Praticamente todos os dias, lemos notícias sobre o bom desempenho do agronegócio, sobre as previsões de safra recorde (como acontece em 2023), sobre como a tecnologia vem ajudando os empresários rurais a produzir mais e mais.
Essas notícias nos dão conta de quão importante o agro é para a economia brasileira. Por conta disso, fala-se muito do sucesso dos empresários do campo. Quero chamar a atenção, entretanto, para o fato de que fala-se muito pouco sobre a saúde mental desses homens de negócio.
Por quê? É possível que uma parcela da população, majoritariamente vivendo em cidades, ainda tenha a imagem de que estresse, burnout e distúrbios do sono são problemas exclusivos de quem vive em grandes centros urbanos.
É uma ideia equivocada. A empresa rural, assim como a urbana, tem metas; porém, com a desvantagem de ser uma empresa a céu aberto, segundo ouvi de um empresário. Isso quer dizer que esses executivos têm de dar conta de algo mais: a imprevisibilidade, os humores do tempo que, ano após ano, anda mais mal-humorado. Baixos resultados de uma safra, ou doença que afete o rebanho, podem levar a enormes perdas econômicas, gerando impacto sobre a saúde mental.
O agronegócio, que hoje se volta grandemente à exportação, também está exposto à volatidade do mercado, que pode afetar para baixo ou para cima o preço dos produtos.
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Podemos somar a isso o fato de esse modelo de negócio ter se sofisticado de tal forma que o empresário tem de vestir inúmeros chapéus de responsabilidade ao longo do dia: tem de se envolver em questões administrativas, entender de macroeconomia e de relações internacionais, de direito e até de psicologia, para poder atender da melhor forma a sua força de trabalho.
Altas lideranças de grandes empresas, estejam elas em capitais ou no campo, têm de gerir centenas, às vezes milhares de colaboradores, têm de formar médias lideranças, têm de se atualizar permanentemente e têm de responder eles mesmos às questões de saúde mental de seus empregados.
Assim como no ambiente urbano, o trabalhador do campo tem se mostrado vulnerável à depressão, suicídio e outros problemas de saúde mental. E como líderes, esses gestores e gestoras têm tido o desafio de buscar meios e ferramentas para enfrentar essa questão e dar suporte aos que precisam dele.
Esses empreendedores, assim como os altos executivos urbanos, são seres solitários. Mais solitários ainda porque uma boa parcela deles vive parte do ano afastada de suas famílias, que moram em grandes capitais do sul-sudeste-nordeste.
Todas essas demandas altíssimas cobram um preço da saúde mental: depressão, ansiedade, abuso do álcool, problemas com o sono e com a alimentação são frequentes entre essas altas lideranças. Por isso, precisamos falar mais, discutir mais, estar atentos e sobretudo cuidar da saúde mental desses homens e mulheres que impulsionam a economia brasileira e trabalham para que a comida chegue no seu prato.
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
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