Um Abilio Diniz sereno, bem-humorado e, conforme definição do próprio, feliz. Foi esse empresário que Forbes Brasil encontrou, na manhã de 8 de dezembro, na sede da BRF, companhia cujo conselho de administração é presidido por ele há exatos 20 meses e que o tem como um dos principais acionistas individuais, com 4% das ações. Sem resquício algum da tensão vivida no período de embate com o Casino pelo controle do Grupo Pão de Açúcar, Diniz é a própria imagem de quem deu a volta por cima.
Hoje, mais do que o 15º indivíduo mais abastado do Brasil, com uma fortuna de quase R$ 9 bilhões, é o principal responsável pela transformação da BRF, a sétima maior companhia de alimentos do mundo. De 9 de abril de 2013, data em que foi nomeado para o comando do conselho da BRF, até o dia do encontro com a revista, a ação da BRF saltou de R$ 45,80 para R$ 62,90, e seu valor de mercado passou de R$ 39,2 bilhões para R$ 54 bilhões, segundo cálculos da consultoria Economática.
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O sonho da alta cúpula da empresa é chegar a um valuation de R$ 80 bilhões e transformar a BRF em uma companhia global, com produção em várias regiões do mundo, ao invés de ser apenas uma grande exportadora. Essa ambição combinada à reestruturação transformaram a BRF na maior promessa do país em 2015, dentre empresas com governança corporativa de todos os setores, segundo levantamento de Forbes Brasil com fontes do mercado.
E o mercado, até o momento, tem respondido positivamente às mudanças culturais e organizacionais propostas por Diniz, que trocou presidente, vice-presidentes, aproximou os conselheiros do management, acelerou o passo das tomadas de decisões e, por fim, trouxe mais musculatura à companhia. “A BRF estava acomodada, pouco ambiciosa e estagnada, principalmente após o bloqueio do Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica], que aprovou a fusão entre Sadia e Perdigão com restrições. O que eu fiz foi pôr fim a um ciclo e buscar trazer uma nova agressividade e ambição, com metas altas, o desejo de ser referência mundial. Não basta ser good, tem que ser great. Menos desculpas e mais ações. No meu vocabulário não existe a frase ‘não dá para ser bom em tudo’. Nós procuramos ser bons em tudo”, explica Diniz.
No mercado interno – a maior fatia da receita da BRF –, o empresário diz que medidas foram tomadas para “desentortar” a companhia que produzia primeiro, antes de entender o que desejava o consumidor, para depois colocar a equipe para vender. Hoje, ele garante que o caminho é o oposto e que a cadeia ficou mais previsível. Só que, para mudar, Abilio teve que trazer braços para reestruturar a companhia e criar um novo modelo de gestão.
Dois nomes estão diretamente ligados a essas mudanças. O primeiro é o de Claudio Galeazzi, conhecido no mercado como “mãos de tesoura ” – embora ele considere o apelido injusto – por promover processos de reestruturação em grandes companhias como Artex, Mococa, Vila Romana, Cecrisa, Lojas Americanas e Grupo Pão de Açúcar.
Braço direito de Diniz há anos, Galeazzi deixa a presidência da BRF em 31 de dezembro e libera o assento para o jovem prodígio Pedro Faria, que assume em janeiro como CEO global da BRF. O outrora presidente-executivo da gestora de investimentos Tarpon, detentora de 10,5% das ações da BRF, recebe fartos elogios. “Ele é incrível, é mais do que um ponto fora da curva”, define Diniz.
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Com 38 anos de diferença, Faria e Diniz parecem unha e carne, aproximação que teve início assim que o jovem deixou sua posição na Tarpon e um assento no conselho da BRF para assumir como presidente das operações internacionais da companhia. “Esse blend é espetacular, mesmo porque em termos de energia, atividade e cabeça, graças a Deus, acho que temos a mesma idade. O Pedro cresce muito na sua maturidade e eu me igualo a ele na energia e na juventude”, diz o empresário.
Faria, por sua vez, fala de sonho e ambição para colocar a empresa em rota de crescimento. “A BRF é uma companhia sem paralelos no mundo, com ativos e marcas irreplicáveis, que está mudando. Agora, o conselho não é mais distante e a companhia tem a cara do dono [ele se refere a funcionários e acionistas]. Todos os níveis hierárquicos foram encurtados. Entre o CEO e o chão de fábrica haviam cinco níveis. Agora, são só três. A BRF está tomando gosto por ganhar, está criando uma alma vencedora”, define Faria, com um raciocínio e uma ambição que inevitavelmente lembram Diniz.
