O assunto do momento no mundo agro é o estreitamento das relações diplomáticas e comerciais do Brasil com a China. Com destaque para possibilidade de adoção do Renminbi (RMB), a moeda oficial do gigante asiático como padrão nas transações entre os países, em detrimento da utilização do dólar, como é feito correntemente.
Historicamente, a gente sabe que esse tipo de mecanismo é eficiente, sim, quando há amplo fluxo de comércio bilateral, que é justamente o caso da relação sino brasileira. Mas o movimento já foi tentado no passado e não obteve sucesso – ou seja, estamos hoje em 2023 e as transações continuam acontecendo em dólares.
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Mas por que será que isso acontece? Em primeiro lugar, precisamos entender que, apesar de o fluxo comercial entre o Brasil e a China ser intenso, existe um enorme saldo positivo em benefício do Brasil da ordem de bilhões que resulta dessa balança comercial entre os dois países. Em 2021, esse saldo foi de US$ 40 bilhões, em 2022 foi de US 29 bilhões. É um volume grande.
Em segundo lugar, a China é, notadamente, um país com alto controle de capitais, o que torna o Yuan Renminbi, por exemplo, uma moeda não conversível em bonds, também conhecidos como títulos de dívida.
E como pelas regras do Banco Central chinês não seria possível lançar um título em yuans para captação junto aos investidores chineses, por exemplo, e depois possível conversão desses recursos em dólares, isso significa que quem detém os Renminbis nas mãos teria que trocá-los, obrigatoriamente, por produtos chineses ou depender de liquidez externa para a sua troca.
Esse impasse ficou bastante claro em uma transação experimental que aconteceu em 2021, entre Siderúrgica chinesa Bao (Bao Steeel) e a Vale, em que a empresa brasileira teve que buscar o mercado offshore para converter em dólares os Renminbi que recebeu nessa transação direta. Como as dívidas da Vale são, majoritariamente, feitas em dólares eles precisaram recorrer a bancos internacionais para se valer de swaps-Renminbis-dólar, aquela troca de uma moeda por outra direta.
Esse mercado de swaps entre as duas moedas já é bem grande, mas dado o enorme volume do saldo brasileiro, de um país inteiro, seria mais difícil alcançar ambos os objetivos: neutralizar o saldo brasileiro ou encontrar liquidez para as trocas offshore. E isso poderia levar o Brasil a acumular muitos Renminbis na mão, sem conseguir utilizá-los para outros fins naturais que países exportadores precisam para dar fim a esses yuans.
Por isso, as transações diretas em Renminbi têm que ser voluntários e terão maiores chances de decolar somente se a China liberar o câmbio e os controles de capital para facilitar a conversibilidade total da sua moeda.
Caso contrário, a ideia do Renminbi como reserva de valor, ou como alternativa ao dólar, vai continuar uma conjectura e poderá complicar a liquidez das transações, caso seja forçada.
* Lygia Pimentel é médica veterinária, economista e consultora para o mercado de commodities. Atualmente é CEO da AgriFatto. Desde 2007 atua no setor do agronegócio ocupando cargos como analista de mercado na Scot Consultoria, gerente de operação de commodities na XP Investimentos e chefe de análise de mercado de gado de corte na INTL FCStone.
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