“O grego é muito religioso”, define Georgios Frangulis, paulistano de 34 anos, fundador e CEO da Oakberry, conhecido como Grego, logo após sair da missa na catedral Stephansdom, em Viena, em uma tarde de segunda-feira, em maio, durante uma viagem a trabalho e entre outras duas jornadas na Europa: com o pai e o irmão, foi visitar as raízes da família em Tessalônica no ano em que o pai celebra 70 anos e, com a equipe Haas, para ver o GP de Mônaco. “Vou muito à igreja, conversar com Deus me faz bem. Tive essa influência dos dois ramos da família. Lado espiritual sempre foi importante para mim – assim como a intuição.”
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A espiritualidade de Grego não se limita às palavras. Está na cara, ou melhor, no corpo – a começar pelo pescoço. Ali, leva pendurados em um colar vários símbolos: crucifixo, olho grego, São Francisco de Assis, a imagem de Jesus Cristo e Agnus Dei. Alegorias religiosas são o tema principal das tatuagens. Tem um crucifixo no meio do peito e o Pai Nosso em alemão na altura do coração. No canto direito, outra cruz, dessa vez entre ramos, e a inscrição “Liberdade ou morte”; no bíceps direito, a inscrição “Lutai por nós, São Jorge Guerreiro” – ambas em grego. “Na Grécia, o dia do santo é mais importante do que aniversário.” Nas costas, outro crucifixo – “para quem olha por trás”. No antebraço direito, “O Senhor é meu pastor e nada me faltará”, em inglês. “Na mão esquerda, tenho uma que é meu lema maior: Ora et Labora.” Em latim, a mensagem beneditina de orar como se tudo dependesse de Deus, e trabalhar como se tudo dependesse de você. “Sempre fui crente, no sentido da fé. E eu me agarrei a isso nos momentos que a gente se sente no fundo do poço e precisa reagir.”
Pela primeira vez, Grego conta o quão dramático foi o seu ano de 2016. O ano, por si só, foi marcante por seu casamento e pela inauguração da primeira loja no Shopping Cidade de São Paulo, dois feitos públicos e notórios. A revelação inédita, no entanto, traz um outro ingrediente aos meses que transformaram sua vida: “Nunca contei, mas, em agosto de 2016, descobri que estava com câncer na tireoide, um nódulo de quatro centímetros que o médico falou que precisava tirar para definir o tratamento. Eu me casei no dia 1º de outubro; a última grana que eu tinha usei para pagar o bar do casamento; operei no dia 16 de outubro e consegui abrir a primeira loja da Oak em São Paulo no dia 6 de dezembro, pois fui atingido por um tipo de raio divino quando eu mais precisava – e menos esperava.”
Na entrevista a seguir, saiba que raio foi esse e a importância do ESG na expansão internacional da marca que vende delícias saudáveis feitas à base de açaí e já está presente em 34 países (serão mais de 40 até o fim de 2023). No Brasil, a Oakberry tem 400 lojas, em 21 estados. Em setembro de 2022, inaugurou uma fábrica de açaí em Santa Isabel, no Pará (a 50 quilômetros de Belém). A produção de 2023 vai bater o patamar de 7 mil toneladas de sorbet de açaí, um número que canaliza o trabalho de seis cooperativas na região. Com um crescimento anual de 144% e 56% em 2021 e 2022, respectivamente, a marca deve crescer 83% em 2023, atingindo o faturamento de R$ 687 milhões.
Forbes – Qual é a sua formação acadêmica?
Georgios Frangulis – Eu me formei em direito, na Faap, em 2014, mas nunca nem busquei meu diploma, nem fiz prova da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil]. Sempre soube que não seria advogado. Achei que o direito era algo que me ajudaria em qualquer frente. O que eu queria mesmo era empreender.
O que fez após se formar?
Logo que me formei, fui para Miami. Sempre gostei dos Estados Unidos. E sempre achei Miami um lugar propício para empreender – como é mesmo. Mas é tão fácil de empreender lá que acaba sendo difícil se dar bem por causa da competitividade. Aprendi isso muito rápido.
Qual foi seu primeiro ramo de atuação?
Fui para investir em imóveis, em real estate. Peguei grana emprestada, comprei um apartamento e entrei de sócio em um terreno com um amigo. Minha ideia era construir umas townhouses. Em cinco, seis meses, meus planos foram por água abaixo porque o dólar explodiu em 2014. Vendi tudo, paguei quem eu devia e fiquei com uma graninha da diferença cambial que fiz sem querer.
