Tecnologia na saúde: boa para pacientes e médicos

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Tecnologia tem o poder de tornar a medicina mais humanizada

Parece contraintuitivo imaginar que, quanto mais digitalizada a medicina estiver, mais humanizada ela poderá ser. Soa como uma charada, como se alguma coisa estivesse invertida. Mas não, a ordem dos fatores é exatamente essa. As “máquinas” – leia-se: os algoritmos, o aprendizado de máquina, o “deep learning” e mesmo o ChatGPT e suas variantes – poderão poupar o trabalho médico de atividades repetitivas, mecânicas – e, portanto, automatizáveis, em certo sentido. Menos tarefas deixariam ao médico mais tempo para dedicar ao paciente.

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A dedicação à saúde do outro é parte intrínseca da própria razão de ser do médico. Faz parte do corpo de textos atribuídos ao grego Hipócrates (460 – 377 AEC), o “Pai da Medicina”, um chamado “A Lei”. É um texto curto (cinco parágrafos), que soa como uma “miniaula magna”. Nele, o autor diz que, para dominar o conhecimento da medicina, o indivíduo deve ter vantagens como talento natural, ser reflexivo e perseverante e ter amor ao trabalho. Em seguida, compara o aprendizado da medicina ao trabalho da jardinagem.

Mais de 2 mil anos no futuro, no entanto, a correria que caracteriza o dia a dia do trabalho de multidões de médicos talvez provocasse dúvidas diante de algumas dessas premissas. A realidade da profissão muitas vezes envolve consultas brevíssimas, com tempo para pouco mais que uma conversa apressada, quase alheia ao relato do paciente. Essa realidade dura e implacável não recai sobre os ombros do médico sem deixar suas marcas. Até porque há um juramento que faz ao se formar, o médico se compromete com a saúde do paciente – e quando não consegue fazer isso, há um descontentamento, uma espécie de desencanto.

Há muito mais que isso, no entanto. A demanda excessiva, condições de trabalho muitas vezes longe das ideais, horários que beiram o caótico, mais pressões da vida pessoal, o desgaste a que o médico é submetido é imenso. E ainda houve a pandemia de covid-19, que neste mês de março completou três anos (no dia 11). Um estudo da Universidade Federal de São Carlos ouviu 125 profissionais da rede pública de saúde entre 2021 e 2022, por meio de questionários online. As respostas mostram que 86% deles sofrem da síndrome de burnout – o esgotamento que beira o extremo e provoca sintomas de exaustão, estresse e depressão, afetam o sono e causam dores pelo corpo. E não só: 75% dos entrevistados afirmaram sentir a carga negativa das demandas emocionais ligadas ao trabalho e 15% relataram ter sofrido atenção sexual indesejada; 26% disseram ter recebido ameaças e 9% foram fisicamente agredidos.

Por tudo isso, a IA (inteligência artificial) serviria como, no mínimo, algo para começar a atenuar o impacto de tantas demandas e atribuições sobre o profissional de saúde. A comunicação automatizada que o ChatGPT começa a apresentar numa forma mais sofisticada que a dos já conhecidos “chatbots” será um auxílio cada vez maior. Na medida em que a IA que o movimenta, o ChatGPT poderá esclarecer mais e mais dúvidas, interagir de modo cada vez mais eficiente com pacientes. Outras formas de IA, como o aprendizado de máquina, vai auxiliar em diagnósticos e exames. Cirurgias robóticas poderão poupar os médicos de procedimentos de longas horas.

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Um estudo de Accenture e AdvaMed, intitulado “Digital Health and MedTech — New Signals for Transformation” e divulgado dezembro no ano passado, mostra que tecnologia médica e saúde digital já entrou na agenda de negócios da área de saúde – e um número cada vez maior de líderes na área vê a saúde digital como essencial para melhorar os resultados dos pacientes.

Fala-se tanto de tecnologia na atualidade que fica fácil esquecer que o desenvolvimento tecnológico não é um fim em si. Na área de saúde, ele serve para trazer mais qualidade ao atendimento que é prestado ao paciente. E um efeito muito bem-vindo disso é proporcionar ao médico justamente aquilo que caracteriza a sua atividade: zelar pela qualidade da saúde de seus pacientes.

Claudio Lottenberg é mestre e doutor em oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp). É presidente do conselho do Hospital Albert Einstein e do Instituto Coalizão Saúde.

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