Os dois se conheceram em meados de 2012, quando José Carlos Magalhães Neto (o Zeca), chairman da Tarpon, convenceu o empresário a migrar do varejo para a indústria. Naquela época, vale lembrar, a “era Abilio Diniz” chegava ao fim no Grupo Pão de Açúcar. O convite surpreendeu o empresário, naquele momento desestimulado. Mas afeito a desafios, como bom esportista que malha duas horas e meia por dia e mantém os mesmos 75 quilos de sempre sobre 1,80 metro, Diniz resolveu provar a vida do outro lado do balcão – de varejista para fornecedor.
A BRF trouxe de volta o desejo do empresário de competir, mas, principalmente, de vencer. “Eu digo que o Zeca foi um mensageiro”, conta o empresário, um notório católico que reza matutinamente às 6h, enquanto faz esteira no escuro. “Faço minhas preces e tanto agradeço quanto peço. A proporção é meio a meio. O meu pedido é que Ele sempre me proteja, a mim e a minha família, e me dê saúde. O resto vou atrás.”
Há mais de dez anos longe de cargos executivos, Diniz passou a dividir seu tempo entre conselhos de administração, aulas como professor do PEC (Programa de Educação Continuada) da FGV-SP, e a Península, holding de investimentos da família que tem, por exemplo, ações da Anima, detentora da Universidade São Judas Tadeu.
Regressar a um grupo de peso, como é o caso da BRF, trouxe fôlego novo a sua vida. E também novos aprendizados. A começar pela troca constante que tem com Faria, afeito ao estilo low-profile. Não gosta de aparecer e evita fotos a todo custo. Só aceitou fazer uma para Forbes Brasil após incentivo de seu mentor.
Aliás, ele tem características que lembram um Abilio mais jovem. “Nós não gostamos de perder jogo, não lidamos bem com a derrota. Tem duas pessoas aqui que pagam alguns milhões para não entrar em briga, mas pagam alguns bilhões para não sair da briga. A não ser como vencedor”, afirma o jovem executivo que passou o último ano viajando pelo mundo para conhecer as fábricas e escritórios da BRF no exterior. Nesse período, fechou duas unidades industriais na Argentina e eliminou 1,5 mil vagas de um total de 5 mil no exterior.
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Essas mudanças fazem parte da estratégia da dupla para o futuro da BRF. O plano é mudar a imagem que a BRF tem de exportadora para produtora internacional de alimentos, de forma a ganhar status de companhia global – a partir de projetos ambiciosos como a recente abertura da fábrica em Abu Dhabi, a maior de processados do Oriente Médio.
Um ano após o lançamento da pedra fundamental, a companhia brasileira planeja atender todos os Emirados Árabes e países vizinhos com suas aves e alimentos industrializados. A marca Sadia já atua na região há 45 anos e é uma das líderes de mercado. Já a Perdigão, lá fora conhecida como Perdix, também é vendida há anos na região. Com a fábrica local, a ideia é ganhar ainda mais escala e incrementar a rentabilidade, sem tantos atravessadores e problemas com a volatilidade cambial.
Uma fonte de Forbes Brasil próxima da alta cúpula da BRF antecipou os planos da companhia de abrir uma fábrica em Cingapura, nos mesmos moldes de Abu Dhabi, para produzir localmente alimentos industrializados para atender todo o mercado asiático. Faria evita falar do assunto, mas diz que o modelo de Abu Dhabi é altamente replicável e que Cingapura é um dos lugares mais atrativos para receber investimentos, com capacidade para atender toda a Ásia. Anúncio da fábrica em 2015? “Pode ser”, diz o CEO.
Em maio de 2015, o mandato de Diniz como presidente do conselho da BRF chega ao fim, mas o empresário deve se manter no assento. “Isso se os acionistas quiserem, claro”, brinca. Ele diz que considera que sua grande tarefa na BRF já foi feita. “Claro que vou continuar fazendo o melhor, mas agora considero que a BRF está pronta para a próxima fase, na qual o Pedro assume como CEO global em janeiro. Se antes a BRF saltava 1,20 metro, agora ela está pronta para bater recorde mundial. É como treinar um atleta. Você o prepara e depois o solta na competição. E nós preparamos a BRF para soltá-la na competição”, conclui Diniz.
*A reportagem acima foi lançada na 27º edição da Forbes Brasil.
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