Em ano eleitoral é comum que haja uma grande volatilidade no mercado de capitais devido a incerteza sobre a definição do pleito. Entretanto, quando já se tem o nome do novo presidente, essa volatilidade costuma diminuir e o mercado passa a se preparar para o próximo mandato.
Não é exatamente este cenário que temos visto neste ano. Desde a divulgação do resultado da eleição no dia 30 de outubro, a volatilidade no mercado permanece alta e a preocupação dos investidores se concentra em um indicador importante: o risco-Brasil.
Medido pelo CDS (Credit Default Swap), o risco-Brasil é um indicador que aponta o nível de risco para os investidores estrangeiros de investir em determinado país e receber um calote. Ele também serve como swap de crédito, um derivativo de garantia contra o não pagamento de dívidas públicas ou privadas.
O CDS é medido com base na instabilidade política, déficit fiscal, crescimento econômico e a relação dívida/PIB (Produto Interno Bruto) de um país. Quanto maiores as incertezas em relação ao futuro e às contas públicas, mais alto o CDS.
Neste momento, as incertezas em relação ao Brasil não são poucas. Desde a campanha eleitoral, o presidente eleito critica o teto de gastos e propõe o aumento de despesas para uma série de áreas do governo. Além disso, ainda não se sabe quem será o próximo ministro da Fazenda e qual vai ser a linha de governo na área da economia.
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O governo de transição trabalha em uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que prevê furar o teto de gastos em R$ 198 bilhões para pagar um Auxílio Brasil de R$ 600 mais um acréscimo de R$ 150 por filho de até seis anos. Isso a partir do próximo ano. O texto também pede a exclusão do teto em uso de dinheiro excepcional, como doações e arrecadações públicas (caso do fundo Amazônia, fundos de universidade e outros).
A reação do mercado tem sido negativa a essa proposta e o professor do Insper Alexandre Chaia afirma que se trata de uma questão de falta de confiança.
“O problema não é furar o teto de gastos ou aumentar o déficit. O que preocupa é não explicar como vai pagar essa conta. Não há qualquer sinalização nesse sentido, isso é gerar incerteza, gerar dúvidas sobre a capacidade do país de honrar as suas dívidas no futuro por ter extrapolado os gastos e a conta não fechar”, diz Chaia.
Desconfiança e incerteza
Chaia explica a situação do risco-Brasil fazendo uma analogia com finanças pessoais.
“Uma pessoa que tem empréstimos no banco com um prazo de cinco anos, por exemplo, começa a aumentar as suas despesas, compra mais coisas, gera mais contas e segue nesse ciclo. Se essa pessoa voltar ao banco para pedir mais dinheiro, o banco vai entender que as receitas agora estão muito abaixo do nível de endividamento e não vai mais conceder empréstimos”, diz o professor do Insper. “É isso que o Brasil está fazendo, aumentando suas dívidas sem que tenha condições de pagar no futuro.”
Segundo o professor, isso gera desconfiança no mercado e faz o risco-Brasil aumentar frente aos estrangeiros. Chaia afirma que, atualmente, não se trata de um grande risco para um sinal vermelho, mas que antes não se cogitava um calote, e agora essa possibilidade voltou à tona, mesmo que pequena.
“Ter uma dívida alta não é privilégio do Brasil, outros países têm dívidas altas, mas eles oferecem confiança em contrapartida. Estabilidade, responsabilidade fiscal e um plano para que o futuro seja previsível. É isso que o mercado precisa, de previsibilidade”, diz Chaia.
Essa opinião é compartilhada por William Eid, professor titular de Finanças da FGV. “O mercado financeiro é um mercado de incertezas. Você não deve colocar mais incerteza nisso”, diz.
Risco-Brasil abaixo dos máximos
Eid afirma que o nível de risco-Brasil não está nos patamares mais elevados já vistos, embora apresente um nível já razoável. Ele lembra que o indicador já chegou na casa de mil pontos. Hoje, o CDS de cinco anos está em 263,19 pontos, de acordo com o portal World Government Bonds. Segundo o site, esse nível equivale a uma probabilidade de calote de 4,39% em cinco anos. Na última semana, o CDS variou 16,7% para cima. Em um mês, subiu 8,5%.
O professor Eid diz acreditar que o maior problema de um risco-Brasil alto é afugentar os investidores estrangeiros, visto que o cenário de calote ele vê como pouco provável.
“O Brasil não tem poupança interna, então depende muito do capital externo para movimentar sua economia. Sem dinheiro do exterior, corre o risco de passar mais vários anos sem registrar um crescimento real”, afirma o professor.
Para efeito comparativo, os Estados Unidos, que é o país de referência mundial para investimentos, têm um risco de 30,24 pontos – valor que aumentou 84% em seis meses, em meio à crise global.
O México, apresenta um risco de 138,62 pontos. A Índia, 107,14 pontos. Já a Argentina, um país que passa por uma forte crise econômica no momento, registra um risco de 1030,95 pontos.
Para o professor Eid, o compromisso fiscal é fundamental para arrefecer os ânimos do mercado financeiro. “Ninguém vai investir em um país que seja fiscalmente descontrolado e o Brasil precisa de capital estrangeiro”, afirma.
Chaia complementa que a nomenclatura não é importante. “Teto de gastos ou não, o que precisa é de uma âncora fiscal que sinalize para investidores empresariais e financeiros que é sustentável o Brasil ter dívidas. Trata-se de uma garantia de que no longo prazo o país será capaz de honrar seus compromissos. É disso que se trata”, diz o professor.
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