Quando chegou, há 12 anos, o escritório do LinkedIn no Brasil era pouco mais que “uma salinha e uma mesa” em São Paulo, conta Milton Beck, diretor-geral do LinkedIn para a América Latina e África. “Sou o funcionário mais antigo da empresa”, diz. Hoje, ele mostra com orgulho os três andares (quase vazios, por conta do trabalho híbrido).
São 6 mil metros quadrados novinhos em folha, com sala de ginástica, massagem, refeitório, auditório, cafés. E quase nenhuma parede. “O escritório ficou pronto quando começou a pandemia. Então ficamos com espaço de sobra”, diz, caminhando pelo prédio, localizado na Marginal Pinheiros, em São Paulo.
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Aqui, Beck fala de sua visão sobre networking, a participação da Geração Z e os negócios gerados dentro da plataforma usada por 67 milhões de brasileiros – o terceiro maior público global, depois de Estados Unidos e Índia. No mundo, são 960 milhões de usuários.
Forbes: As últimas tendências do mundo corporativo, como o quiet quitting ou lazy girl job, nasceram em outras plataformas, como o TikTok, se espalharam no Instagram para depois serem discutidas no LinkedIn. Vocês têm vontade de serem um pouco mais lúdicos como as redes onde nascem essas trends?
Milton Beck: Se você gosta de comida de rua indiana, você pode ficar horas no TikTok vendo posts sobre isso. Você vai se entreter, mas não acrescentar muita coisa em termos de desenvolvimento de carreira. Nossa missão é diferente. Temos 20 mil cursos que funcionam como trilhas de conhecimento disponíveis para que as pessoas se desenvolvam em suas áreas. São treinamentos rápidos de 3 ou 5 minutos porque eu sei que as pessoas não têm paciência para vídeos longos. Por exemplo, recentemente fizemos um evento em Nova York em que o entrevistado foi o Spike Lee. Não é exatamente o nome que você imaginaria para fazer uma apresentação de mundo de trabalho, mas ele traz uma visão diferente, é uma sumidade do cinema. Não chega a ser entretenimento, mas não precisa ser chato. Pode ser interessante.
F: Hoje, os CEOs precisam estar no LinkedIn. Mas no começo não era assim. O que vocês fizeram para mudar?
MB: Eles achavam que estariam se expondo, porque a visão era de que era uma vitrine para outras empresas, coisa de quem estava buscando emprego. Então usávamos o exemplo dos Estados Unidos. O Bill Gates não estava procurando emprego. E aí os usuários começaram a crescer a uma taxa de 100 mil novos usuários por semana a partir de 2012. A gente passou de 5 milhões para 67 milhões, que é o número atual de usuários e coloca o Brasil em terceiro lugar no ranking, depois de Estados Unidos e Índia. São 960 milhões de usuários no mundo.
Hoje, isso mudou. Recebo muitos presidentes de empresas aqui que querem saber como serem mais ouvidos. O interesse é ter mais visibilidade, até mais seguidores. É uma mistura do pessoal com o corporativo porque, na medida que têm uma voz ativa, é bom pra eles como profissionais, mas também ajuda a empresa a aparecer.
F: Os CEOs vêm aqui fazer negócios. Quais os principais negócios hoje com o LinkedIn?
MB: A maior parte das grandes empresas brasileiras são clientes nossos. A maioria das empresas hoje usa nossa rede para recrutar, outras querem fazer publicidade online e uma terceira parcela a gente ajuda a buscar seus clientes usando ferramentas para vendedores. Temos uma receita grande de publicidade com empresas querendo se conectar entre si.
F: E quando falamos da Geração Z, que tem outras redes que podem ser mais atraentes?
MB: Dos 67 milhões de usuários que a gente tem, 35% são da Geração Z, que corresponde a 20% da população brasileira. Nossa parcela é maior do que a proporção do país. Obviamente, quando se fala dos jovens, o LinkedIn não é a primeira rede que vem à cabeça, mas à medida que eles vão entrando no mercado de trabalho, automaticamente entram para o LinkedIn. Na hora em que minha filha entrou no mercado de trabalho, viu os pares, o chefe no LinkedIn e descobriu que foi contratada com base no seu perfil, desnecessário falar da importância.
F: Eles publicam de um jeito diferente do que os outros profissionais?
MB: No LinkedIn, diferentemente de outras plataformas, os perfis são verdadeiros, trata-se de pessoas reais. É uma pessoa de verdade, com o nome, sua foto, sua faculdade. Aí você tem que ter um nível de formalidade um pouco maior. Não há uma diferença grande do que eles escrevem em outras redes, mas no formato.
F: Mas o LinkedIn pode ser um pouco frustrante para eles, comparando com outras redes que têm recompensas mais imediatas…
MB: Olha, eu tenho 50 mil seguidores no LinkedIn. Para a plataforma, estou bem posicionado. Nas outras plataformas, são milhões e milhões. E acho que a diferença começa por aí, nos números. É outra dinâmica. Aqui, a recompensa não é o like. É natural que você olhe compartilhamentos como uma das formas de recompensa, mas eu quero mesmo é saber quem está olhando. De quais empresas, qual nível de senioridade, etc. Exemplo: o Fábio Porchat veio aqui outro dia. O Fábio tem 6 milhões de seguidores no Instagram. No LinkedIn, ele tem 3 mil, mas agora isso passa a ser importante para ele. Porque as pessoas querem ver o Fábio no LinkedIn. Como ele desenvolve a carreira, como é ser humorista e tocar uma empresa como o Portas dos Fundos ao mesmo tempo… Ele quer ter essa visibilidade dentro do mundo corporativo. Na minha visão, talvez isso possa ajudar a conseguir um patrocínio, parcerias com empresas e por aí vai.
