Aos 22 anos, Garrett Lord realizou algo quase impossível: sem as vantagens de frequentar uma escola americana de elite como Stanford ou MIT, ou com uma rede de contatos construída por pais ricos, ele conseguiu um estágio de verão na Palantir, uma das startups de mineração de dados mais badaladas do Vale do Silício à época.
Para o graduado em ciência da computação pela Michigan Technological University, localizada na pequena cidade de Houghton, no estado americano de Michigan, um emprego na empresa apoiada pela CIA era um bom início de carreira.
Porém, dias depois de chegar ao escritório em Washington, em maio de 2012, ele teve sérias dúvidas. Os outros 15 estagiários pareciam vir de um universo diferente. Todos haviam frequentado escolas de renome e passavam grande parte do tempo conversando sobre seus projetos de pesquisa de ponta ou se gabando das próximas férias na Europa. “Lembro de ligar para o meu pai e ele dizer: ‘Você pode não ser mais esperto do que eles, mas você não vai desperdiçar essa oportunidade e vai trabalhar mais do que eles’”, lembra Lord, aos 33 anos.
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E foi o que ele fez. Lord venceu o hackathon anual da empresa e conquistou o respeito dos seus superiores, que, segundo ele, ficaram chocados com o fato de alguém tão inteligente e talentoso ter vindo de uma escola tão pouco conhecida. Eles ofereceram a ele um bônus de indicação – US$ 5 mil por engenheiro contratado – para trazer outros alunos talentosos da Michigan Tech.
Foi aí que acendeu uma luz: e se ele pudesse criar um software para conectar empresas aos milhares de talentos em todo o país em escolas de baixo perfil como a Michigan Tech? “Existem alunos talentosos em todos os lugares. E o CEP em que você cresceu não deve definir a carreira que você terá depois da faculdade.”
Então, quando ele voltou ao campus, se juntou a dois amigos, Ben Christensen e Scott Ringwelski, e começou a trabalhar. Os três alunos de graduação imaginaram uma plataforma de rede móvel e fácil de usar para conectar virtualmente estudantes, universidades e empregadores. Eles lançaram a Handshake dois anos depois, em 2014, e foram destaque na Forbes 30 Under 30 de 2017.
Hoje, quase 12 milhões de estudantes universitários (muitos com pouca ou nenhuma experiência de trabalho) de 1.400 faculdades e universidades nos EUA usam a plataforma para pesquisar ofertas de emprego de 750 mil empresas, enviar mensagens para recrutadores e ex-alunos, participar de feiras de carreira e realizar entrevistas em vídeo.
Os alunos não pagam um centavo, mas as universidades pagam uma média de US$ 8 mil (R$ 41,9 mil) por ano. As 1.110 empresas que pagam por uma versão premium da plataforma pagam ainda mais: de US$ 15 mil (R$ 78,58 mil) a vários milhões de dólares por ano, o que lhes permite enviar ofertas de emprego direcionadas a candidatos com base em sua localização atual, gênero, características e habilidades específicas (como codificação JavaScript ou Python) ou escola. Os empregadores também podem usar todos esses segmentos, exceto raça e gênero, para procurar candidatos individuais.
Crescimento da Handshake
O crescimento da Handshake foi impulsionado por um mercado de trabalho apertado e pela mudança para contratação virtual e trabalho remoto durante a pandemia. O número de alunos que “apertam a mão” – que virou um termo comum nas universidades – aumentou 600% desde 2017, quando apenas 1,6 milhão de alunos estavam na plataforma.
A receita chegará a US$ 120 milhões (R$ 628 milhões) em 2022, de acordo com Lord, acima dos US$ 75 milhões (R$ 392 milhões) no ano passado e dos US$ 3 milhões (R$ 15,7 milhões) cinco anos atrás. A Handshake, que ainda não deu lucro, levantou US$ 200 milhões (R$ 1 bilhão) em janeiro.
Essa rodada elevou seu financiamento total para mais de US$ 430 milhões (R$ 2,2 bilhões) e aumentou sua avaliação para US$ 3,5 bilhões (R$ 18,3 bilhões). A Forbes estima que Lord e seus cofundadores ainda possuem pelo menos 15%, no valor de cerca de US$ 525 milhões (R$ 2,7 bilhões) no auge do mercado de tecnologia no último ano.
