Talvez a melhor campanha de marketing de uma montadora seja manter determinado modelo em linha por gerações. Ainda que evolua técnica, dinâmica e esteticamente, o veterano tem a missão de imortalizar o conceito original de décadas atrás. Exemplo mais icônico é o Porsche 911. Depois vem o Land Rover Defender.
Relembre modelos que marcaram história do Defender:
Aos 75 anos, o jipe que nasceu do sonho de um engenheiro de criar um Willys Jeep inglês resistiu à reconfiguração que culminou na JLR ascendendo à condição de marca em si – justamente no auge da carreira.
Porque nenhum ouro carro (exceto o esportivo alemão) soube rejuvenescer tão fiel às características primárias com um sotaque tão atemporal. Difícil imaginar outra modernização possível senão a que o chefão do design da empresa, Gerry McGovern, impôs ao Defender.
Uma rara combinação de luxo, funcionalidade, robustez e praticidade costuradas harmonicamente e sem afetação dão o tom no interior. É rústico e requintado ao mesmo tempo.
O motor D300, um 3.0 de seis cilindros em linha que gera 300 cv e 66 kgfm de torque, é soberbo: além de garantir a um carro de 2,3 toneladas e quase 2 metros de altura aceleração até os 100 km/h em 6,7 segundos, é tão suave e silencioso que nem parece a diesel, tipicamente uma máquina trepidante e barulhenta. Graças à tecnologia híbrida (leve) é possível chegar a ótimos 8,7 km/l de média.
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Mais charmosa, dinâmica e prática no uso urbano, a versão 90 não é indicada para quem tem filhos. Uma viagem que demande mais de uma mala exige acomodar a bagagem na cabine, o que não é bom para a segurança dos ocupantes. Isso por que seus 4,32 m de comprimento (sem considerar o estepe pendurado na tampa) não deixam muito espaço para o porta-malas, de apenas 297 litros (padrão VDA de medição).
Nesse caso, melhor partir para as versões 110 (786 litros) ou 130 (1.094 litros), essa a mais indicada para quem precisa de um carro de sete lugares que não abra mão do porta-malas. Não haverá perda de desempenho ou piora no consumo.
Ocorre, contudo, que nunca foi preciso desembolsar tanto por um Defender: o 90 parte de R$ 664.950, enquanto o 110 começa em R$ 716.950 e o 130, em R$ 816.550 – esta última equipada com um V8 de 525 cv e 63,7 kgfm de torque.
Jeep inglês
Setenta e seis anos depois de Maurice Wilks esboçar como deveria ser o novo carro dos fazendeiros britânicos, a Land Rover apresenta o futuro da marca que nasceu junto com o Série I
No início dos anos 1930, os irmãos Maurice (1904-1963) e Spencer Wilks (1891-1971) chegaram à Rover como, respectivamente, engenheiro-chefe e diretor-geral, e se tornaram personagens principais na história da companhia britânica.
Fundada em 1978, a Rover foi uma fabricante inglesa que começou fazendo bicicletas, passou por motocicletas e depois se concentrou em carros. Fez até um elétrico, em 1988, que não passou de um protótipo. O primeiro automóvel de produção, o Rover 8HP, veio em 1904. Partindo de 200 libras, tornou-se o carro mais vendido da Inglaterra.
No entanto, era um Willys Jeep – o veículo militar que os EUA encomendaram para combater os nazistas na Segunda Guerra Mundial – que Maurice usava em sua propriedade na ilha de Anglesey. Em 1947, os dois irmãos caminhavam pela praia de Red Wharf Bay e Maurice desenhou, na areia, como deveria ser um utilitário que acrescentasse versatilidade à robustez e valentia do seu Willys para uso também urbano. Naquela ilha do País de Gales, Wilks rabiscou com as mãos o “farmer’s friend”.
A estreia foi no ano seguinte, durante o Salão do Automóvel de Amsterdã.
Décadas depois, a Land Rover reúne jornalistas em um hotel paradisíaco no México para explicar o futuro da marca – que a partir de agora deixa de ser marca.
Naquele ambiente rústico de Paradero Todos Santos, cujas diárias podem chegar a R$ 5 mil, a mensagem é clara: donos de Defender combinam com um estilo de vida mais minimalista e conectado à natureza, sem abrir mão de conforto e privacidade. São distintos daqueles que têm na garagem um Range Rover, mais afeitos ao tipo de luxo oferecido por um Waldorf Astoria ou um Rosewood.
Daí a reconfiguração bem no aniversário de 75 anos: Defender, Discovery e Range Rover representam conceitos distintos; portanto, foram alçados a marcas independentes – todas, além da Jaguar, sob a sigla JLR, a nova identidade corporativa da Jaguar Land Rover.
“Este é o próximo capítulo de nossa jornada Reimagine para se tornar um negócio de luxo verdadeiramente moderno. A nova identidade da JLR trará clareza aos nossos clientes e atuará como um unificador para nossas quatro marcas britânicas distintas”, explica Gerry McGovern, chief creative officer da JLR.
Por “Reimagine” entenda-se a ambição da empresa de não emitir carbono em toda a cadeia de suprimentos, produtos e operações até 2039.
BMW, Ford e Tata
O que soou chocante no universo automotivo nem é tão inédito assim. Nascida como uma divisão de veículos off-road da Rover, a Land Rover experimentou algumas mudanças de rumo ao longo de seus 75 anos.
Em 1967, Leyland Motors Corporation comprou a Rover e, após a fusão com a British Motor Holdings no ano seguinte, criou-se a British Leyland. Os problemas financeiros persistiram, mas a marca Land Rover seguia bem: é nessa fase que surgem sucessos, como o Range Rover.
Quase 20 anos depois, a British Leyland se converteu no Rover Group, que em 1988 foi absorvido pela British Aerospace – uma empresa capaz de produzir algo espetacular como o Concorde, mas não de lucrar com marcas de carro.
Parecia que, enfim, a Land Rover teria mais sossego sob o domínio da BMW, a partir de 1994: Range Rover e Discovery avançaram à segunda geração mais luxuosos e o Freelander ampliou o alcance mercadológico da empresa para categorias mais acessíveis.
Contudo, nem os alemães conseguiram fazer a Land Rover dar lucro e, em 2000, após uma disputa com a General Motors, a Ford arrematou a companhia britânica. Interessada em acessar o mercado de luxo e polir a própria imagem, a companhia americana ainda planejava dobrar ou triplicar o volume de vendas da Jaguar. O problema é que, logo em seguida, Estados Unidos e Inglaterra entraram em recessão e o segmento de luxo desmoronou.
Em 2008, a Ford vendeu as duas marcas para a Tata Motors por US$ 2,3 bilhões, aproximadamente a metade do que desembolsou oito anos antes.
Não deixa de ser irônico que agora, pertencendo a um conglomerado indiano sem tradição alguma no universo automotivo, a Land Rover esteja em sua melhor fase – talvez só um pouco mais sofisticada do que Maurice Wilks imaginou 76 anos atrás.
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