A menos de um mês para a COP27 (Conferência das Partes sobre o Clima da Organização das Nações Unidas), diversas empresas e organizações se preparam para o encontro que irá acontecer no Egito, entre os dias 6 e 18 de novembro.
Neste ano, um dos principais tópicos a ser debatido no evento é a regulação para o mercado de carbono, com apoio de políticas governamentais para valorizar as florestas e preservar o meio ambiente. Tópico em que o Brasil é tido como um dos países em foco.
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A ICC (Câmara de Comércio Internacional), em parceria com a consultoria WayCarbon, estimam que o Brasil tem capacidade para atender 48,7% da demanda global por créditos de carbono no mercado voluntário, que deve chegar entre 1,5 bilhão e 2 bilhões de toneladas de CO2 no fim da década.
Isso significa um potencial de receitas com créditos de carbono de até US$ 120 bilhões para o Brasil até 2030, considerando o preço do crédito em US$ 100 por tonelada, o que eles afirmam ser um cenário otimista e de alta demanda.
Atualmente, a oferta brasileira corresponde a cerca de 12% das emissões mundiais (45,28 milhões de toneladas de CO2 em créditos de carbono no mercado voluntário em 2021), valor quatro vezes maior do que a participação de 2019.
Laura Albuquerque, gerente geral de consultoria da WayCarbon, explica que os números são positivos e otimistas, em linha com a vasta fauna e flora do país, mas, na prática, o que eles observam no dia a dia é um mercado de carbono ainda em fase inicial.
“É fundamental para o crescimento do mercado um ambiente de segurança jurídica. Precisamos de uma legislação transparente para as empresas decidirem o que fazer, quais os próximos passos, com entendimento geral de metas e limites para cada setor”, diz Albuquerque.
Em 19 de maio deste ano, a publicação do decreto nº 11.075/22 deu início ao desenvolvimento de uma regulamentação ao estabelecer regras para a elaboração de planos para alguns setores empresariais sobre mitigação das mudanças climáticas.
O texto também institui o Sinare (Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa), cuja finalidade é reunir os registros de emissões, remoções, reduções e compensações de gases de efeito estufa e de transações de créditos.
“O Sinare é um ponto muito positivo que deve melhorar a questão da transparência e acompanhamento dos créditos de carbono, mas o texto precisa evoluir. Precisamos saber quais os setores que devem iniciar os planos de mitigação, por exemplo. Qual a meta? Terá um limite mínimo? São pontos importantes que devem ser determinados”, diz Albuquerque.
Mercado regulado x mercado voluntário
As estimativas feitas pelo ICC e pela WayCarbon têm como base o potencial de participação do Brasil no cenário global e receitas do mercado voluntário de carbono. Esse mercado é liderado pelo setor privado por meio de metas voluntárias de redução e compensação de emissões pelas próprias companhias.
Em 2021, foram transacionados quase 500 milhões de créditos (ou 500 milhões de toneladas de CO2), mais que o dobro dos 200 milhões do ano anterior. Com isso, o mercado voluntário alcançou um valor de US$ 1,98 bilhão, segundo levantamento do Ecossystem Marketplace.
Segundo a TSCVM (Taskforce On Scaling Voluntary Carbon Markets), organização que trabalha para apurar a qualidade de créditos e sua padronização, esse mercado pode chegar a reduzir 2 bilhões de toneladas de CO2 até 2030 e movimentar US$ 30 bilhões.
Porém, este é o menor mercado de carbono. Os mercados regulados, que são liderados por iniciativas de países por meio de legislação, estão à frente das maiores reduções do mundo.
De acordo com o Banco Mundial, em 2021, mais de 30 países já tinham regras para compensar a emissão de carbono e gases de efeito estufa. A cobertura desses mercados abarcava 23% do total de emissões globais, com uma receita de US$ 84 bilhões.
Países da União Europeia são os mais avançados em suas políticas governamentais sobre o tema, mas Canadá, Japão, México e China também já criaram seus mercados regulados. Nos Estados Unidos, o estado da Califórnia é o que abraça o tema.
Aqui no Brasil, o Projeto de Lei nº 528/2021 e o nº 2.148/2015, são exemplos de projetos que estão em tramitação na Câmara dos Deputados e podem se tornar marcos regulatórios para o mercado de carbono no país.
As iniciativas tratam da criação do Sistema Nacional de Registro de Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SNRI-GEE), que será administrado pelo Instituto Nacional de Registro de Dados Climáticos (INRDC), além da possibilidade de isenção de impostos nas transações nacionais realizadas por empresas no mercado voluntário de créditos de carbono.
Urgência dos setores privados
A CNI (Confederação Nacional da Indústria) está interessada no avanço do mercado regulado. “O Brasil tem potencial de se tornar um país muito mais competitivo economicamente ao se voltar para as pautas sustentáveis. Existe a possibilidade de conquistar novos mercados, sair à frente desse processo e abrir portas comerciais importantes no processo”, diz Davi Bomtempo, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI.
O Brasil declarou que alcançará a neutralidade climática até 2050. Para isso, o governo terá que implementar diversos programas com ênfase na recuperação de pastagens degradadas (RPD), sistemas integrados de lavoura, pecuária e florestas (ILFP), reflorestamento, manejo florestal sustentável, entre outras ações no intuito de cumprir sua NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) – documento que reúne os compromissos adotados no Acordo de Paris para mitigação dos efeitos das mudanças climáticas.
Entretanto, as iniciativas governamentais até o momento não se encaminham nesse sentido. Um estudo da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) mostra que o Brasil pode aumentar a emissão de gases do efeito estufa em 137% nos próximos anos caso as políticas ambientais que favorecem o desmatamento ilegal continuem.
Bomtempo afirma que é necessário que haja uma visão mais ampla dos compromissos firmados no Acordo de Paris. “O Brasil já atua em diversas áreas com muito sucesso. Temos um forte trabalho na área de energia renovável, de biocombustíveis e eletrificação. Tudo isso faz parte do processo de transição para uma economia de baixo carbono, como prevê o Acordo de Paris”, diz.
Segundo ele, a regulamentação do mercado de carbono é um próximo passo importante. “O mercado de carbono sozinho não vai resolver as emissões do Brasil, mas vai permitir um forte avanço nas metas de sustentabilidade”, afirma o executivo, que também pontua outras ações que são complementares e cruciais: combater o desmatamento ilegal, fortalecer e expandir as energias renováveis e trazer novas tecnologias.
Levantamento do Ecosystem Marketplace mostra que, em 2021, o país transacionou 3,1 milhões de toneladas de créditos florestais. Em termos de comparação, o Peru movimentou no mesmo período 23,5 milhões.
O executivo da CNI afirma que falta ao Brasil segurança jurídica, com uma legislação clara e transparente para o país alcançar em seu potencial no tema ambiental. “É isso o que o investidor procura e o que vários países e blocos fizeram”.
O Banco Interamericano de Desenvolvimento estimou em 2017 que seria necessário investir R$ 890 bilhões até 2030 para tornar a economia brasileira mais resiliente e baixa em emissões de carbono.
Albuquerque, da WayCarbon, diz que o mercado voluntário não depende da regulamentação para avançar, mas a segurança jurídica gerada pela lei permite o avanço do setor como um todo. “Ter uma regulamentação vai destravar diversas empresas que ainda não sentem segurança para avançar no tema, vai aumentar a demanda por créditos no país, fomentar capacitação de e gerar emprego, atrair investimentos. É um ciclo de ganhos.”
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