Um escritório maior. Talvez uma casa. Uma apresentação mais robusta no Power Point. Metas de vendas muito claras. Um planejamento para cinco anos. E muitos outros “você tem que ter”, eu ouvi ao longo desses oito anos desde que decidi trocar a ilusão da estabilidade como funcionária pelo evidente risco de empreender.
Sorte a minha que já tinha aprendido a máxima, hoje bem popularizada, que “ninguém tem que nada”. Já havia percebido na prática que para uma empresa que presta serviço só uma coisa é imperativa: ter cliente. O resto é adiável, adaptável, negociável.
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Eu só deixei a redação em que trabalhava e ativei o CNPJ do Atelier quando um cliente disse “sim, proposta aceita”. Até então, eu já tinha comprado o domínio atelierdeconteudo.com.br, feito uma lista de possíveis serviços no bloco de notas do celular, validado ideias com pessoas que eu admirava, rascunhado um texto de apresentação do negócio e uma logomarca, mas só. Nada concreto. Nada estruturado. Eram mais ideias soltas do que planos bem pensados.
Foi assim que eu conquistei quatro projetos em um mês, muito antes de ter uma apresentação institucional. O segredo, alguém me soprou entre aquele monte de conselhos, é manter o simples. Gerir o caixa com duas colunas — entrada e saídas — e com a sabedoria de não gastar mais do que ganha. Falar sempre o que acredito para não precisar ficar memorizando discursos escritos. E o mais importante: ser confiável para parecer confiável. Isso tem a ver com só vender como consequência, para quem realmente precisa dos serviços e se dá conta disso numa conversa nada transacional.
À medida que o negócio foi crescendo, ampliando, que os serviços começaram a se diversificar, que o dinheiro começou a sobrar no caixa, que se fez necessário ter mais gente junto para entregar o que foi vendido, aí, sim, organizamos a casa. Mas, veja bem, organizamos o que passou a existir. O que agora estava na nossa frente, não eram mais sonhos, conjecturas, planejamentos, ideias. E, à medida que o negócio cresce mais e mais, podemos até planejar, almejar, estimar. Afinal, temos histórico, experiências e faz sentido estruturar o porvir. Uma questão de honrar o que está dando certo.
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E se o propósito for… trabalhar?
Para mim, uma das coisas mais difíceis da postura que escolhi adotar foi ter de lidar com um certo tédio que acomete de tempos em tempos. Meses mais parados. Propostas que acabam não fechando. Caixa sem sobras. Métodos de gestão pé no chão. Dá uma vontade louca de olhar para o horizonte e focar numa ideia mirabolante que pode mudar o jogo. Tudo bem dedicar algum tempo a isso, porque às vezes dá certo.
Mas não dá para tirar atenção do que é real hoje. Não para mim, que não sonhei ter um unicórnio. Sonhei, sim, ter um negócio que fizesse sentido — para mim, para quem embarca comigo e para o mundo — e ser feliz, íntegra e dedicada durante o processo. É preciso cuidar, com disciplina e carinho. Como qualquer relação de longo prazo. Precisa regar e alimentar. É o cultivar que torna belo o jardim.
Outra dificuldade de não passar os dias correndo atrás do pote de ouro é enxergar o momento de arriscar mais, de persistir ou de parar. Muitos negócios afundam porque as pessoas sempre acreditam que “agora vai”. De que é preciso gastar só mais um pouco para começar a colher. É mais sedutor acreditar que, mesmo com o caixa minguando, o certo agora é fazer um investimento novo, apostar num caminho grande, inusitado, capaz de levar o negócio a outro patamar. Pode até ser, mas também pode não ser. Tem horas que o mais arrojado que podemos fazer é silenciar, parar e, por que não?, encolher para continuar consistente.
Crescer, nem sempre, significa ganhar mais dinheiro no curto prazo. Significa também amadurecer, ter clientes mais alinhados ao propósito e cultura da empresa, ter profissionais mais preparados na equipe, controles mais eficazes e outros indicadores que às vezes exigem serenidade, paciência, calma. Nesses oito anos empreendendo, tem valido a pena seguir o passo constante, sem me preocupar demais com as tempestades nem me deixar cegar pelos dias de sol. A escolha é seguir em frente e aproveitar a oportunidade da vez — seja ela qual for — para conhecer melhor o próprio negócio e evoluir.
Ariane Abdallah é jornalista, autora do livro “De um gole só – a história da Ambev e a criação da maior cervejaria do mundo” e fundadora do Atelier de Conteúdo, empresa especializada na produção de livros, artigos e estudos de cultura organizacional.
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