A discreta aposta de Bill Gates no hidrogênio “geológico”

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Forbes

Tom Darrah, fundador e CTO da Koloma

Já se passaram 37 anos desde que um incêndio em uma mina de carvão forçou a família de Tom Darrah a fugir de casa na cidade de Centralia, na Pensilvânia. Três décadas depois, o fogo não se apagou e ainda espalha gases tóxicos como dióxido de carbono e sulfeto de hidrogênio. O incêndio, um dos maiores desastres ambientais da história americana, transformou o lugar em uma cidade fantasma.

Uma foto de Centralia antes do incêndio adorna uma das paredes do escritório de Darrah na Universidade Estadual de Ohio. Ele é professor de geologia e um dos maiores especialistas do mundo no chamado hidrogênio “geológico”, uma forma de energia renovável que pode ser uma alternativa aos combustíveis fósseis. O hidrogênio geológico pode ser encontrado em vastos depósitos nas placas tectônicas, onde existem condições para que o elemento mais leve da Terra permaneça em sua forma mais pura. “Ele está presente em todos os continentes”, diz Darrah. “A quantidade disponível é imensa.”

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Ele é um dos fundadores e CTO da Koloma, uma startup pouco conhecida de Denver, no estado do Colorado. Darrah possui 16 patentes para encontrar e extrair hidrogênio de maneira eficiente e planeja um futuro em que possa se extrair o gás assim como se extraiu o petróleo.

A Koloma foi fundada há dois anos e tem operado discretamente até agora. A companhia está perfurando seus primeiros poços nos Estados Unidos, coletando amostras de rocha e gás em seu laboratório em Columbus, para testar quais locais têm o maior volume e pureza de hidrogênio. A empresa recebeu US$ 91 milhões de investidores como o Breakthrough Energy Ventures de Bill Gates, Energy Impact Partners, Evōk Innovations, Prelude Ventures e Piva Capital, tornando-a a startup mais bem financiada do setor.

Atualmente, o mundo usa cerca de 100 milhões de toneladas métricas de hidrogênio anualmente, um mercado avaliado em mais de US$ 120 bilhões, de acordo com o banco norte-americano Goldman Sachs. A maior parte desse hidrogênio é usado para refino de petróleo, produção de fertilizantes, produtos químicos e para o processamento de alimentos.

No entanto, o governo americano acredita que o hidrogênio possa vir a se tornar uma fonte de energia livre de carbono, inclusive para transportes, e está investindo nisso. Cerca de US$ 9,5 bilhões foram destinados a projetos de hidrogênio limpo na Lei de Infraestrutura de 2021, e um crédito tributário de US$ 3 por quilo para combustíveis de carbono zero foi incluído na Lei de Redução da Inflação do ano passado.

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Ao contrário do petróleo e do carvão, que continuam queimando sob a cidade natal de Darrah, este é um processo naturalmente gerado pelo planeta, fomentando novas esperanças para o desenvolvimento econômico, especialmente à medida que os efeitos catastróficos das mudanças climáticas causadas pelo homem se tornam inegáveis.

“Atualmente, um quilo de hidrogênio vale US$ 1. Então, se houver trilhões de quilos, há cerca de US$ 1 trilhão em hidrogênio por aí, e alguma fração disso pode ser extraída com sucesso”, disse ele. “É grande o suficiente para pensar: ‘Ok, isso é animador”.

‘É tudo sobre a rocha’

O hidrogênio tem sido considerado uma opção de energia limpa há décadas. Pode ser um combustível zero-carbono, líquido ou gasoso, para veículos, navios e trens, além de geradores de energia estacionários. Mas o elemento mais leve da tabela periódica é complicado para se trabalhar. Geralmente aparece na natureza na combinação com outros elementos, como oxigênio, carbono e enxofre. Ele pode fluir por gasodutos, mas também pode corroê-los e vazar. Além disso, é altamente inflamável, e precisa ser comprimido e resfriado para ser armazenado, o que requer ainda mais energia.

Incentivos multibilionários dos EUA visam o hidrogênio “verde”, produzido a partir de água e energia renovável, ou o hidrogênio “azul”, que usa combustíveis fósseis, mas impede que o carbono seja liberado na atmosfera. Segundo a Koloma, o hidrogênio geológico – também conhecido como “branco” ou “dourado” – será muito mais barato e consumirá menos energia.

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A startup espera que o hidrogênio geológico se qualifique tanto para os fundos relacionados à Lei de Infraestrutura quanto para os créditos de produção de hidrogênio limpo. Outro dos fundadores, Paul Harraka, um ex-piloto da Nascar que lidera as operações comerciais e relações governamentais da Koloma, disse que o hidrogênio geológico está recebendo “amplo apoio bipartidário, porque oferece uma oportunidade de produzir energia limpa a partir de fontes totalmente domésticas, criando empregos e investindo no desenvolvimento do país”.

Assim como garimpeiros que encontraram ouro, a Koloma não quer que os concorrentes saibam onde está o hidrogênio. Seus fundadores só revelaram que seus primeiros poços estão no meio-oeste dos Estados Unidos, e que podem explorar mais países no futuro.

A Natural Hydrogen Energy e a HyTerra, duas concorrentes menores da Koloma, estão preparando seus próprios lugares de teste em Nebraska e Kansas, em uma fissura tectônica no meio da América do Norte, com 1.931 quilômetros de extensão. A Koloma não confirmou se também opera nesta região.

