Chegar ao cinema na manhã desta terça-feira (18) poderia ter sido apenas mais uma sessão nas nossas vidas pós-pandemia se o filme a ser assistido não fosse “Barbie”, um dos lançamentos mais aguardados – talvez “o” mais aguardado? – de 2023. Era a primeira exibição da obra no Brasil, e a sessão exclusiva organizada para jornalistas e criadores de conteúdo deixava claro logo no hall de entrada que a produção não está disposta a deixar dúvidas sobre sua potência e cobiçada unanimidade do mundo cor-de-rosa da boneca mais famosa do mundo.
Um pink carpet recebia os convidados que, antes de entrarem na sala lotada, podiam tirar fotos dentro de caixas de boneca gigantes e ao lado de pôsteres das mesmas dimensões de versões platinadas de Margot Robbie, a Barbie, e Ryan Gosling, o Ken, ou ainda posar no carro conversível da boneca, uma réplica rosa de um Chevrolet Corvette. Na sessão, dentro da sala, um mar de roupas rosa-shocking – de blazers a cachecóis e blusas temáticas #Barbiecore – vestia os ânimos claramente ansiosos para ver o primeiro live-action do ícone criado em 1959 por Ruth Handler
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Depois de 1 hora e 54 minutos, o que pode-se dizer é que se recepção global do filme for minimamente parecida com sua primeira exibição brasileira, regada a aplausos e risadas altas (e constantes) de cerca de 300 espectadores, a “Barbie” de Greta Gerwig será um sucesso estrondoso. É o que espera a Warner Bros., cuja expectativa é arrecadar entre US$ 80 milhões e US$ 100 milhões (R$ 386 milhões a R$ 482 milhões) só no fim de semana de estreia.
O buzz sempre existiu desde que a produção foi confirmada, mas ganhou força a partir de junho de 2022, quando fotos de Margot e Gosling patinando na Califórnia em roupas neon viralizaram, e explodiu de vez nas últimas semanas, quando praticamente o mundo inteiro do entretenimento começou a ser pintado de rosa shocking – até mesmo o rival “Oppenheimer”, de Christopher Nolan, acabou entrando na onda com o “Barbenheimer”. E toda essa expectativa dá sinais que será correspondida, muito em parte pelos pequenos detalhes de “Barbie”, que não tem medo de tirar sarro do universo da boneca e sua empresa-mãe, a Mattel. Mesmo clássicos do cinema e da cultura pop, como “Matrix”, “Liga da Justiça” e até “2001: Uma Odisséia no Espaço”, são alvos do sarcasmo de Barbie, sempre cheia de referências pop e sacadas inteligentes que tiraram boas risadas dos especialistas.
As piadas com temas como feminismo, patriarcado e depressão mostram que o filme dirigido por Gerwig definitivamente é para um público-alvo diferente daquele que ainda brinca com bonecas. Não é só de “imagination” e “it’s fantastic” que vive a Barbie do mundo adulto. A vinda do ícone para o mundo real vem junto dos problemas e das questões estruturais desse contexto.
Com uma Barbie um tanto ingênua descobrindo como é a dura realidade de uma sociedade patriarcal, o longa retrata as dificuldades que as mulheres enfrentam para ocuparem os espaços profissionais, o esgotamento de ser uma mulher na liderança em ambientes machistas, a síndrome da impostora e a pressão por uma perfeição feminina, entre outras críticas.
É ironizado, ainda, como a narrativa de empoderamento capitalista coloca a libertação das mulheres em produtos e slogans para gerar lucro. Isso inclui a Mattel que, ao criar Barbies com diferentes profissões e em locais “onde meninas nem poderiam sonhar em chegar”, prioriza estratégias que podem gerar mais lucro para a marca.
A própria personagem de Margot Robbie, mulher branca, alta e magra que representa a “Barbie esteriotipada”, problematiza o padrão de beleza e o comportamento da mulher “perfeita”, imagem que a empresa vendeu durante anos. Ela não é médica, engenheira, presidente ou jornalista como as outras Barbies – o seu papel é “amar o Ken” e representar a beleza dessa classe de bonecas.
“Queria conhecer a presidente da Mattel”, diz a Barbie de Margot, que fica atônita ao descobrir que toda a diretoria da empresa, inclusive o presidente da divisão de Barbies, era composta pelos homens à sua frente. E, fora da Barbielândia, não é muito diferente – só 17% das presidências de empresas no Brasil são ocupadas por mulheres.
As falhas de vários homens na liderança é representada com Ken descobrindo que, para conseguir um cargo de poder, ele só precisaria de um MBA, uma pós-graduação ou algum curso de treinamento para a profissão que deseja seguir.
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Mas no escurinho do cinema, imersos no cosmos cor-de-rosa da Barbie, o que começou como uma sessão em que se ouvia brincadeiras aqui e ali, com a predominância das roupas no estilo barbiecore ou de falas como “eu preferia a Suzy”, depois de duas horas se transformou em uma plateia encantada. “Esse é um filme que dá para assistir dezenas de vezes”, dizia uma convidada. Outra pessoa contava ao colega como havia se emocionado, “até escorreu uma lágrima”.
A emoção, imagina-se, vem de um misto de nostalgia e representatividade. É notável o esforço do filme para renovar a imagem da Barbie e trazer maior identificação com os valores daqueles que brincavam com as bonecas na infância. Transpondo o mundo real com a Barbielândia, a Mattel faz também uma linha do tempo da sua própria história e mostra a reinvenção dessa Barbie estereotipada e das outras criações da empresa – como as bonecas Skipper, Midge, Tereza e Allan –, conforme o mundo se transformou junto com os papéis femininos e suas possibilidades.
Por essa razão, entre outras, Barbie é a boneca mais amada do mundo e sobrevive há gerações.
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O post “Barbie” ri do machismo e mostra que não é para quem brinca com bonecas apareceu primeiro em Forbes Brasil.