Concorrendo com gigantes
Mas aqui está o problema: como acontece com a maioria das universidades e sites de busca de empregos, a empresa não tem ideia de quantos alunos realmente encontram empregos por meio da Handshake.
Depois de se conectarem com os recrutadores, eles invariavelmente saem da plataforma para continuar o processo. A maioria dos estudantes e empregadores não relata à Handshake se eles foram contratados ou fizeram uma oferta.
A Handshake também enfrenta forte concorrência dos gigantes de busca de empregos LinkedIn, Indeed e ZipRecruiter. E isso é apenas no lado do candidato a emprego. Outras startups de software, incluindo a Symplicity, com sede em São Francisco, estão mirando centros de carreira universitários. Lord acha que tem uma vantagem ao criar uma maneira mais barata e intuitiva de conectar as várias partes. Pode ser. Mas vale a pena notar que a controladora do LinkedIn, a Microsoft, por exemplo – com um valor de mercado atual de US$ 1,8 trilhão (R$ 9,4 trilhões) – poderia facilmente pegá-lo.
Mesmo com as dificuldades do mercado de tecnologia e as demissões em massa em grandes empresas como Twitter, Amazon, Meta e Cisco, Lord diz que não está preocupado. Ele afirma que os empregadores ainda querem e precisam de jovens talentos que sejam mais baratos e mais qualificados tecnicamente. Além disso, a Handshake não é voltada para nenhum setor. “O que vimos durante a primeira retração da Covid, quando as empresas estavam com medo, foi que ainda há uma grande demanda por talentos técnicos nos EUA”, diz Lord, que é rápido em apontar que a Handshake ainda tem mais de US$ 200 milhões (R$ 1 bilhão) em dinheiro de venture capital no banco, o que deve ajudá-lo a enfrentar uma recessão.
Trajetória do fundador da Handshake
Lord cresceu em Bloomfield Hills, Michigan, onde passava a maior parte do tempo com sua família, incluindo sua irmã e oito primos. Seu pai trabalhava com construção; sua mãe era assistente administrativa. Apesar de se destacar no esqui e em outros esportes, ele se autoproclamava um “nerd” que adorava computadores. Quando adolescente, ele esperava um dia ter sua própria oficina de conserto de computadores ou se tornar um CIO, como um amigo bem-sucedido de seu tio.
Com a expectativa de pagar a faculdade sozinho, ele trabalhou consertando computadores e dando aulas de como usar o aplicativo iMovie. Depois de começar na Michigan Tech em 2010, ele fez amizade com um veterano enquanto procurava peças antigas de computador no lixo. Seu novo amigo ficou tão impressionado com as habilidades técnicas de Lord que o ajudou a conseguir uma bolsa de estudos em computação no Laboratório Nacional de Los Alamos, no Novo México.
Com esse reforço no currículo, aliado à sua obstinação, ele entrou na Palantir em 2012, onde logo teve sua fatídica epifania. “Eu não estava ligado às pessoas certas”, diz ele. “Navegar em uma carreira é muito sobre quem você conhece, o que você conhece e o status socioeconômico da sua família.”
A Handshake foi fácil de construir, mas inicialmente não foi fácil de vender. Lord recusou um emprego na Palantir e deixou a escola alguns créditos antes de se formar para se concentrar em sua empresa. O trio de cofundadores passou seis meses em 2013 morando em um Ford Focus, dirigindo de escola em escola implorando para que experimentassem seu software enquanto acampavam em estacionamentos do McDonald’s e tomavam banho em piscinas universitárias.
Conseguir a adesão dos empregadores foi muito mais fácil, especialmente considerando que inicialmente os fundadores do Handshake deram o software a eles de graça, apostando que mais tarde seria relativamente fácil vendê-los para uma versão premium. Procter & Gamble, IBM, Box e Mastercard foram algumas das primeiras empresas a experimentar o Handshake.
