O Ozempic viralizou. O crescimento das buscas pelo remédio, só neste primeiro semestre de 2023, cresceu 91%, o que indica um salto estupendo no uso desse remédio.
O medicamento injetável, originalmente inventado para o controle do diabetes, passou a ser usado off-label para a perda de peso, porque é capaz de nos manter saciados, além de atuar nos centros da fome, diminuindo o desejo por comida.
O que esses números podem nos ensinar? Primeiro, que a conversa sobre a obesidade permeia a sociedade. Em um mundo dominado pelas redes sociais, em que peso é tudo, a gordofobia ganhou destaque. Tanto, que algumas empresas preferem não contratar candidatos obesos.
Segundo, que todo mundo parece querer uma solução mágica para o seu problema; de preferência, que não envolva trabalho.
O Ozempic não cura obesidade, e muito menos excesso de peso. Muitas pessoas que usam a droga de fato perdem muitos quilos, mas o que aconteceria se o remédio saísse do mercado ou elas parassem de tomá-lo? Assim como a imensa maioria dos que fazem dietas, provavelmente ganhariam tudo de volta.
Muita gente passa a vida buscando curas milagrosas, porque realmente é difícil mudar nossos hábitos. Quando isso envolve deixar o sedentarismo para trás e rever o que se coloca no prato, é ainda mais difícil. Assim como é um caminho mais demorado parar para entender por que quase sempre descontamos no álcool e na comida o turbilhão de emoções que nos atinge dia após dia.
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O segredo do emagrecimento sustentável não tem segredo nenhum: basta gastar mais calorias do que se ingere. Como se faz isso? Combinando a prática de exercício físico com reeducação alimentar.
É aí que entra a vontade de acelerar o processo: trocar velhas rotinas por novas não é algo que se consegue da noite para o dia. É preciso paciência, disciplina e muito esforço para desconstruir hábitos que provavelmente foram construídos – e solidificados – ao longo da vida.
A lição do Ozempic se aplica a outros medicamentos. Vejo isso todos os dias no meu consultório. Cito um exemplo: é mais fácil pedir ao médico um indutor do sono do que buscar a raiz do problema para dormir, que pode estar em uma depressão. Também é mais rápido tomar uma pílula do que praticar a higiene do sono antes de ir para a cama.
Mas não há outro jeito, se a ideia é transformar os seus hábitos: é preciso encarar um percurso que virá com resistência, vontade de jogar tudo para o alto, frustração. Porém, apesar dos percalços, este mesmo percurso vai, aos poucos, trazer transformações positivas. E com elas vêm melhora da autoestima, da confiança, da animação, da qualidade de vida, da disposição.
A verdadeira prisão não é controlar os nossos impulsos de comer e a nossa vontade de continuar sedentário, mas ser controlado por eles.
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
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