Se Luis Silva começasse a contar o início da própria história em uma festa a um grupo de desconhecidos, poderia ser difícil acreditar logo de cara que se trata do fundador de um unicórnio brasileiro. Mas basta ouvir com mais atenção para entender que a trajetória do menino humilde de Franca (SP), que aprendeu a programar sozinho por puro pavor de sair de casa, foi o combustível para a criação da Cloudwalk, cuja premissa é ampliar o acesso a serviços financeiros, através de tecnologias como a que anuncia o fim das maquininhas.
Logo depois de começar a trabalhar, sem fazer faculdade por falta de condições financeiras, Silva recebeu a proposta de se tornar sócio da software house Plano Bê, em 2005. Desde então, viveu pontos altos, incluindo o sucesso do negócio, que o tornou milionário antes dos 30 anos de idade, e a subsequente venda da empresa. Mas também enfrentou desafios, como navegar no mundo dos negócios dentro do espectro autista, um burnout e o fracasso da Arcturus Biocloud, startup de engenharia genética que fundou nos Estados Unidos.
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Depois de falir no exterior, Silva voltou para o Brasil em 2016 e tomou as rédeas da Clouldwalk, empresa que ajudou a fundar, mas até então estava envolvido como investidor. Corta para 2023 e a empresa, que captou mais de $360 milhões de fundos como Coatue, DST e Valor Capital, vale $2,15 bilhões e atende 1 milhão de empreendedores e consumidores em 5,400 cidades pelo Brasil. Hoje (11), a startup anunciou o balanço do primeiro semestre com uma receita líquida de R$ 310,4 milhões, um crescimento de 145% em relação ao mesmo período de 2022. O lucro líquido chegou a R$ 64 milhões, em um momento em que muitas startups lutam para sobreviver.
A virada de chave
O resultado positivo reflete a alta adesão ao InfiniteTap, solução que transforma smartphones em maquininhas: segundo a empresa, a base de clientes usando a tecnologia “tap to pay” cresceu em média 123% ao mês em 2023. O produto de pagamentos é o abre-alas para as diversas frentes da plataforma de serviços financeiros da empresa, como o InfiniteCash, que já distribuiu R$ 260 milhões em empréstimos e tem a meta de encerrar 2023 com R$ 380 milhões.
“Nosso objetivo sempre foi democratizar o acesso a pagamentos com preço justo, pois sabíamos que seria a porta de entrada para o nosso ecossistema de serviços financeiros. [A tese é:] uma vez que o cliente compra a maquininha, ele começa a usar o serviço da conta bancária digital e também o nosso empréstimo”, diz Silva, em entrevista à esta coluna.
Apesar de a Cloudwalk ter um parque de maquininhas que já ultrapassa meio milhão de unidades e ganhado popularidade entre comerciantes por praticar taxas de antecipação abaixo do mercado – graças ao uso de blockchain e machine learning, que contribuem para mitigar o risco de fraudes, por exemplo – a atual menina dos olhos da empresa é mesmo o InfiniteTap. A empresa estima que seus clientes terão economizado mais de R$ 580 milhões deixando de comprar maquininhas no espaço de ano desde o lançamento da tecnologia que transforma o celular em um terminal de pagamentos, em novembro do ano passado.
Aliada ao portfólio de banco digital para pequenas e médias empresas, a tecnologia posiciona a empresa como uma alternativa atraente em relação a concorrentes como PagSeguro e Nubank – que investem pesado em campanhas de TV, enquanto a Cloudwalk aposta em marketing digital e boca a boca em públicos de nicho.
“Assim como as câmeras digitais, as maquininhas vão se desmaterializar e tudo vai ficar dentro do smartphone. Para mim, esta é a grande revolução da indústria”, diz Silva. O fundador prevê que este processo de digitalização do mercado de adquirência, atualmente liderado por segmentos como varejos de moda e cosméticos, deve acontecer em cerca de cinco anos.
Também conta ponto a questão da sustentabilidade: segundo um estudo publicado pela empresa em parceria com a agência O Mundo Que Queremos com base em dados do Banco Central, foram emitidos cerca de 450 milhões de cartões de crédito e débito e produzidas 95 milhões de maquininhas no Brasil, um volume de plástico de mais de 15 mil toneladas, equivalente a 14 vezes o peso do Cristo Redentor.
No entanto, Silva diz que a desmobilização das maquininhas como as conhecemos hoje depende de alguns fatores, sendo que o principal deles é cultural. “Não é algo binário: o [cliente] não vai deixar de usar a maquininha por usar o tap to pay. É uma transição gradual”, pontua o fundador, acrescentando que o processo passa por fatores como a descoberta de que é possível usar a maquininha digital como consumidor para, por exemplo, vender um sofá usado e oferecer a opção de parcelar o pagamento.
O futuro das “maquininhas”
Ao comentar sobre como sua visão para o setor de pagamentos poderá ser aplicada em outros mercados, Silva diz que a empresa está elaborando sua estratégia de expansão internacional. “O plano sempre foi montar uma companhia global, uma rede global de pagamentos”, afirma.
Sem cravar qual será o próximo país de atuação, o fundador ressalta que mercados como os Estados Unidos têm alta demanda por liquidação instantânea de pagamentos – o que dá uma pista dos planos da startup para a terra do Tio Sam, onde concorrentes como a Stone estão listados na Nasdaq. Um IPO, aliás, está nos planos da Cloudwalk, provavelmente para 2025.
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