“Estamos focados nos lugares onde não apenas acreditamos que há o tipo certo de gás, com a rocha certa, mas também lugares que possam se tornar produtores comerciais”, disse Johnson, um investidor de longa data do setor de energia que já liderou a Monolith Materials, uma empresa que produz hidrogênio a partir de gás natural. “É tudo sobre a rocha… quanta quantidade de gás essa rocha poderia conter; como o gás vai se mover por essa rocha. É um processo constante para tentar entender a rocha”.

“Alguém não está pensando”

Darrah, de 41 anos, é “um geoquímico de reconhecimento mundial”, segundo Webber. Seu laboratório em Ohio State está cheio de espectrômetros de massa, equipamentos de medição sensíveis, provetas e tubos enrolados em papel alumínio.
Junto com a antiga foto de Centralia, há uma imagem emoldurada do general George S. Patton da Segunda Guerra Mundial, com uma citação que Darrah gosta: “Se todos pensam da mesma maneira, então alguém não está pensando”.

Darrah pesquisou sobre o hidrogênio por 15 anos, viajando em missões geológicas para a África, a Europa, a Austrália e outros lugares para conhecer as condições mais propícias para gerá-lo. Essa experiência tornou Darrah um admirador das maravilhas geológicas da Etiópia, inicialmente batizando a empresa de “Lalibela Labs”, em referência à antiga cidade do país, com suas igrejas esculpidas em rocha, seguindo o modelo da antiga Jerusalém. Ela foi renomeada como
Koloma em referência a Coloma, na Califórnia, onde outra descoberta geológica em 1848 deu início à Corrida do Ouro da Califórnia.

A Koloma acredita estar bem-posicionada para dominar o setor somando o seu financiamento, a experiência geológica de Darrah em saber onde procurar – incluindo uma patente para uso de satélites com inteligência artificial e leitura de imagens para uma análise detalhada de locais promissores que ele desenvolveu na OSU – e recrutas como a COO Carrie Hudak, uma geóloga e especialista em perfuração, que gerenciou grandes projetos de campos de petróleo para a Anadarko Petroleum. E há um mais um benefício: geralmente, o hélio altamente valioso é encontrado nos mesmos reservatórios subterrâneos, criando a chance da Koloma se beneficiar com a extração de dois gases diferentes. Segundo uma estimativa de 2022 do U.S. Geological Survey, o hélio vale cerca de US$ 310 por mil pés cúbicos (28 metros cúbicos). “Isso também chamou a atenção de muitas pessoas, o fato de que poderia haver dois gases valiosos no mesmo local”, disse Darrah.

“Anos, não décadas”

O início da exploração e perfuração por diferentes empresas, e até mesmo um novo programa do Departamento de Energia – concessão de pesquisas para empresas e universidades encontrarem formas de aumentar o fluxo de hidrogênio dos reservatórios subterrâneos – dão a entender que a produção comercial de hidrogênio geológico não está tão distante de acontecer.

Atualmente, cerca de 40% do hidrogênio produzido mundialmente é feito de carvão, um processo mais poluente do que a extração do gás natural. Isso cria uma demanda considerável a curto prazo para empresas que podem fornecer hidrogênio verde ou natural, segundo Webber. “Mesmo que você não ache que o mercado de hidrogênio vai crescer – embora eu acredite que vai aumentar muito nos próximos 20 anos – ainda há um grande mercado para o hidrogênio mais limpo.”

Mas a Koloma também não está com pressa para entrar no mercado, pois o mercado também não está completamente preparado.

“Os únicos grandes consumidores de hidrogênio são refinarias e fábricas de amônia. Então, é preciso esperar que os mercados se desenvolvam”, disse Johnson. “Estamos investindo em nossas capacidades, e vamos tentar sincronizar a comercialização com o momento em que a demanda por hidrogênio estiver realmente aumentando”.

Impacto ambiental

O hidrogênio é um elemento inflamável e pode ser explosivo sob alta pressão. Mas a perfuração das reservas do gás não deve desencadear o tipo de evento que devastou Centralia. Isso porque as bolsas de hidrogênio estão a milhares de metros abaixo do solo, isoladas do oxigênio. Um incêndio de carvão, como o que ocorre sob a cidade natal de Darrah, queima mais próximo da superfície, e se espalha devido ao oxigênio.

Além de ser carbono-zero, Darrah está convencido de que perfurar para o hidrogênio natural também usará menos água do que para a exploração de petróleo, representando menos risco ao meio ambiente.

“A gasolina não ficou popular porque as pessoas querem poluir o ar. Ela se popularizou porque era uma fonte densa de energia que podia ser acessada com baixo uso de terra local e baixos requisitos de energia”, disse o especialista. “Quando você pensa no custo, na pegada de carbono, uso de terra ou água, é aí que surgem todas as vantagens do hidrogênio geológico. Isso é tão impactante quanto a quantidade de hidrogênio que podemos colocar no mercado”.
Webber, que admite ter se surpreendido com o hidrogênio geológico quando começou a estudá-lo há cinco anos, diz que há uma certa previsibilidade nisso.

“A Terra sempre tem a resposta, se você abrir a sua mente e estiver disposto para olhar ao redor”, ele disse. “A Terra nos dá vento, luz solar e água; ela nos dá petróleo, carvão e esterco de vaca. Por que ela não nos daria hidrogênio? Isso faz sentido de alguma maneira filosófica”.

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