Qual foi o passo seguinte?
Fui para a Califórnia sem muita agenda definida. Aluguei um apartamento perto de Venice Beach, em Los Angeles. Observei a demanda natural por fast food, mas também muita gente procurando alimentação saudável. E percebi a pouca oferta de alimentação rápida e saudável. Algo com padrão, com marca, com branding. O açaí estava começando a ganhar tração na Califórnia. As casas de sucos mais descoladas começavam a oferecer açaí.
E o açaí deles era bom?
Faziam até fila em uma loja. Fui lá experimentar. Imaginei que seria algo muito bom – afinal, custava US$ 25. Foi o pior açaí da vida. Demoraram 20 minutos para me entregar, e era ruim. Tenho a vantagem de ser nascido e criado em São Paulo. Sabia que o açaí era algo que podia ser padronizado e gostoso, além de saudável. Falei: “Cara, de repente, aqui tem um negócio”. E comecei a desenhar a Oakberry como ela é hoje.
Você estava capitalizado para investir na ideia?
Durante a passagem pela Califórnia, fui queimando o pequeno caixa que fiz na fase de Miami. Em 2015, fiquei noivo da minha esposa, ia casar no ano seguinte. Meu dinheiro acabou em 2016, e eu tinha casamento marcado para outubro. Então, era vai ou racha, a Oakberry precisava para sair do papel. Mas daí aconteceu uma coisa que nunca contei.
O que aconteceu?
Em agosto de 2016, descobri que estava com câncer na tireoide, um nódulo de quatro centímetros, que o médico falou que precisava tirar para definir o tratamento. Eu me casei no dia 1º de outubro; a última grana que eu tinha usei para pagar o bar do casamento. Operei no dia 16 de outubro, tirei a glândula, no fim deu tudo certo. Então, era hora de economizar tudo o que fosse possível. Liguei no Citibank para cancelar um seguro de vida pelo qual eu pagava R$ 64 por mês. Falei que tinha acabado de operar um câncer e não ia precisar naquele momento. A atendente não me deixou cancelar e falou que o seguro cobria doenças graves, como câncer, e que tinha direito a 75% do prêmio do seguro. Não era muita coisa, mas, em 15 dias, me pagaram R$ 100 mil. Foi tipo um raio divino na minha cabeça, quando eu mais precisava e menos esperava. No dia 6 de dezembro, eu e o meu sócio, Renato Haidar, abrimos a primeira lojinha no Shopping Cidade de São Paulo.
Mas a ideia inicial era abrir o negócio nos EUA, não?
Sim, a ideia era começar a Oakberry na Califórnia. Desenhei o modelo de negócio pensando no mercado norte-americano. Mas ninguém confiava em alugar para a gente um ponto bom o suficiente. Eu não tinha histórico de crédito, não tinha grana. Era um moleque tentando começar um negócio nos EUA. Decidimos virar a chave e começar o negócio no Brasil. A gente internacionalizou a Oakberry ao contrário. Quando tivemos que internacionalizar de verdade para outros países, lá em 2018, 2019, a fórmula já estava pronta.
Com quantas lojas e colaboradores a companhia fechou o primeiro ano de operação e quais são os números atuais?
Fechamos o primeiro ano com 30 unidades no Brasil e aproximadamente 130 colaboradores na rede. Hoje, são cerca de 650 unidades ao todo, no mundo, das quais 600 franqueadas e 50 próprias. Quatrocentas no Brasil e 250 no exterior. Temos aproximadamente 2.900 colaboradores na rede, sendo 1.900 no Brasil e mil fora. Desde março, temos o Oakberry pronto para consumo nas gôndolas do Pão de Açúcar e devemos fechar o ano com 3 mil PDVs. Acredito que essa iniciativa pode se tornar tão importante quanto a rede de lojas em um futuro de médio e longo prazos.
Quais são os países com mais lojas e quais têm os melhores resultados?
Austrália tem 32 lojas; Espanha, 28; Portugal, 26; Estados Unidos, 24; e Arábia Saudita, 22. Novidades em primeira mão: Áustria, Romênia, Indonésia, Irlanda do Norte e Irlanda. Além do Brasil, os três países em que temos os melhores resultados são Austrália, Catar e Estados Unidos.
Qual é a importância do ESG na Oakberry?
