Quando Flávia Montebeller fez a transição de carreira da área de farmácia para o marketing, ela jamais imaginaria que, menos de uma década depois, teria a sua própria empresa, a MBOOM. A capixaba, crescida em uma cidade muito pequena do Espírito Santo, diz que nunca teve o sonho de empreender. O máximo que almejava era o cargo de CEO, mas de outro negócio que não o seu próprio. Mas um tiro no escuro, em 2016, mudou o rumo da sua vida profissional: as linhas de beleza assinadas por influenciadoras digitais.
Hoje, na era da creator economy, cosméticos e produtos de selfcare com o rosto de criadores de conteúdo bombados nas redes sociais vendem como água. Basta ver os rankings de best-sellers de lojas de beleza: nomes como Boca Rosa, Bruna Tavares e Mari Maria estampam as prateleiras. Quase toda e qualquer personalidade da internet quer uma linha para chamar de sua. Mas na década passada, quando esse terreno ainda era mato, o que Flávia recebia das grandes varejistas ao propor algo do gênero eram risadas. “Quando fomos desbravar o Brasil apresentando esses projetos, eles riam na minha cara e diziam ‘vocês estão loucas?’, ‘o que é isso?’”, afirma.
À época diretora de marketing da Payot, uma das maiores e mais tradicionais players do setor nacional de cosméticos, a executiva quis apostar em colabs com blogueiras na intenção de captar mais consumidores jovens para a marca sexagenária. “Era um terreno difícil de pulverizar no país, não tinha credibilidade. Havia o estigma das ‘blogueirinhas’ e não tinha quase nenhuma marca do tipo, só a Bruna Tavares, mas que estava em pouquíssimos lugares”, lembra. O nome de estreia da ideia foi Mariana Saad, que lançou em 2016 uma coleção de batons com a Payot. O jogo, que começou como chacota por partes dos buyers, logo virou sucesso: “Em 15 dias, eles [os varejistas] já estavam implorando para ter os produtos nas lojas”, completa.
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Cruzando a linha com Boca Rosa
A chancela da primeira tentativa fez Flávia querer mais. O próximo nome era claro para ela: Bianca Andrade, a Boca Rosa. Foi a capixaba que montou do zero o plano de negócios e convidou Bianca para embarcar na missão pioneira. “Trazer uma influenciadora jovem para uma marca quase centenária, para ter uma linha de destaque, foi uma luta. Foi custoso, mas o varejo começou a aceitar muito bem as linhas assinadas”. Hoje, a Boca Rosa Beauty é uma das linhas mais vendidas da Payot – e do Brasil. “Foi um dos maiores projetos da minha carreira. Depois dele eu realmente cruzei uma linha”, afirma.
Essa linha cruzada que Flávia menciona a levou em direção ao próprio negócio, mesmo esta não sendo a sua intenção. “A MBOOM nasceu até mais por desejo dos outros. Sempre ouvi muito de pessoas importantes no mercado, grandes executivos que atendia, que eu tinha que fazer o meu negócio. E quando descobri o cerne desse modelo [de colabs assinadas], decidi tentar”, conta sobre a oportunidade de mercado que enxergou – e agarrou, investindo todo o dinheiro que tinha guardado. “Eu tinha total certeza que iria dar certo”, afirma.
Influência e varejo se encontram
Não demorou muito para a ideia da empresa especializada em criar e desenvolver marcas de beleza para influenciadoras sair do papel. Em quatro meses de planejamento, no primeiro semestre de 2021, a MBOOM já tinha sua linha – e blogueira – de estreia: Franciny Ehlke. A Under 30, que reúne mais de 34 milhões de seguidores no Instagram, Youtube e TikTok, foi procurada pessoalmente por Flávia e, juntas, lançaram a marca Fran em outubro do mesmo ano, com 35 produtos.
