casos estritamente em que a legislação está sendo atendida…”, disse ele, ressaltando que a dificuldade financeira do produtor precisaria estar devidamente comprovada para a concessão da RJ.
Ele afirmou também que é necessário que a avaliação da concessão da recuperação judicial observe os outros impactados na cadeia, como os credores que muitas vezes integram a cadeia produtiva.
“Os credores têm sistemas creditício e trabalhista que poderão ser impactados por esse possível deferimento de recuperação judicial utilizado por alguns de forma abusiva ou aventureira, com objetivo de proteger uma situação patrimonial…”, comentou.
Ele lembrou ainda que a legislação e a jurisprudência preveem a proteção da Cédula de Produto Rural (CPR) — título emitido por produtores representativo da entrega futura do produto — de movimentos de recuperação judicial.
Miranda afirmou que a jurisprudência indica que deve ser cumprida a obrigação da entrega dos grãos no seu vencimento, “o que faz com que se impeça a quebra da cadeia do agronegócio”.
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