A Oakberry não levanta muito a bandeira de ESG porque, para a gente, é algo tão parte da empresa, e do nosso porquê, que tratamos com mais naturalidade que a maioria das companhias que buscam iniciativas nesse sentido. O açaí, como fruta, só existe pela cultura de subsistência das comunidades ribeirinhas na Floresta Amazônica. A gente hoje, tendo uma produção verticalizada, consegue ter uma proximidade muito grande com as comunidades de ribeirinhos, sabendo que todo o processo de colheita está sendo feito de maneira certa, que não tem trabalho infantil. A gente precisa disso para ter todas as certificações necessárias para o nosso produto no exterior. O açaí fomenta a economia da população da região amazônica. E isso é uma forma de preservar a floresta em pé. Em vez de cortar as palmeiras de açaí para vender o palmito, ou para plantar qualquer outro tipo de coisa, a gente mostra o valor agregado do açaí nativo que eles têm no quintal. Não plantamos nada – consumimos o nativo. O açaí é sustentável na essência. Sem sustentabilidade, não existe açaí. Sobre governança, a Oakberry é uma empresa auditada e que se preocupa muito com a autonomia do time, o que todo mundo pode fazer para agregar e ajudar a construirmos a cultura da companhia e levá-la para tantos países diferentes.
A Oakberry terceiriza parte da produção de açaí?
Hoje não terceirizamos nada da nossa produção. Desde setembro de 2022, todo açaí Oakberry é produzido por 80 colaboradores em nossa fábrica. Trabalhamos com duas cooperativas, e temos outras quatro já contratadas – até o fim do ano, devemos ter 100 famílias parceiras.
Como explica o sucesso da marca no Brasil e no exterior?
A gente sempre quis vender Oakberry, e não açaí. Acreditamos em uma marca forte o suficiente para transformar o açaí em uma categoria, e não em uma commodity estereotipada. A começar pelo nome: pensei em um nome que não significasse nada. Queria algo que fosse prático e pudesse usar em qualquer país. Sempre foi tratada como uma empresa que não tinha uma pátria definida. A gente nunca encheu a Oakberry de bandeira do Brasil de propósito. A ideia era fazer com que a marca virasse a maneira de consumir alimentação saudável em qualquer lugar do mundo. Uma curiosidade sobre o nome: na véspera do registro, meu sócio ainda não estava 100% convencido da ideia. Disse para ele ir para a casa e que falaríamos no dia seguinte. Felipe também é religioso, e costuma ler um livro com citações bíblicas em inglês – no dia seguinte, abriu em Isaías 6:13, que usa o carvalho (oak) como metáfora do povo de Deus, que pode ser cortado, queimado, mas sempre resistirá e nascerá mais forte. Aí, não tivemos mais dúvidas (risos). Resolvemos também colocar o número do versículo em algum canto de todas as lojas da Oakberry. [Isaiah 6:13 também virou tatuagem, no pulso direito]
Como concilia a carreira no automobilismo com a função de CEO de uma companhia de atuação internacional?
Não é trivial conseguir ser piloto no meio do turbilhão de crescimento que é a Oak. Mas as corridas e treinos da Porsche Cup são quase sempre em finais de semana. Então, se eu mantiver uma rotina de treinos físicos no meu dia a dia, além de acompanhamento psicológico para aguentar o tranco [terapia duas vezes por semana], estou sempre preparado para a hora de pilotar. Entrar no carro e correr é um dos únicos momentos em que nada mais importa. Este ano, devo correr as nove etapas regulares da Porsche Cup Brasil, além de duas provas internacionais de Endurance (12 e 24 horas em Monza e Dubai). Hoje [até fim de maio] sou líder do campeonato da Porsche Carrera Cup Sport, minha categoria.
Onde a Oakberry investe em patrocínio?
Nossos patrocínios atuais são: Haas F1 Team; Porsche Cup; WSL [World Surf League]; Miami Heat Arena; US Open; Miami Open, onde este ano vendemos US$ 125 mil de açaí em 10 dias de torneio; Australian Open, Brasil Open, entre outros torneios de tênis. Estivemos dentro do estádio do Super Bowl em 2020. Agora, os eventos já nos procuram para participarmos, pois sabem que oferecemos algo nutritivo e que é fácil de levar para consumir no assento.
Reportagem publicada na edição 108 da Forbes Brasil
O post CEO e fundador da Oakberry: “Sem sustentabilidade, não existe açaí” apareceu primeiro em Forbes Brasil.