Consumo de ovo agora é cool, e granjas surfam onda recorde de produção

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Ovo está conectado à saudabilidade alimentar para a nova geração de consumidores

Em vez da caixinha com 12 unidades, o padrão de compras de ovos do brasileiro agora é a cartela com 30 unidades. De produto que ganhava a preferência do consumidor apenas quando os preços das carnes bovina, de frango e suína disparavam, hoje esse detalhe não mais importa: o ovo vai para a lista de compras de qualquer modo. E mais: ele já não “faz mal” para a saúde e não traz a medonha palavra colesterol estampada no imaginário popular.

Consumir ovos é cool, saudável e, para não sair do tom, está mais hype do que nunca. Ou seja, entrou na moda, nos últimos anos, levando esse setor do agronegócio a uma onda de investimentos, modernização e gestão refinada de uma cadeia produtiva que movimenta, no país, cerca de R$ 35 bilhões anualmente.

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“Houve uma desmistificação de que o ovo faz mal à saúde. O jogo não é mais com um adversário da medicina, é com um aliado. Como alimento completo, ele só perde para o leite materno”, diz Leandro Pinto, dono do Grupo Mantiqueira, com sede no Rio de Janeiro e operações em São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso e Paraná. “O ovo continua como uma proteína acessível e de qualidade à população mais carente, e atende a um espectro da população que, cada vez mais, deseja ser saudável. Isso acontece no mundo inteiro”, afirma Ricardo Faria, 47 anos, dono da Granja Faria, com sede em Florianópolis (SC) e operações também no Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul, Goiás, Espírito Santo e Tocantins.

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Galinhas poedeiras com acesso livre a piquetes externos é uma tendência de mercado

Os dois executivos, os maiores na avicultura de postura com negócios no Brasil, são um retrato da nova onda de investimentos em ovos de galinhas que valem ouro: desde 2017, o país mantém um plantel comercial de aves poedeiras acima de 100 milhões de animais. No ano passado, foram 113,9 milhões de aves alojadas, um crescimento de 25% em uma década. A produção de ovos, que era de 34 bilhões de unidades lá atrás, nos últimos anos está acima de 50 bilhões. Em 2022, a produção foi de 52 bilhões de ovos, de acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

O apetite desses empresários por aquisições também mostra um movimento de concentração do setor que deve permanecer em alta. No ano passado, a Mantiqueira anunciou a compra da Fazenda da Toca, projeto de ovos orgânicos em Itirapina (SP) de Pedro Paulo Diniz, filho do empresário Abílio Diniz, bilionário com US$ 2,6 bilhões de ativos sob gestão. Leandro Pinto tem uma atuação forte em nichos de mercado em ascensão, seguindo a receita de que “ovo não é tudo igual”. Ele trilha em seus negócios o caminho da diversificação, com ovos orgânicos, ovos de galinhas livres de gaiolas, ovos plant based, lojas próprias, e-commerce, entre outros.

Mantiqueira

Leandro Pinto, da Granja Mantiqueira, com galinhas poedeiras livres de gaiolas

Em 2022, seus negócios com avicultura – sem contar pecuária e agricultura na Mantiqueira – renderam cerca de R$ 1,5 bilhão. “O novo consumidor também trouxe uma gourmetização do ovo e tem espaço para crescer com isso”, diz Pinto, que criou até um Clube do Ovo, com entregas personalizadas a domicílio. Também deve inaugurar, ainda neste ano, o Museu do Ovo, em Lorena (SP), onde fez um investimento de R$ 100 milhões em seu projeto “happy eggs” para ter 2,5 milhões de galinhas livres de gaiolas até 2025 – hoje, a capacidade da granja é de 1 milhão de aves no sistema.

A mais recente tacada da Mantiqueira ocorreu no início de junho, quando o empresário anunciou a compra da operação de ovos da LAR Cooperativa Agroindustrial, trazendo para o seu negócio 98 famílias e 1,5 milhão de galinhas poedeiras. O modelo inédito é um desdobramento do que ele fez em 2021, quando comprou a Gralha Azul Avícola, de Francisco Beltrão (PR), mas que tinha no negócio um grupo pequeno de 30 famílias integradas.

Além do aumento da capacidade de produção, que neste ano está indo a 12 milhões de ovos diariamente, a Mantiqueira também iniciou um processo de modernização em sua gestão corporativa, uma novidade em um setor dominado por empresas familiares.

Leandro Pinto, que fundou o grupo no fim dos anos 1980, deixou a diretoria executiva e foi para o seu conselho em fevereiro. O novo CEO, e também sócio minoritário, é o administrador Márcio Utsch, 64 anos, que foi presidente da Alpargatas entre 1997 e 2019, mesmo ano em que recebeu o convite para compor o conselho da Mantiqueira, mesmo cargo que ainda mantém na Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e na rede de artigos esportivos Centauro.

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Consumidores têm comprado ovos em maiores quantidades por ida ao supermercado

Alinhado com o criador da Mantiqueira, Utsch diz que o ovo precisa ter marca. “Marca é uma promessa, e uma promessa tem de ser cumprida”, diz ele. “Por isso, o olhar para a tecnologia deve ser incansável.” Utsch tem como meta, por exemplo, a troca eletrônica de dados na cadeia de produção. Para ele, não está longe o dia em que, a cada ovo registrado como venda ao consumidor, na ponta do varejo, será acionado um dispositivo de envio de outro ovo para a gôndola, alimentando um banco de dados de gestão fina da produção. “Frescor na loja, um atributo de qualidade e de marca, também significa mais eficiência e controle de custos”, pondera o executivo.