Driblando os concorrentes
Em 2017, os cofundadores levantaram US$ 30 milhões (R$ 157 milhões) e mudaram sua operação para uma casa de sete quartos em Palo Alto, na Califórnia, onde uma equipe de cerca de 20 pessoas vivia e trabalhava dia e noite. Naquele ano, a Handshake registrou uma receita de US$ 3 milhões (R$ 15,7 milhões).
A partir daí, as vendas aumentaram rapidamente, fazendo com que os clientes gastassem mais. Cerca de 30% das empresas que pagam pelo software se inscrevem para serviços adicionais a cada ano, segundo o diretor de operações, Jonathan Stull.
As universidades também apareceram. A Universidade de Miami mudou do concorrente Symplicity, em 2015, reduzindo seus gastos anuais em cerca de dois terços.
Na Universidade de Rochester, Joe Testani fazia parte do conselho consultivo do concorrente do Handshake GradLeaders (uma pequena empresa de Columbus, Ohio, anteriormente conhecida como CSO Research) quando o sempre persistente Lord o convenceu a arriscar em seu software. “Era mais barato do que a outra plataforma em que a universidade estava, então houve um corte de custos”, diz Testani, que era diretor do centro de carreiras da escola na época.
Desafios e oportunidades da pandemia
A pandemia apresentou o primeiro grande desafio da Handshake e sua maior oportunidade. Em semanas, durante o início de 2020, a taxa de desemprego para graduados universitários entre 20 e 24 anos disparou de 4,2% para um pico de 20,4% em junho. “Jogamos todo o nosso roteiro de produtos pela janela e reunimos nossa empresa para descobrir como poderíamos criar ferramentas virtuais”, diz Lord. “Tivemos a oportunidade de realmente ajudar a garantir que a turma de formandos daquele ano não caísse no esquecimento.”
A empresa lançou rapidamente um produto que permitia que as faculdades organizassem feiras virtuais de carreiras. Os empregadores podem usar o software da Handshake para agendar reuniões de grupo de 30 minutos ou individuais de 10 minutos com os alunos. Em 2021, a Handshake ajudou a hospedar quase 6 mil feiras de empregos – e três quartos delas foram virtuais. A Covid-19 havia acelerado tudo: em 2019, a Handshake tinha 954 escolas inscritas. No final de 2021, esse número atingiu 1.399.
A Handshake, que tem 66 das 107 faculdades e universidades historicamente negras dos EUA na plataforma e 280 escolas que atendem comunidades carentes, também afirma que está ajudando os empregadores a cumprir as metas de contratação de diversidade que prometeram após os protestos #MeToo e #BlackLivesMatter nos EUA. Dos quase 12 milhões de usuários da Handshake, 13% se identificam como negros, 12% como hispânicos ou latinos, 15% asiáticos e 59% mulheres.
Pelo menos uma pessoa acha que a Handshake pode estar piorando as coisas. “Os empregos que eles estão postando agora, o problema é que estão disponíveis na internet”, diz Ryan Craig, diretor-gerente da empresa de private equity Achieve Partners, que investiu em startups de educação. “Portanto, a Handshake está apenas fornecendo uma plataforma com curadoria para ver esses empregos e, como resultado, torná-los mais competitivos para os alunos, o que eu acho que provavelmente reforçará a contratação com base em pedigree e graduação.”
Próximos passos
Lord agora está de olho no exterior. Em abril, a Handshake fez sua primeira aquisição fora dos Estados Unidos, pagando mais de US$ 10 milhões (R$ 52 milhões) pela Talentspace, uma empresa alemã de recrutamento virtual. A empresa está desenvolvendo sua IA para sugerir cursos e habilidades comercializáveis, com base nas pesquisas dos principais empregadores na Handshake.
Por exemplo, se um aluno procura empregos em desenvolvimento de software, mas não possui as habilidades necessárias para muitos cargos bem remunerados, a Handshake poderia, teoricamente, enviar um alerta sobre cursos relevantes em sua universidade ou campos de treinamento de codificação fora do campus para aumentar as chances de contratação.
Deixe o LinkedIn e outros focarem no seu passado, diz Lord. Como muitos de seus alunos, a Handshake está olhando para o futuro. “Existe uma oportunidade de oferecer uma experiência mágica para estudantes e jovens profissionais que nos deixa muito entusiasmados”, diz ele. “E temos capital suficiente para isso.”
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