Até o final de 2022, em um ano e três meses no mercado, a linha trouxe para a empresa um faturamento de R$ 130 milhões, com três milhões de produtos vendidos. Um dos itens de edição limitada – o gloss de aumento labial Chocochilli – esgotou em segundos no lançamento, alcançando R$ 1,5 milhão em vendas. O sucesso foi tanto que a empresa pensa em deixá-lo como fixo no portfólio.
Mas para além do alcance de Franciny, que divulga as maquiagens na internet para uma legião de fãs, a fórmula de sucesso da MBOOM tem mais um ingrediente: sua presença em pontos físicos. A empresa surgiu no mercado não só no e-commerce, mas também em quatro dos maiores players de varejo do país – Sephora, C&A, Riachuelo e Renner. Como? Flávia atribui isso a sua credibilidade e relacionamentos, construídos ao longo de 15 anos de trabalho na indústria da beleza, especialmente na Payot, que trouxe para sua própria companhia. “Os meus primeiros clientes foram os grandes varejistas e estamos falando de uma empresa que, em menos de um mês de operação, já tinha contratos assinados com eles. Isso é recorde. Eles assinaram sem nem ver os produtos, só mockups. Foi um voto de confiança, não teve uma pessoa que duvidou do negócio”, afirma.
O negócio da capixaba conseguiu juntar o melhor dos mundos: o marketing virtual das influenciadoras com a capilaridade das varejistas de chegar em vários cantos do Brasil. Hoje, a MBOOM está presente em 3.200 pontos físicos em todo o território nacional, além da internet. “Essa foi a nossa estratégia para trabalhar sem muito dinheiro, sem um grande aporte financeiro”, diz. “Com os meus contatos, dos melhores fornecedores e dos grandes players, a empresa pagou o pouco que eu tinha para investir super rápido”, completa.
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Os próximos passos da beleza
Nesse um ano e meio de atuação, a companhia de linhas assinadas já se consolidou com um sucesso do setor de cosméticos, especialmente no varejo físico. Em dezembro de 2022, o portfólio se expandiu com a linha Karen Bachini Beauty. Foi a influencer e maquiadora, que trabalha com conteúdo de beleza na internet há mais de uma década, que procurou Flávia para a parceria, depois de ver seu trabalho com Franciny. “Há anos procuro uma empresa para ter minha própria marca e não achava. Quando vi a linha da Fran, fiquei impressionada com a qualidade dos produtos e sabia que era isso que queria para mim. Pensei ‘é com essa mulher [Flávia] que quero trabalhar’. Com certeza, não teria lançado minha marca sem a MBOOM”, afirma Karen, que acumula 5,6 milhões de seguidores nas redes.
Com as duas linhas, Flávia espera aumentar o faturamento para R$ 160 milhões em 2023 e, até o final do ano, estar em 5.000 pontos de vendas pelo Brasil. Quanto à expansão, ela afirma que não existe pressa em adicionar mais marcas ao portfólio: “Eu preciso e sempre vou colocar no mercado novas linhas que são relevantes. Crescer demais não é um problema, mas a gente precisa crescer direito, estruturado”.
Novos nomes estão no horizonte. A capixaba afirma que a marca de uma personalidade da mídia deve chegar ainda este ano, assim como uma linha própria de cosméticos da MBOOM – outro braço do negócio. Mas, na hora de bater o martelo sobre outros rostos da empresa, o segredo é o comprometimento. “Gosto de escolher, mas também avalio quem quer entrar. Quero quem vai se dedicar tanto quanto eu, porque é uma parceria contínua. Nós trazemos a influenciadora para o negócio e decidimos tudo juntas, todas as etapas. O produto é uma materialização do sonho delas, é a forma mais próxima de chegar a um fã. E a gente ajuda a construir um império, um negócio sólido e longevo”, afirma.
O post A mulher por trás das linhas de make de R$ 130 milhões das super influencers apareceu primeiro em Forbes Brasil.