Na última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), a Taxa Selic foi mantida em 13,75% e continua sendo o remédio amargo que o Banco Central possui para tentar conter a alta da inflação. Mas, se a alta de juros demora a surtir os efeitos desejados, por outro lado, traz algumas consequências imediatas bastante desafiadoras.
E é exatamente disso que eu quero falar com você hoje. Ainda é muito comum eu receber mensagens de pessoas que não fazem a menor ideia do quanto a taxa Selic influencia suas vidas cotidianas, e muitas ainda acreditam que, por ainda não serem investidoras, isso não tem nada a ver com a vida delas.
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Acontece que a Taxa Selic é a taxa básica da economia e impacta a todos, independentemente de condição social, e alguns dos efeitos dos juros altos são:
1. Redução do consumo das famílias: de acordo com dados divulgados em janeiro deste ano pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), quase 78% das famílias brasileiras estão endividadas e duas entre dez famílias comprometem mais da metade de sua renda mensal para pagar dívidas. A taxa de juros alta torna essas dívidas mais caras, consequentemente, as famílias precisam reduzir seu consumo, impactando diretamente o resultado das empresas e a economia como um todo;
2. Desaceleração do crescimento econômico: as empresas deixam de investir em expansão ou em criação de novos empreendimentos, pois, além de os juros de empréstimos ficarem muito altos, não compensa usar suas reservas em expansão, já que o consumo das famílias está achatado e, mantendo investido o dinheiro, a rentabilidade é maior do que a margem de lucro que teriam com a venda de seus produtos e serviços;
3. Menor oferta de emprego: se as empresas não crescem, logo, não geram mais empregos. Ao contrário disso, podem inclusive reduzir seu quadro de funcionários para adequar os custos ao momento econômico;
4. Maior desemprego eleva os custos do governo com programas sociais: seguro-desemprego, cestas básicas, saúde pública, entre muitos outros custos do Estado, tornam-se maiores à medida que mais famílias não têm como se sustentar com sua própria renda;
5. Dívida pública mais alta: o governo financia boa parte de suas atividades através dos recursos vindos dos Títulos do Tesouro, e pelo menos um terço da dívida pública federal é indexada pela Selic. Se os gastos do governo para manter o país funcionando demandam mais dinheiro, isso significa vender mais títulos da dívida para financiar seus custos. Sendo assim, quando a taxa está alta, é maior o valor dos juros que o governo precisa pagar àqueles que possuem títulos da dívida pública;
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6. Risco-Brasil tende a subir: com o aumento dos gastos do governo com a dívida pública, o score do país junto às agências de classificação de risco fica menor, e, obviamente, esse fator – aliado à incerteza gerada quanto à capacidade do Banco Central de gerir sua política monetária – afugenta parte dos investidores internacionais;
7. Dólar em alta: se os investidores internacionais deixam de investir aqui, para levar embora seu capital, eles precisam transformá-lo em dólares, ou seja, a demanda pela moeda eleva o valor do câmbio, o que acaba por encarecer a maioria dos produtos de consumo do cotidiano.
Percebe que é um efeito dominó e que tudo está interligado? Daria para ficar desdobrando essa lista infinitamente, pois cada fator desencadeia uma série de outros que, combinados, determinam os rumos da economia de um país.
Obviamente, a Selic não ficará em alta para sempre, afinal, a economia se move em ciclos e o objetivo dos juros altos é justamente reduzir a inflação, por meio da desaceleração da economia.
Com a queda do consumo, a oferta de produtos aumenta, logo, os preços diminuem e a inflação começa a cair. Caindo a inflação, o consumo gradativamente vai aumentando, fomentando o crescimento econômico e, assim, o ciclo se retroalimenta continuamente.
A meca da política econômica é justamente manter o equilíbrio sensível entre crescimento econômico e meta de inflação.
É um bom momento para investir na bolsa de valores?
Investir na Bolsa nunca é um mau negócio. Se você avaliar, por exemplo, o histórico dos indicadores entre 2000 e 2021, verá que o Ibovespa subiu acima de 590%, enquanto a inflação acumulada deste mesmo período foi de 285%.
Esse exemplo é uma simplificação didática e, obviamente, o cálculo de ganho real não é feito com a mera comparação desses dois índices. Durante períodos de maior instabilidade econômica e inflação alta você precisa estar mais atento ao cenário macroeconômico e, em especial, às projeções da Taxa Selic e IPCA, para entender quais setores da economia são mais afetados.
Há segmentos que conseguem repassar mais facilmente seus custos para o preço final dos produtos, enquanto outros têm maior dificuldade e, portanto, acabam tendo que absorver por mais tempo a elevação de custos sem aumentar os preços para o consumidor.
Empresas que possuem maior endividamento ou aquelas que dependem diretamente do consumo da população, como construtoras e varejistas, têm seus resultados afetados de forma mais intensa. Com lucros menores, as ações tendem a cair.
Inversamente, o setor bancário, por exemplo, pode se beneficiar da alta de juros, caso não reduza seu spread, que é a diferença entre o custo de captação de dinheiro e os juros cobrados nos empréstimos concedidos. Se a diferença fica maior, isso resulta em lucratividade e valorização dos ativos.
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Esses exemplos ilustram a importância de se levar em conta a forma como cada setor da economia, de acordo com suas características, reflete os ciclos de mercado, sendo impactado positiva ou negativamente por eles, conforme a combinação de variáveis em cada cenário.
Lembre que a Bolsa de Valores é onde as empresas são negociadas diariamente. Juros altos podem ser prejudiciais a algumas e benéficos para outras, e mesmo essa correlação não é linear. Além disso, momentos de grandes quedas da bolsa são ótimas oportunidades para adquirir boas ações com valores menores do que realmente valem. Atualmente, por exemplo, o P/L – que é o indicador preço/lucro – de grandes empresas encontra-se no menor patamar dos últimos dez anos.
Isso significa que você está diante da melhor oportunidade da década para se tornar acionista de boas empresas e se beneficiar com a valorização delas, tão logo o ciclo econômico reverta seu movimento.
Proteger seu poder de compra ao longo dos ciclos econômicos envolve diversificação e balanceamento de carteira, acompanhamento de mercado, e olhar atento às oportunidades.
Fugir da manada, que enxerga só o aumento ou a redução de uma taxa, sem considerar todas as suas nuances – aspectos ruins e também as oportunidades – é o que irá transformar o remédio amargo da alta de juros em ferramenta para potencializar seu crescimento patrimonial.
Eduardo Mira é formado em telecomunicações, com pós-graduação em pedagogia empresarial e MBA em gestão de investimento. É analista CNPI, certificado CPA10 e CPA20, ex-gerente do Banco do Brasil e da corretora Modal.
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