A construção modular na arte do paulistano Sérgio Sister

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Cortesia Galeria Nara Roesler

Sérgio Sister em retrato de Flavio Freire

No sábado (19), inauguramos as individuais de dois artistas muito interessantes, bem distintos entre si, Sérgio Sister, que faz a sexta exposição individual em nossa galeria, e Cristina Canale, carioca radicada em Berlim, tema da próxima coluna. As duas exposições fazem parte do Arte Circuito Jardim Europa que acontece das 11h às 17h no sábado. (leia abaixo)

Para entender um artista, o ideal é pesquisar sua trajetória. Jornalista profissional que cursava Ciências Sociais na USP, o jovem Sérgio Sister, filho de um casal de imigrantes ucranianos, nunca pensou em ser artista. Passou a cursar pintura e história da arte, como faziam muito jovens modernos, inquietos, nos anos 60, para liberar e expandir o emocional, naquela década revolucionária movida pelo naturalismo dos hippies, o rock dos Beatles, pela arte pop e, também, pelas teorias do inconsciente do psicanalista francês Jacques Lacan.




O que aconteceu em seguida, manchou para sempre a História do Brasil. A ditadura militar (1964-1985) mudou a vida de Sister e de tantos de nossos jovens cheios de ideias e ideais. Injustamente preso e torturado, foi acusado de terrorista coisa que nunca foi. Para ajudar o namorado, Bela, hoje sua mulher, levava material de desenho nas visitas rotineiras ao presídio aonde ele ficou por 19 meses. Ao ser solto, esta série de desenhos de forte apelo gráfico foi para o fundo de uma gaveta, naquele “lugar” mental intocável, reservado aos nossos maiores traumas.

Redescobertos quase cinco décadas depois, foram expostos em nossa galeria em São Paulo, em primeira mão, em 2019, na individual “Sérgio Sister: Imagens de uma juventude pop: pinturas políticas e desenhos da cadeia”, que teve o livro recentemente relançado no Centro MariAntonia da USP, em Higienópolis. Suas obras desse período também foram expostas no Instituto Tomie Ohtake na coletiva “AI-5 50 anos – Ainda não terminou de acabar…”, no Drawing Center de Nova York em “The Pencil Is a Key: Drawings by Incarcerated Artists”, e expostas em nossa galeria no Chelsea com imenso sucesso de mídia.

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Ao ser perguntado se os desenhos tinham uma ligação com o minimalismo que firmou seu nome a partir dos anos 80, Sister disse: “Hoje gosto bastante deles. Até pouco tempo, achava que eram de ‘outro artista Sérgio’, que mudou bastante a sua poética e a sua opção estética. Mas agora vejo que a estrutura mental é a mesma. A forma de estruturar o trabalho, principalmente as pinturas, tem muitas semelhanças”. Nos anos 80, o artista foi, pouco a pouco, apagando a imagem e elegendo o preto como sua matéria principal, o que remete às questões do pioneiro “Black Square” (“Quadrado negro sobre fundo branco”), tela do russo Malevich inteiramente pintada de preto em 1918, nos primórdios da Arte Moderna. No caso de Sister, não demorou, essa matéria desprovida de luz ganhou luminosidade. Foi se misturando a pigmentos metálicos e, por meio de pinceladas desconexas, caminhou em direção a um minimalismo elegante de mãos dadas com nosso construtivismo, ao mesmo tempo em que trazia algo da tradição morandiana (referência ao italiano Giorgio Morandi) e de norte-americanos como Jasper Johns, Ellsworth Kelly e Barnett Newman.

Na atual exposição, suas pinturas sobre tela ou placa de madeira produzidas de 2020 a 2023 se apresentam, conforme o jargão da arte, em dípticos (dois planos) e polítpticos (mais de dois planos), interrompidos pelas frestas e cavidades salientadas no título da mostra. Nas palavras do crítico Felipe Scovino: “São peças que requerem a construção modular, mas têm autonomia”. Também estão incluídas três séries icônicas, Pontaletes, Caixas e Ripas, referências do artista à arte concreta, em especial, ao mestre paulistano Willys de Castro (1926-1988).

Sua maneira peculiar de estruturar o trabalho em planos cromáticos definidos, delimitados por outro plano de cor e/ou espaço e/ou espaço-cor, que se tornou uma marca da obra de Sister, vem lá de trás da admiração que nutre por Mondrian (pense na série dos anos 30, “Composições em Vermelho, Azul e Amarelo”). Esta ideia de compartimentar a tela nasce do vibrante grafismo da Arte Pop, que fundamentou não somente a obra de Sister, mas a de toda uma geração de grandes nomes da arte brasileira, como seus amigos Antonio Dias, Rubens Gershman, José Roberto Aguilar e Claudio Tozzi.

Sérgio Sister é um dos expoentes da arte latino-americana, possui obras no Centre Georges Pompidou, Paris; François Pinault Collection, Veneza; e em nossos museus como MAM-Rio, MAR, MASP, MAC-USP e a Pinacoteca do Estado de São Paulo, entre outras instituições de prestígio.

Arte Circuito Jardim Europa

No sábado, dia 19 de agosto, as aberturas das exposições individuais “Pintura entre frestas e cavidades” de Sérgio Sister e “Memento Vivere” de Cristina Canale, ambas na Galeria Nara Roesler, fazem parte do Arte Circuito Jardim Europa. O evento incentiva a visitação às galerias de arte da região e, além da Galeria Nara Roesler, inclui também Galeria Marilia Razuk, Dan Galeria, Luciana Brito Galeria, Arte 57, Galeria Lume, Galeria Mario Cohen e AM Galeria de Arte. Das 11h às 17h vans estarão disponíveis nas oito galerias para fazer o circuito entre elas ao longo do sábado. Arte Circuito Jardim Europa é gratuito e aberto ao público.

“Sérgio Sister: pintura entre frestas e cavidades”

De 19 de agosto a 7 de outubro, 2023
Galeria Nara Roesler, São Paulo
https://nararoesler.art/

Com colaboração de Cynthia Garcia, historiadora de arte, premiada pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) – cynthigarciabr@gmail.com.

Nara Roesler fundou a Galeria Nara Roesler em 1989. Com a sociedade de seus filhos Alexandre e Daniel, a galeria em São Paulo, uma das mais expressivas do mercado, ampliou a atuação, inaugurando no Rio de Janeiro, em 2014, e no ano seguinte em NY.

info@nararoesler.art
Instagram: galerianararoesler

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