Esta semana, a gigante francesa de laticínios Bel Group anunciou uma parceria com a Climax Foods, startup de alimentos impulsionada por IA (Inteligência Artificial) fundada pelo astrofísico Oliver Zahn, ex-chefe de ciência de dados do Google.
A colaboração busca aproveitar o poder da inteligência artificial para desenvolver alternativas à base de plantas para produtos lácteos tradicionais que ofereçam o mesmo sabor, paladar e perfil nutricional de suas contra partes de origem animal.
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Cécile Béliot, CEO do Bel Group, disse que a parceria é um exemplo da estratégia de co-inovação da empresa, combinando as plataformas de IA e expertise da Climax Foods com a longa experiência e conhecimento da Bel no setor de laticínios.
A notícia desse acordo vem logo após uma colaboração semelhante, no ano passado, na qual a Kraft Heinz se uniu à NotCo, uma empresa que também usa IA para criar “leite, carnes, queijos” e outros produtos de proteína alternativa à base de plantas.
O CEO global da Kraft Heinz, Miguel Patricio, disse que a nova joint venture “é uma etapa crítica na transformação de nosso portfólio de produtos e uma grande adição às nossas capacidades de design de valor de marca. Isso ajuda a cumprir nossa visão de oferecer produtos limpos, ecológicos e deliciosos para os consumidores. Acreditamos que a tecnologia trazida pela NotCo está revolucionando a criação de alimentos vegetais com ingredientes mais simples.”
Unindo forças na produção de alimentos
Mas, por que isso está acontecendo neste momento? Por que algumas das maiores empresas de alimentos do mundo estão unindo forças com pequenas startups de IA?
O ímpeto, por trás dessas colaborações, é duplo: atender às metas de sustentabilidade corporativa e abordar as limitações da produção tradicional de alimentos. O Bel Group, por exemplo, pretende atingir um equilíbrio de 50% entre produtos lácteos e vegetais, com Béliot destacando a determinação da empresa em “explorar novos territórios e desenvolver soluções inovadoras que definirão o futuro da alimentação, para todos”.
David Shaw, diretor ESG da Kraft Heinz, concorda com esses argumentos, observando que a empresa está continuamente buscando maneiras de implementar práticas agrícolas sustentáveis sem comprometer o sabor dos alimentos. “Não podemos dizer às pessoas para não comerem carne e laticínios”, disse ele, “mas o que podemos fazer é trazer alguns ingredientes que são bons para o planeta e saudáveis, e que podem fazer parte de suas vidas”.
Mas existe aí um grande desafio, porque essas grandes empresas, geralmente, não estão equipadas para desenvolver novos blocos de construção de alimentos que possam satisfazer a imaginação do consumidor. A comida hoje produzida tem um bom ritmo de mudanças incrementais – extensões de produtos com novos sabores, menos carboidratos, menos gordura e assim por diante – mas as mudanças são fundamentalmente pequenas, já que essas empresas estão utilizando, na maior parte das vezes, as mesmas metodologias de produção e os mesmos insumos alimentares utilizados em grande parte do último meio século.
Andrew Franklyn-Miller, diretor de inovação médica da Nuritas, empresa Irlandesa com um escritório nos EUA, e que utiliza IA para desenvolver bioativos para alimentos e suplementos, disse que as marcas tradicionais de alimentos e as comunidades de saúde têm lutado para fazer a transição dos consumidores em massa para alternativas mais saudáveis e sustentáveis. Ele acredita que a descoberta orientada por IA, combinada com pesquisas em laboratório, pode liberar o potencial de nutrientes de origem natural de uma forma que antes era inatingível.
“Somos capazes de fazer isso sem IA? Bem, ainda não o fizemos”, disse Franklyn-Miller em uma entrevista recente. “Vimos áreas onde evitamos alimentos gordurosos. Decidimos que carboidratos e grãos eram bons. Agora decidimos que o carboidrato era ruim. Mas, de um modo geral, estamos brincando com os mesmos ingredientes, os mesmos macronutrientes”.
Franklyn-Miller continua dizendo que as drogas não são a resposta, mas sim nutrientes de origem natural, descobertos por meio de uma combinação de laboratório e ferramentas de IA, movidas a redes neurais que podem mapear as conexões entre essas proteínas e a construção de alimentos, levando a novos blocos de conhecimento em um tempo muito mais rápido do que o solitário trabalho de laboratório da velha escola.
“Sabemos que a maioria das pessoas prefere não tomar um medicamento por causa do custo de possíveis efeitos colaterais. Em vez disso, existem fontes naturais e não podemos desbloqueá-las sem utilizar uma combinação de biologia e descoberta baseadas em laboratório. Então, acredito que a IA vai se tornar inevitável, levando em conta a complexidade da estratégia de busca por meio de computadores.”
O que a produção atual de comida traz para a mesa é a escala. Embora empresas como Climax Foods, Shiru, NotCo e outras possam ajudar marcas estabelecidas a reinventar sua metodologia de descoberta de alimentos com novas ferramentas como IA, elas carecem de recursos para produzir ingredientes e produtos acabados em uma escala adequada para o consumo em massa e, portanto, são levadas a procurar por parceiros com experiência nessa área.
Mas mesmo assim, empresas maiores têm suas limitações. Isso ocorre porque, uma vez que novos nutrientes e insumos são descobertos, os ingredientes resultantes e os produtos acabados geralmente exigem novos métodos de produção, como fermentação de precisão, cultivo de células ou agricultura molecular. Para preencher essa lacuna, marcas de alimentos estabelecidas estão estabelecendo parcerias com empresas com propriedade intelectual e experiência nessas novas áreas.
A paisagem alimentar está em um período de transição em larga escala para marcas estabelecidas e suas primeiras incursões em proteínas alternativas tiveram resultados pouco expressivos. Algumas empresas descontinuaram produtos, enquanto outras estão reduzindo as iniciativas de inovação e descoberta.
Mas nem todos estão abandonando o barco. São as empresas que estão investindo na descoberta de alimentos com IA, enquanto desenvolvem capacidade para novas formas escaláveis de produção, que estarão mais bem posicionadas para navegar no futuro dos alimentos.
* Michael Wolf é colaborador da Forbes EUA. Acompanha a revolução da food tech desde 2015, quando lançou o Smart Kitchen Summit, a primeira conferência focada na digitalização da jornada de refeição do consumidor e foi o criador da conferência CES Food Tech. (tradução: V.Ondei)
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