“Em várias áreas o Brasil já trabalha em um nível de elegância e finesse e, entre aspas, compete de igual para igual com o que tem fora. Na gastronomia faltava isso”, diz Alberto Landgraf à Forbes diretamente de seu novo restaurante, o Bossa, inaugurado no fim de maio no bairro londrino de Mayfair. O serviço do jantar corre ao fundo enquanto ele fala, por videoconferência, de dentro de uma sala reservada envidraçada. Conta que montou o restaurante em 11 meses e treinou a equipe três dias antes de abrir as portas.
Tudo muito corrido porque, ao aceitar o convite para o negócio em Londres, já tinha comprometido a agenda com eventos internacionais (cozinhou em mais de uma dúzia de países nos últimos dois anos). Fora que precisa cuidar do seu Oteque, no Rio – 47ª posição no ranking The World’s 50 Best Restaurants.
Parte da equipe do Oteque integra agora a do Bossa – ao todo, seis dos 24 funcionários do restaurante inglês. Muitos ingredientes, como tucupi e açaí, também pegaram a rota Brasil – Reino Unido, e são essenciais para o conceito da nova casa, que quer ir além da feijoada e do churrasco frequentemente associados à cozinha brasileira no exterior. “Faltava um chef encarar um projeto como o Bossa, de fazer uma cozinha de um patamar mais alto, em um bairro nobre, como Mayfair, e mostrar não só o lado caricato do Brasil, mas o lado moderno, atual, par a par com tudo que tem acontecido no mundo”, diz Landgraf.
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Paranaense de Cornélio Procópio, ele passou por cozinhas de chefs como Gordon Ramsay, Tom Aikens e Pierre Gagnaire, no Reino Unido e na França. De volta ao Brasil, chamou atenção em São Paulo com seu Épice e, depois, com o Oteque no Rio. Sente que, abrindo um restaurante fora já como chef estrelado, traça uma história diferente de outros brasileiros que se destacam no exterior. A seguir, ele fala mais do novo negócio, instalado em um imóvel ao lado do consulado brasileiro.
Como surgiu o projeto de abrir um restaurante em Londres?
Em fevereiro do ano passado eu fiz um jantar no restaurante de um amigo meu, o Lyle’s, de James Lowe, bem importante na cena em Londres. Uma pessoa que foi lá faz parte de um pool de investidores e gostou bastante. Achou muito único – foi essa a palavra que usou –, porque eu trouxe muitos ingredientes, como tucupi, castanhas e farinha, e juntei com ingredientes britânicos. Fiz, por exemplo, um pirão com turbot, que é um peixe daqui, e um lagostim com leite de castanha do Pará e caviar. Esse investidor me contou que saiu de lá pensando que Londres já tinha restaurante peruano, mexicano, uruguaio, argentino, mas não tinha um restaurante brasileiro. Quer dizer, até tem um, o Da Terra, com duas estrelas Michelin inclusive, mas não tem um chef brasileiro que veio para cá e abriu alguma coisa. Ele então encomendou uma pesquisa de mercado para uma consultoria para ver se tinha demanda e a resposta foi positiva. Então vieram com uma proposta para mim.
Qual o conceito? O que quer mostrar da cozinha brasileira?
Quero mostrar mais do que a cozinha brasileira, quero mostrar sabores, coisas inusitadas. O que eu mais escuto aqui é: “isto é tão único!”. E o Brasil já é muito respeitado fora em várias disciplinas. Temos grandes escritores, como Paulo Coelho; temos grandes artistas, como Beatriz Milhazes, Adriana Varejão, Os Gêmeos, Kobra; temos música, inclusive é o que traz o nome para o meu restaurante, o Bossa; temos designers, como Irmãos Campana, Sérgio Rodrigues e Ruy Ohtake… Então em várias áreas o Brasil já trabalha em um nível de elegância e finesse e, entre aspas, compete de igual para igual com o que tem fora do Brasil. Na gastronomia faltava isso. Cozinha brasileira fora é feijoada e churrasco, que têm o seu papel e são muito importantes. Mas faltava um chef encarar um projeto como o Bossa, de fazer uma cozinha de um patamar mais alto, em um bairro nobre, como Mayfair, e mostrar não só o lado caricato do Brasil, mas o lado moderno, atual, par a par com tudo que tem acontecido no mundo.
Quais são esses sabores únicos?
O tucupi é bem interessante. O pessoal também gosta muito do jambu. As castanhas do Pará e de caju que trago são totalmente diferentes das que se comem aqui, assim como o açaí. E tem as farinhas, com que faço farofa, pirão. Quis ser leal a meus fornecedores do Oteque e trazê-los para cá. Das bebidas, trouxe a Serra Limpa, que é uma cachaça orgânica de Pernambuco, e os vinhos da Vivente, do Rio Grande do Sul. Disse agora em uma entrevista para um jornal, The Telegraph: eu não estou trazendo essas coisas porque são brasileiras, estou trazendo porque são de qualidade e quero mostrar que o Brasil tem essa qualidade.
Li que vocês querem mostrar mais que moqueca e caipirinha. Mas servem moqueca e caipirinha, certo?
Sim. Mas é uma caipirinha diferenciada, bem refinada, feita com uma cachaça que no Brasil ninguém usaria para isso. E, para a moqueca, a gente cozinha os frutos do mar na brasa, cada um no seu ponto de cocção, só depois que incorpora o molho; serve com farofa, beiju de milho, vinagrete de feijão fradinho e um molhinho de pimenta, que é a receita do meu vô, e arroz. Tem também um prato de barriga de porco em que a gente fez um creme de feijoada como acompanhamento. Então tem tudo isso, mas de uma maneira elegante.
Tem um prato que resume esse conceito?
Vou falar de três pratos: o pastel de caranguejo com dip de açaí; as vieiras com tucupi e trigo sarraceno; e um que está vendendo muito, o tutano com tapioca e creme de castanha de caju crua.
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