Hoje, somente de caminhões, a empresa possui 300 veículos, que trafegam 13 mil quilômetros por mês para manter as gôndolas abastecidas. “Nós dois pensamos na mesma linha e vamos acelerar”, diz Utsch, referindo-se a Leandro Pinto. Durante a entrevista à Forbes, o executivo contou uma passagem recente que ilustra bem a sintonia da dupla à frente da Mantiqueira. “Dias atrás, em um dia de trabalho comum, estávamos no aeroporto em São Paulo às 6 da manhã, para tomar o avião da empresa. Para nós, o nosso avião seria o primeiro a decolar. Mas fomos o segundo e aí ouvi do Leandro ‘ih, tem gente que trabalha mais do que nós’. Eu só acenei com a cabeça.”

Um ovo por dia

Olhar e prever o futuro é um componente essencial na gestão dessa cadeia por uma razão muito simples. A oferta imediata é sempre inelástica devido à característica da produção. O fato é que, em média, cada galinha produz um ovo por dia, o que depende de uma boa nutrição, genética, manejo e até do clima no galinheiro, ou melhor, depende das condições climáticas. Galinhas estressadas não produzem ovos. Galinhas, na natureza, param de botar ovos quando têm acesso a menos de 12 horas de luz solar por dia. As galinhas não gostam de inverno e começam a diminuir a produção logo que entra o outono. Mas o calor excessivo do verão também provoca estresse térmico, o que prejudica o bem-estar animal dessas aves.

Com tudo isso em conta, para intensificar a produção de ovos e aumentar a oferta no mercado, é preciso ter uma quantidade predefinida de galinhas poedeiras. A estimativa é de que a produção brasileira de ovos cresça na casa de 5% em 2023, o que elevaria o volume nacional para cerca de 54,6 bilhões de unidades.

“A Granja Faria deve fechar o ano com 16 milhões de ovos produzidos por dia”, disse Ricardo Faria, no fim do mês de junho, no dia em que anunciou uma ação inédita em seu modelo de negócio. Desde que iniciou o negócio, em 2006, as 10 aquisições no setor foram totais. Mas a 11ª compra foi em um modelo inédito ao adquirir parte da Katayama Alimentos, de Guararapes (SP), então controlada pelo produtor e pecuarista Gilson Katayama.

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Ricardo Faria diz que sua missão é identificar oportunidades de consolidação

Com a compra, a estimativa de receita da Granja Faria para 2023, que era da ordem de R$ 2,6 bilhões, subiu para R$ 3 bilhões. “A Katayama agrega em torno de 12% a 13% da receita e também agrega mais ou menos o mesmo em volume de ovos”, diz o executivo. Quanto ao futuro, ele não deixa dúvidas. “Meu grande trabalho é identificar setores com oportunidades de consolidação”, afirma Faria. “Com todas as nossas aquisições, mesmo sendo líder de mercado, atingimos agora a marca de 10% do mercado brasileiro. Então, enquanto formos eficientes e tivermos capacidade de execução, vamos continuar comprando.” Faria lembra que, no fim dos anos 1990, quando atuava no setor de lavanderia industrial de roupas, com a Lavebras, comprou 30 empresas em 36 meses, fez do negócio o maior da América Latina e, depois, em 2017, vendeu para os franceses da Elis por R$ 1,7 bilhão. No agro, além da avicultura, ele também se tornou um grande proprietário de terras com a Insolo Agroindustrial, dona de 120 mil hectares no Piauí, Maranhão e Tocantins.

Todas as aquisições anteriores na avicultura representaram um investimento da ordem de R$ 1,5 bilhão. Faria não revela quanto pagou pela Katayama, mas a compra, feita com recursos próprios, trouxe uma joia para a coroa. A Katayama inclui a granja, uma unidade de fertilizante organomineral, uma indústria moderna construída há quatro anos e um mercado internacional aberto em países altamente exigentes em qualidade. Ela foi a primeira a exportar para o Japão; depois, em 2020, abriu mercado em Xangai, Dubai e Bangladesh para ovos in natura e industrializados (ovos líquidos pasteurizados e desidratados).

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Em toneladas de ovos, o Brasil produziu 2,955 milhões em 2022 e deve aumentar para 2,969 milhões de toneladas neste ano, de acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). No ano passado, a produção mundial de ovos de mesa atingiu 93,68 milhões de toneladas, aumento de 2,30% em relação a 2021. Para este ano, a produção global é estimada em 95,35 milhões de toneladas, uma alta de 1,94% no consumo em relação a 2021, com China, Índia, União Europeia, Indonésia e EUA como principais países produtores.

Faria diz que, até 2022, exportar não era importante, mas que o mundo começa a ver o Brasil como fornecedor, ainda mais com a queda de produção em muitas nações, provocada pela gripe aviária. “Abrimos mercado para Taiwan. O Chile, que comprava da Argentina, agora está vindo ao Brasil. Há mercados na Arábia Saudita, Emirados Árabes e outros”, relata o executivo. Hoje, o volume exportado pela Granja Faria representa 13% da receita. “O mercado do ovo é um mercado em transformação, e as exportações do Brasil estão abaixo da sua capacidade.” No ano passado, o país exportou 9,5 mil toneladas de ovos, por US$ 22,4 milhões, uma minúscula parte de 3% da produção.

(reportagem publicada na edição 110 da Revista Forbes, disponível no aplicativo na App Store e na Play Store )

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