F: Voltando um pouco na participação maior dos CEOs hoje, você acha que dá para separar CPF e CNPJ? Até que ponto esses executivos e executivas podem postar o que pensam sobre negócios ou mercado, para além do que a empresa segue?
MB: Cada empresa tem as suas políticas. Então, mesmo que o perfil seja meu, não quer dizer que eu possa escrever sobre qualquer assunto. Eu não tenho que ter opinião sobre tudo e não é tudo que eu devo expor na plataforma. É claro que tem uma ligação entre o meu CPF e o CNPJ da empresa, principalmente quando falamos de cargos mais altos e você é visto como porta-voz. Mas ao mesmo tempo, tenho meus valores e as coisas nas quais eu acredito e sobre as quais eu vou falar e expor, como a pauta da diversidade. O que alguns grupos consideram extremamente ofensivo, como o casamento entre pessoas e mesmo sexo, eu acho que tem que falar. Eu já trouxe minha posição sobre esse assunto, sobre a importância dele, mesmo que alguns grupos achem uma aberração.
E, ao mesmo tempo, eu sei que o LinkedIn está alinhado com esses valores. Se eu fosse trabalhar em uma empresa extremamente conservadora, eu não duraria um mês. Da mesma forma, quando você está trabalhando na empresa e vê posts racistas ou que você acha preconceituosos, isso acaba tendo impacto sobre sua decisão de continuar ali. Ou não.
F: Quais foram as maiores dificuldadesna chegada do LinkedIn ao Brasil?
MB: A gente tinha cinco milhões de usuários e, nessa época, o LinkedIn era usado, basicamente, por quem estava no meio da pirâmide organizacional. A base da pirâmide não via valor nenhum. E o pessoal do topo achava que não era bacana ter o nome no LinkedIn porque era coisa de quem estava procurando emprego. Então nosso objetivo em 2012 era mostrar que o LinkedIn não era assim.
F: O assédio no LinkedIn se transformou em um problema para as mulheres que usam a plataforma. A maioria já sofreu com algum tipo de abordagem inadequada ali. Como vocês lidam com isso?
MB: A gente tem políticas bem rígidas, então quando alguém faz alguma coisa errada no LinkedIn, indicamos que as pessoas devem denunciar. E tem muita gente que foi banida da plataforma. Essas políticas não servem só para assédio. Qualquer lugar tem mau uso, o importante é ter mecanismos de coibir isso. Usamos também Inteligência Artificial e temos equipes que fazem essa curadoria e respondem a problemas como esse. A gente tem que educar e, quando a educação não é suficiente para resolver o problema, a gente tem os métodos mais duros, como o banimento e a suspensão.
F: Você falou da Inteligência Artificial. Como ela está sendo usada pelo LinkedIn?
MB: Entre as nossas ferramentas, já tem muita coisa que envolve inteligência artificial para fazer com que as os produtos funcionem melhor. Desde pessoas que você deveria conhecer quando você entra no seu perfil, vagas que podem ser do seu interesse, ferramentas para o recrutador contratar uma pessoa… Também tem muito ChatGPT envolvido.
Na hora de montar trilhas de desenvolvimento, também se usa IA. Se você quer se desenvolver para chegar ao próximo nível na sua carreira, o LinkedIn te ajuda a trilhar esse caminho com as ferramentas de treinamento. E tem uma parte de gamificação, porque você faz o treinamento e interage com outras pessoas no mesmo momento, você mostra seu diploma para a sua comunidade, tem recompensas…
F: Por que você deixa seu perfil fechado para novas conexões, restrito apenas a quem tem seu e-mail? É uma estratégia?
MB: É que eu recebo tantos convites… Eu quero me conectar com pessoas que têm alguma relevância para mim, ou na minha indústria ou no meu cargo. E eu tenho que ter um certo nível de interação, considerando relações virtuais e do mundo físico. Senão meu feed não vai entregar o que eu quero ver. Então tem que ter algo a ver comigo, com os mercados e empresas que me interessam e são relevantes pra mim.
F: E como você faz networking?
MB: É algo que tem que ser trabalhado ao longo da carreira e não apenas quando você perde o emprego. Networking é ir e vir, troca. Eu dou algo e você me dá, eu compartilho informações, a gente conversa, etc. Não adianta ligar só quando precisa de alguma coisa. Do meu ponto de vista, não precisa ser, necessariamente, só quem conheço pessoalmente, porque uma coisa não substitui a outra, mas também tem que ter. É algo que eu incentivo nas equipes daqui, interagir pessoalmente. Porque, depois da pandemia, a gente começou a fazer muita videoconferência, né? Mas quando você encontra pessoalmente, tem outro nível de interação.
Também posto com regularidade, quatro vezes por semana. Não consigo responder todo mundo, sendo muito sincero… E sei que existem níveis de relacionamento e interação. Tem as pessoas com quem eu falo semanalmente, as que estão conectadas, mas não vejo tanto e aqueles que eu vejo uma vez por ano.
O post “Aqui, a recompensa não é o like”, diz Milton Beck, diretor-geral do LinkedIn apareceu primeiro em Forbes Brasil.